Dirigentes das Escolas de Samba de Antonina falam sobre situação financeira, após cancelamento do Carnaval
A pequena cidade de Antonina, que todos os anos se transformava em palco para a realização de grandes atrações carnavalescas, neste mês de fevereiro, não receberá a multidão de foliões, a qual costumava lotar a famosa Avenida do Samba, durante as apresentações. Em 2020, conforme dados da prefeitura, cerca de 90 mil pessoas passaram pelo município nos cinco dias de festa. Este ano, por conta da pandemia, não será possível superar a marca de visitantes que adotam a cidade nesta época.
De acordo com a presidente da Associação das Escolas de Samba, Blocos Carnavalescos e Folclóricos de Antonina (AESBA), Elise Nilce Corrêa, a folia, que aconteceria entre os dias 12 e 16 de fevereiro, será transferida para julho. Segundo ela, apesar dessa mudança no calendário, ainda não é garantido que ocorra o Carnaval.
“Pensando na segurança dos nossos foliões, dos turistas e de todo o pessoal que trabalha nos bastidores do Carnaval, não haverá a festa. Nós transferimos para julho. Daqui a cinco meses, o Carnaval contará com apresentações dos blocos aos sábados, porque as escolas de samba não irão para a avenida. O concurso de fantasias será na sexta-feira e sábado. Depois terá o baile público, com a Banda 50 graus. Mas isso se tudo estiver nos conformes com relação à pandemia”, disse.
Elise Nilce relatou, também, que sem a festividade, houve uma queda nas finanças desse setor, já que muitas instituições sobrevivem da arrecadação de fundos para se manter. Segundo Corrêa, foi sugerida aos artistas e carnavalescos do município a realização de um cadastro para recebimento de um auxílio fornecido por meio de lei de apoio à Cultura. “Houve e está havendo um impacto, ainda, porque as escolas de samba têm luz e água para pagar. Teve uma lei, a de Aldir Blanc, que era para elas terem acessado e enviado os documentos. Apenas duas conseguiram enviar. Não sei se vão conseguir receber”, pontuou.
A presidente da AESBA destacou, ainda, que a entidade trabalhará, por meio de uma outra Lei de Incentivo à Cultura, do Governo Federal, para levantar recursos. Ela complementou dizendo que espera que tudo se normalize para que, em 2022, o Carnaval volte como era antes. “A Associação não pôde trabalhar o ano passado inteiro. Então, agora, temos uma empresa que irá fazer os projetos para arrecadação de verba. Ela colocará o projeto nas normas da Lei Rouanet. Mas, Carnaval, realmente, só em 2022. Isso, claro, se todos estiverem vacinados. Para o ano que vem, esperamos uma festa com toda pompa e toda glória”, concluiu.
Como as escolas estão sobrevivendo
Antes da chegada do novo coronavírus, as escolas de samba realizavam shows e diversos eventos, durante o ano todo, para conseguir arrecadar dinheiro. Diante disso, para saber como estão pagando as contas sem as verbas, o JB Litoral falou com os dirigentes das quatro agremiações de Antonina.
O presidente do Grêmio Recreativo do Batel, Durval Nogueira, informou que a quadra da escola está sendo mantida por meio de cobrança de uma taxa repassada pelos sócios da instituição. “A gente cobra a mensalidade dos sócios patrimoniais. Com essa arrecadação, dá para pagar a manutenção da quadra. Temos uma média de 40 sócios. A mensalidade é de R$ 20. Com isso, dá para pagar água e luz e ainda sobra um pouco”, contou Nogueira, responsável pela escola de samba mais antiga da cidade, a qual foi fundada em 1947.
Criada em 08 de fevereiro de 1948, a Filhos da Capela, por meio da presidente Sibelly Caroline, disse que as contas só estão sendo pagas, durante este ano, porque há uma reserva. Mesmo assim, ela confirma que a queda no faturamento por conta da pandemia é grande. “Como temos dinheiro em caixa, é isso que está pagando as contas da escola. Foi feita a venda de pizzas, o ano passado, para pagar gastos da escola. Mas é um prejuízo, porque trabalhamos o ano inteiro fazendo eventos, para colocar a escola na avenida. E um evento só, que a Capela faz em parceira com o Rota 22, dá em torno de R$ 7 mil”, relatou a carnavalesca, a qual está há dois anos à frente da escola de samba.
Sobre a correria que seria neste período, caso tivesse o Carnaval, Sibelly comentou como eram os trabalhos com a sua equipe, para a preparação das fantasias. “Em dezembro, a gente já estava dentro da quadra, confeccionando as fantasias, fazendo os ensaios. Ficávamos direto no barracão. Sentimos falta disso. Nos últimos dias, até dormíamos na sede da escola. Só vinha para casa tomar banho e voltava”, relembrou.
Portinho e Leões de Ouro
Já a Unidos do Portinho, que fará 41 anos no dia 22 de fevereiro, não possui uma sede fixa. Mas a representante do grêmio Janeci Freire, não deixou de salientar a dificuldade que está sendo enfrentada diante da pandemia da Covid-19. “A situação não está fácil nesta pandemia. Realmente, nós não temos barracão, ainda. Mas, graças a Deus e a minha comunidade, não devemos nada. Não estamos trabalhando porque foi pedido, em reunião, para não colocar ninguém em risco. A comunidade do Portinho envolve muitos componentes de idades variadas”, completou.
Assim como Sibelly, Janeci explicou como eram os dias festivos, em Antonina. Conforme ela, o movimento e os trabalhos para colocar a escola no desfile eram intensos. “Se tivesse Carnaval, seria o pico, seria uma movimentação glamourosa. Estaríamos trabalhando bastante, fazendo eventos com a comunidade, para arrecadar fundos, porque não temos um patrocinador. É uma pena tudo o que está acontecendo”, finalizou.
E, por fim, a presidente da Escola de Samba Leões de Ouro, Eliane Terezinha Mendes, pensando nas vítimas que perderam a batalha para a Covid-19, começou a entrevista dizendo que caso ocorresse a festa, não haveria alegria. “Na verdade, não teria clima, visto que estamos vivendo um momento de profunda condolência por vidas ceifadas. Seria até desumano se pensássemos em Carnaval, pois é uma festa alimentada pela alegria, que, inclusive, já não temos. A dor dos outros também nos entristece”, lamentou.
A dirigente encerrou alegando que, apesar de não ter dívidas, seria preciso angariar recursos, caso tudo fosse normalizado. “Foi um ano atípico. Apesar de não termos contas para pagar, seria necessário fazer eventos, para darmos conta da elaboração e confecção das fantasias, alegorias, etc. Nada disso seria possível sem aglomeração, que, agora, é inevitavelmente impossível. Guardaremos os tamborins e a euforia para tempos melhores”, concluiu a presidente da Leões, que está à frente da escola desde a sua fundação, datada em 16 de fevereiro de 1991.
Secretário de Turismo comenta impacto negativo
O secretário de Turismo e Cultura do município, Thiago Afonso de Souza, aproveitou para comentar a situação financeira do comércio local. De acordo com ele, como essa crise é geral, não há nada que possa ser feito. “O impacto é muito grande, porque nesses dias, as redes de hotelaria e restaurante ficam cheias. Mas está sendo geral. Não tem nem o que fazer. Infelizmente, a parte de hotelaria está sofrendo há muito tempo, desde que iniciou a pandemia. Acho que nunca voltou ao normal. Está melhorando, mas como era antigamente, não voltou ainda”, afirmou.
Ele explicou, também, sobre o recolhimento de tributos, já que com a falta de turistas na região, a situação acaba refletindo na arrecadação do órgão municipal. “Se o hotel lucra bastante, ele vai gerar nota. Então, é necessário pagar ISS, e assim vai. Com a falta de movimento, a prefeitura também perde, porque ela deixa de arrecadar uma parte”, informou.
O ano passado, o Carnaval de Antonina foi patrocinado pela Companhia Paranaense de Energia (Copel) e a prefeitura disponibilizou recurso para cada escola de samba. O secretário relatou, ainda, que este ano também seriam repassados aos presidentes uma ajuda de custo para a realização dos desfiles. “Desde março eles não conseguiram fazer nenhum evento. E mesmo que pudessem fazer Carnaval este ano, eles não iriam conseguir, porque ficaram parados desde o ano passado. Em 2020, as escolas receberam dinheiro da prefeitura para desfilarem, assim como os blocos. Esse ano teria também”, concluiu Souza.
Empresária fala sobre a crise
A dona de um hotel tradicional, localizado na região central e considerado o mais antigo da cidade, confirmou o que disse o secretário de Turismo e Cultura de Antonina. Ela afirmou que, mesmo passando por dificuldades, era preciso limitar alguns atendimentos por conta do medo da doença. “O impacto é gritante. O nosso setor foi um dos mais afetados, se não, o mais. Não tem turista, a gente tem uma redução muito alta. Quando tudo aconteceu, mesmo passando por toda situação financeira, eu restringia reservas. Eu fico dividida entre a mãe e a empresária. Então, para mim é muito difícil. Estou segurando muitas situações financeiras em prol do que é necessário para a minha segurança e da minha família”, desabafou France Lys Pereira Maurício, responsável pelo Hotel Capelista, que está há 52 anos em funcionamento.
Os lucros obtidos durante os cinco dias de festa, segundo France, davam uma garantia de estabilidade para a empresa durante um certo tempo. Ela, que perdeu um familiar por conta da Covid-19, disse, também, que mesmo sabendo que a situação financeira não está favorável, é um favor o cancelamento do Carnaval. “Com certeza, o carnaval gera, para nós, uma renda que dá para dar uma respirada durante meses. Apesar de toda essa crise, eu sou a favor de que não tenha. Recentemente, perdi uma tia para a Covid-19. Está sendo chocante. Com todo cuidado e toda restrição, o coronavírus ainda levou a minha tia que trabalhava comigo”, relatou.
Com isso, o Hotel Capelista passou a operar com uma margem de, no máximo 10%. Essa porcentagem corresponde ao número de turistas que passam pela região. De acordo com a empresária, o que está mantendo o seu empreendimento são pessoas que vão prestar serviços para as empresas do município. “Mesmo com pouca hospedagem, estou conseguindo manter o básico do hotel. Estou trabalhando com uma margem de 8 a 10%, caiu 90%. Na verdade, readaptei muita coisa, para que o hotel ficasse aberto. Reduzi os custos, totalmente, para que o hotel ficasse aberto e eu conseguisse manter seis funcionários. Estamos sobrevivendo com isso, com trabalhadores e outras pessoas que vêm fazer serviço no Porto”.
Antes da pandemia, as reservas eram realizadas um semestre antes do Carnaval. Lys está na torcida para que tudo volte ao normal o mais rápido possível. “Às vezes, eles faziam reservas seis meses antes, com diárias de 50% pagas. Era um sonho. Se Deus quiser, depois de todos vacinados, isso vai voltar. A gente conseguia, realmente, sobreviver tranquilo por alguns meses”, concluiu.
Como era a programação
Vale destacar que Antonina, na sexta-feira de Carnaval, realizava o concurso do Rei e Rainha. No sábado, os blocos folclóricos participavam do evento. No domingo, era a vez das escolas de samba desfilarem pela avenida principal. O tradicional Concurso das Escandalosas ocorria na segunda. Já na terça, último dia de folia, o baile público dominava a noite na cidade.
Ponto facultativo também é cancelado
Os prefeitos e representantes dos sete municípios do litoral paranaense cancelaram o ponto facultativo do Carnaval deste ano. A decisão foi tomada no dia 3 deste mês, em um encontro feito pela Associação dos Municípios do Litoral do Paraná (Amlipa). Com isso, as repartições públicas municipais funcionarão nos dias 15, 16 e 17 de fevereiro. O governador Carlos Massa Ratinho Junior (PSD), também suspendeu a data em que o trabalho é opcional no poder executivo. Além disso, Ratinho proibiu, em todo o estado, festas e eventos relacionados ao Carnaval, sejam elas públicas ou privadas.