Policial é suspeito de encomendar a morte da esposa, em Morretes; “degola ela”


Por Redação Publicado 31/12/2022 às 13h35 Atualizado 18/02/2024 às 01h40

Uma história que poderia, facilmente, ser confundida com um roteiro de filme: um ex-marido infiel, inconformado com o divórcio e com os prejuízos financeiros acarretados por ele, trama a morte da mulher para, então, viver com a amante na residência construída durante o primeiro casamento. Mas, o que ele não contava, era que o contratado para executar o assassinato teria compaixão e denunciado toda a situação à polícia.

A história é supostamente real e foi vivida pela moradora de Morretes T.C.C, de 37 anos, casada há 22 anos com o policial militar Marcos Wilson Hubie, com quem possui um filho de nove anos. Temendo por sua vida, ela procurou o JB Litoral para denunciar a situação e expor o caso, em busca de justiça.

Tudo começou no dia 24 de dezembro, quando policiais militares e civis foram busca-la em casa, pedindo apenas para que ela confiasse neles, pois tudo era para o seu bem. “Eu estava me arrumando para ir para a casa da minha mãe no Natal, e escutei o barulho da viatura na frente de casa. Era a Polícia Civil e a Militar, me disseram para acompanha-los até a delegacia e para confiar neles, porque era para o meu bem”, conta T.C.C.

Ela foi até a delegacia de Morretes junto com seu pai, onde foram informados de que seu ex-marido Marcos teria planejado, para a noite do dia 24, sua morte. “Eles me informaram que ele tinha contratado alguém para dar cabo da minha vida, que tinha comprado uma faca, uma balaclava e um tênis para o rapaz, e que iria entregar tudo isso e, no dia 24, eu sairia à noite. No trajeto era para esse rapaz me pegar, roubar meu celular, enfiar a toca na minha cabeça e me degolar. Descobri isso porque os policiais foram na minha casa me buscar”, diz a vítima.

Boletim de Ocorrência

A denúncia é sustentada pelo Boletim de Ocorrência registrado no dia 24 de dezembro, às 16h57, na Delegacia de Polícia de Morretes, ao qual o JB Litoral teve acesso. No documento, o suposto contratado para o homicídio denuncia à polícia as instruções que recebeu; a reportagem irá preservar o nome do denunciante.

“(…) vem até esta unidade policial para informar que, aproximadamente um mês atrás, no fim de novembro, foi procurado pela pessoa de Marcos (policial militar), que disse que pagaria R$ 2 mil para que ele fizesse um serviço para ele, e que após o serviço, durante um ano, pagaria R$ 1 mil por mês pela realização do serviço. Serviço este que consistia em matar a ex-esposa de Marcos; ele não citou o nome dela, mas disse que ela morava na casa dele. Descreveu como deveria matá-la: teria que roubar o celular para que parecesse latrocínio, pois se fosse homicídio, as suspeitas iriam para ele, entregou uma faca com cabo de madeira, alegando que não ficava digitais”, diz um trecho do documento.

Em outra parte, o B.O. afirma que o contratado conhece Marcos desde a infância, e que o teria aconselhado a pensar melhor no que estava pedindo a ele, e nesta data disse que não faria o serviço. “Então o senhor Marcos disse que a motivação seria porque ele perdeu a promoção da PM deste ano, e sua ex-esposa não quer desocupar o imóvel, e ele queria o imóvel para ele e o filho”, informa.

Usa a faca de madeira e degola ela”, orientou o policial, segundo B.O.

O documento também destaca que no dia 23 de dezembro, por volta das 20h, Marcos foi até a casa do rapaz que havia contratado, para explicar onde deveria realizar o serviço – na linha férrea, entre a Raia Velha e o Ferroviário. O B.O. informa que o suposto mandante insistiu para que o homem matasse a ex, e explicou como deveria executar. “Pegar a ex-mulher indo para o baile Tradição, na data do dia 24, que ela passa por ali por volta das 21h, que deveria usar a faca de cabo de madeira e degolar ela”, diz.

O Boletim de Ocorrência ainda informa que no dia 24, à noite, por volta das 19h30, o rapaz deveria ir até a casa de Marcos para pegar a balaclava, a faca e um calçado para não ficar pegadas, e depois jogar tudo fora. Há ainda a informação de que, provavelmente, Marcos estaria de serviço e atenderia a ocorrência como um roubo, que “não daria nada nem para ele e nem para o contratado”, visto que ele é usuário de drogas e estaria “fumando uma pedrinha no trilho”, sendo descartado.

À polícia, o homem contratado disse que estava querendo fugir da cidade, porém ficou com pena da mulher e resolveu procurar a delegacia para relatar o fato. Todas as informações acima constam no B.O.

Casamento de 22 anos

Casados no papel há 22 anos, T.C.C. conta que nunca imaginou que Marcos pudesse ser capaz de algo assim. Ela diz que os problemas no relacionamento começaram em 2019, quando ele teve um caso extraconjugal.

Eu descobri, a gente ficou quase um ano separado, mas acabei dando outra chance por conta dos anos, do filho. Só que nunca mais foi a mesma coisa, porque sempre ficou a desconfiança”, diz.

Mesmo após a descoberta da traição, ela decidiu dar mais uma chance ao marido e, portanto, eles reataram o casamento, quando, em 2021, novamente a relação passou por dificuldades. “Ele começou com as mesmas atitudes que me faziam desconfiar; escondendo o celular. Mas ele sempre jogava a culpa em mim, fazia tortura psicológica. Ele começou a me ofender com palavras, me diminuindo, me humilhando, até que passou a me agredir fisicamente, então eu fiz um B.O. e uma medida protetiva. Ele saiu de casa, só que sempre vinha me procurar, chorando, dizendo que me amava, e fui me deixando levar, acabei me iludindo e retirei a medida protetiva para mais uma vez tentar, achando que daria certo”, conta T.C.C.

Eles retornaram mais uma vez, no final de 2021, mas ela comenta que o relacionamento nunca mais foi mesmo. Além disso, a maior parte do recurso financeiro da casa vinha de Marcos, já que ela é manicure e atende sob demanda.

Além de tudo, ele sempre usava isso contra mim, dizendo que dependia dele, questionando o que seria do meu filho sem ele. Ele também começou a me culpar por não crescer na carreira, dizendo que eu ferrei com ele quando fiz a medida protetiva, e que por isso ele não conseguia a promoção”, diz.

Fim da relação em novembro

Aos trancos e barrancos, o casamento seguiu até o começo de novembro de 2022, quando Marcos deu um ponto final à relação afirmando que não dava mais, pegou suas coisas e foi embora da residência do casal. No final do mesmo mês, T.C.C. descobriu que a amante de seu marido estava grávida.

Mesmo assim, fora de casa, com a amante, ele vinha até a minha casa com o intuito de ver nosso filho, e ficava dizendo que me amava, que eu era amor da vida dele, que queria ficar comigo. Mas falei que não queria mais, que queria seguir minha vida com meu filho em paz. Ele surtava, dizia que se me visse com outro ia me matar; matar a outra pessoa, arrancar a nossa cabeça. Na cabeça doentia dele eu sou posse dele. Me perseguia na rua e mandava mensagem toda hora, querendo saber o que eu estava fazendo, ligava”, diz a mulher.

Ela também comenta que Marcos queria ficar na casa, alegando que tinha direito, pois havia construído a residência.

Não quero que isso fique impune”, diz esposa

Sobre toda a situação descoberta no último dia 24, ela diz que está em choque e com muito medo e, por isso, buscou a imprensa para dar amplitude à situação, vislumbrando uma proteção. “Eu estou vindo falar porque não quero que isso fique impune. A polícia descobriu tudo porque o rapaz contratado foi na delegacia e entregou ele, porque ficou com pena. Mas a polícia me informou que há semanas estava cuidando de mim, porque logo que o Marcos saiu de casa, estava planejando isso. Então a Polícia Civil já estava investigando, mas o que sinto é que a Polícia Militar está tentando encobrir”, comenta.

T.C.C. revela que, após a situação, ela solicitou uma medida protetiva contra o marido e que a PM transferiu Marcos de Morretes para Antonina, mas que ainda não é o suficiente. “Em 15 minutos ele está em Morretes. Eu quero uma atitude que mandem ele para longe. Não adianta ele ficar do lado, porque sempre está sendo visto por aqui. Ele pode mandar outra pessoa para me matar, pode fazer outra coisa”, fala.

Depois que eu estiver morta vão atrás dele?”, desabafa

Inconformada com o caso, a mulher se questiona se “ficará por isso mesmo”. “Ele tem que ser punido, ele planejou fazer isso e não pode simplesmente ficar impune. Ele está vivendo a vida dele enquanto eu vivo com medo. Estou na casa dos meus pais, não estou indo para casa, nem trabalhar, minha vida parou. O que a minha vida é? Não é nada? É descartável assim? Depois que acontecer algo comigo, depois que eu estiver morta vão atrás dele? Depois que meu filho não tiver mais a mãe dele? Eu sou a base do meu filho desde que ele nasceu, cuido dele dia e noite. Quero justiça. Ele não tem direito de escolher tirar a minha vida a hora que ele quiser”, desabafa.

De acordo com o advogado Rogelson Luiz Vieira Júnior, todo crime passa por etapas, que vão desde a cogitação até a consumação da infração. No entanto, como o caso foi descoberto antes de sua execução, apenas a premeditação não se enquadra em nenhuma modalidade prevista no Código Penal.

Uma das etapas do Iter Criminis (o caminho do crime), consiste na fase dos atos preparatórios, na qual o agente toma as providências para a realização do delito. Nesse caso, a responsabilidade penal do investigado teria de ser verificada no caso concreto, tendo em vista que a execução do crime ainda não teve início, logo, não poderia ser punido, nem na modalidade tentada – quando o agente dá início à execução do crime, mas não consume o fato. Todavia, é necessário averiguar se os atos preparatórios em si também são objetos de outro tipo penal, hipótese na qual o agente poderá responder criminalmente. O caso ainda está na fase de inquérito e será analisado pelo Ministério Público para verificar se existem indícios que justifiquem oferecer uma denúncia e dar início a um processo criminal para apuração do fato pelo juiz competente”, explicou ao JB Litoral.

O que diz a PM e PC

O JB Litoral também procurou a Polícia Militar do Paraná, questionando a respeito da situação e se o policial seria punido. “A Polícia Militar do Paraná informa que não foi comunicada sobre o fato denunciado e que o inquérito policial é da Polícia Civil. No entanto, reforça que, caso a suposta vítima queira fazer a denúncia à PMPR, pode procurar a Corregedoria da Polícia Militar para a possível instauração de procedimento investigativo interno da corporação. A Polícia Militar não compactua com o desvio de conduta de seus militares estaduais e atua sempre em prol de reestabelecer a verdade dos fatos”, informou a corporação.

A Polícia Civil também foi procurada e informou que instaurou um inquérito policial para apurar o caso e solicitou medidas protetivas para a vítima. “As investigações estão em fase final. Todas as diligências cabíveis estão sendo realizadas”, disse.

Marcos foi procurado pelo JB Litoral

O policial militar Marcos Wilson Hubie foi procurado pelo JB Litoral, contudo, passou o contato da advogada Luana Marques Borges, a qual está o representando. De acordo com a advogada, “o senhor Marcos está buscando entender toda esta situação, pois ele se mostra tão surpreso e atônito quanto todos, com esta história absurda que foi criada por este rapaz. Toda esta história, que originou esta denúncia, não possui qualquer fundamento, sendo uma completa invenção. No entanto, toda e qualquer informação sobre este caso será tratada diretamente no processo”, afirmou.

Ela destacou, ainda, que “respeita o sigilo do processo e a intimidade das partes envolvidas, para não gerar uma exposição desnecessária, principalmente em um caso que o Poder Judiciário trata com sigilo”, por isso, esclarece que “se houver alguma exposição desnecessária, exacerbada ou vexatória da imagem ou do nome do Sr. Marcos, eu precisarei tomar as medidas cabíveis em face dos responsáveis”.

Por fim, respeitosamente, ressalto que esta situação ainda está em fase de investigação, então, se for veiculado por qualquer meio, trecho ou imagem das informações constantes neste boletim de ocorrência o qual lhe foi dado acesso, também serão tomadas as medidas legais cabíveis, visto que se trata de documento protegido por sigilo”, concluiu.