Devido à burocracia do IPHAN, padre é orientado a fazer vaquinha virtual para restaurar igreja de Guaratuba
Por Cleverson Teixeira
A bicentenária Igreja Matriz de Bom Sucesso, localizada no município de Guaratuba, está usando as redes sociais como forma de arrecadar verba para a manutenção do seu espaço. Membros da entidade e voluntários abriram uma vaquinha virtual com o objetivo de ajudar a capela, a qual enfrenta problemas estruturais internos e externos. Construída pela comunidade a partir do ano de 1768, a primeira missa foi realizada no dia 29 de abril de 1771. O monumento, tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), possui arquitetura colonial, e, a sua estrutura, composta por alvenaria, foi desenhada pelo tenente-coronel Afonso Botelho Sampaio de Souza.
Segundo o padre Álvaro Cesar Cavazzani, responsável pela paróquia, a última restauração feita no templo foi há 7 anos. O problema principal, ainda conforme o sacerdote, é o telhado. Com as chuvas, a parte interna acabou sendo afetada. “Em 2014, foi feita uma reforma. Mas, hoje, está precisando de uma nova revitalização. O telhado está deteriorado. Essas telhas antigas são amarradas, e, com o passar do tempo, elas vão descendo. O local está com infiltrações. Precisamos viabilizar recursos, porque o IPHAN apresenta o problema para nós, mas na hora de ajudar na obra, não vem nenhum recurso“, afirmou.
O pároco relatou, também, que os processos para captar dinheiro são feitos por meio eletrônico. De acordo com ele, dois meses é o prazo para arrecadar fundos, que somam mais de R$ 90 mil. “Estamos fazendo uma vaquinha virtual, no valor de R$ 95 mil. Nós iniciamos esse processo de 60 dias, para conseguir verba. Estamos, também, por meio da nossa associação, que é o Instituto Social e Cultural Mãe do Bom Sucesso, levantando recursos pela conta bancária”, completou.
Vaquinha sugerida pelo diretor de Cultura e Turismo
Diante da situação em que se encontra a igreja, o padre Álvaro foi buscar ajuda na prefeitura da cidade. Ele participou de um encontro com profissionais do órgão municipal, no qual foram discutidas diferentes formas de angariar dinheiro para a obra. De acordo com o diretor de Cultura e Turismo de Guaratuba, Marcos Fedato, a arrecadação pela internet foi sugerida em meio à reunião.
“Durante conversa com o padre sobre o IPHAN, Governo Estadual e os meios teóricos para conseguir um financiamento para esse restauro urgente, falamos que esses recursos seriam morosos, demorados. O IPHAN, ele visa o que tem que fazer, porém, para liberar verbas, é muito difícil. Portanto, sugeri que fosse feita uma vaquinha para adiantar o processo. Pesquisamos vários sites de vaquinha virtual. Chegamos ao site da kickante, que era o mais confiável. Preenchi os dados em nome do Instituto que a igreja mantém”, disse o diretor, o qual se prontificou a ajudar o padre de forma voluntária na captação das verbas.
Fedato também explica que o padre Cavazzani havia feito um orçamento com uma empresa da cidade. Só de mão de obra seriam gastos R$ 92 mil. Com isso, um novo orçamento foi realizado, e, desta vez, o valor ultrapassou os R$ 130 mil. “Fiz contato com uma outra construtora da cidade. Eles fizeram uma avaliação in loco, um novo orçamento com pinturas da igreja, do assoalho e do forro. Além do estudo dos trabalhos de descer as telhas, lavá-las, impermeabilizá-las, arrumar o madeirame de cima e recolocar as telhas. Tudo isso sairia por R$ 134.800 mil”, destacou.
Processo burocrático
Ainda segundo Marcos, para que a igreja seja beneficiada com os recursos, sejam eles do Governo Estadual ou Federal, é preciso passar por um processo rigoroso de prestação de informações sobre o imóvel. “É tão burocrático, que eu fiz um levantamento por meio do site da Superintendência de Comunicação e Cultura do Estado, que é o órgão que tem subsídio para isso. Só de documentos, plantas da igreja, histórico, atestado, deu quatro páginas. Isso é somente para entrar com um processo de análise, para depois eles decidirem se apoiam ou não. Aí, apoiando, é mais uma série de documentos, notas fiscais. Eu não tiro a razão deles. Infelizmente, outras entidades não tão sérias captaram recursos e por isso há tanta exigência”, complementou.
O diretor da prefeitura e voluntário da igreja finaliza a entrevista pedindo o apoio da comunidade local e de empresários da região. “Estamos, de toda maneira, tentando divulgar. Estamos dando tiro para todo lado, para ver se de repente cai alguma verba ou uma alma boa que nos ajude. Estamos, também, em busca de patrocinadores e apoiadores”, finalizou.
A vaquinha virtual já arrecadou mais de R$ 400. Vale lembrar que, para contribuir com a obra, basta entrar no site www.kickante.com.br/campanhas/reforma-na-igreja-bi-centenaria-guaratubapr e escolher o valor que pretende doar. É possível, também, depositar qualquer quantia por meio da conta do Banco do Brasil, administrada pelo Instituto Cultural e Social Mãe do Bom Sucesso. A Agência é 2100-8 e a Conta Corrente 22303-4.
O que diz o IPHAN
Para saber como funciona a questão da responsabilidade de restauração do monumento histórico, o JB Litoral conversou com o arquiteto e urbanista do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, José Luiz Desordi Lautert. Ele explicou que, mesmo que haja o tombamento pelo IPHAN, não significa que o órgão tem a obrigação de destinar verbas.
“O IPHAN não tem orçamento. A igreja é tombada pelo Estado. Isso não quer dizer que o instituto é obrigado a colocar dinheiro. O tombamento é só um reconhecimento do espaço a nível federal. Ele não significa desapropriação e não tira a propriedade do bem. A responsabilidade de manutenção é do proprietário. O bem pode ter tombamento municipal, estadual e federal. Em qualquer nível dessas esferas, ele pode apresentar um projeto para a Lei Rouanet. Caso seja aprovado, a congregação ou o produtor cultural vai captar recurso para fazer a obra”, destacou Lautert.
O arquiteto aproveitou para destacar a relevância da Igreja Matriz. Ele citou participações importantes no processo de registro do templo bicentenário de Guaratuba. “A igrejinha é muito importante, porque ela foi um dos primeiros bens tombados a nível federal, aqui no Paraná, desde o início do Iphan. Ela foi arrolada em uma lista por David Carneiro (engenheiro, historiador e poeta) e enviada para Rodrigo Melo Franco, que na época era o presidente do Iphan. Isso na década de 30, quando o Instituto foi criado”, concluiu.