Vidro que era lixo vira arte e renda em Matinhos: projeto “Fundição Guará” transforma descarte em oportunidade


Por Luiza Rampelotti Publicado 03/09/2024 às 14h46

Um dos grandes desafios ambientais atuais é o acúmulo de lixo gerado pela atividade humana. Segundo o Sistema Nacional de Informações sobre Resíduos Sólidos, o vidro é a matéria-prima menos reciclada no Brasil, com uma taxa de reciclagem de apenas 11%. Além disso, o vidro pode levar até um milhão de anos para se decompor, agravando o problema do acúmulo.

Em resposta a essa situação, o projeto “Fundição Guará” nasceu recentemente em Matinhos, com a responsabilidade de converter resíduos de vidro em arte. A iniciativa, apoiada pela Prefeitura, oferece curso gratuito de artesanato com vidro, proporcionando aos moradores aprendizado e geração de renda.

A mente por trás dessa iniciativa é a designer Désirée Sessegolo, uma das maiores referências da arte em vidro no Brasil e que, além de brilhar no cenário internacional do segmento, busca, com paixão e dedicação, transformar vidas e o meio ambiente. Ela atribui o diferencial de sua obra à falta de escolas especializadas e à ausência de materiais de alta qualidade no Brasil. “Eu fiz uma pesquisa com o que existe aqui, o que é acessível aqui e aí o meu trabalho seguiu um rumo completamente diferente do que é feito em outros lugares do mundo“, explica. Utilizando materiais e insumos nacionais, ela desenvolveu uma linguagem própria que chamou a atenção internacional.

Fundição Guará

Com mais de 15 anos de experiência e uma bagagem de mais de 60 exposições ao redor do mundo, Désirée, natural de Curitiba, escolheu Matinhos como lar há alguns anos. “A Casa da Cultura de Matinhos acolheu super bem a minha ideia de trazer o ateliê para cá e, em contrapartida, disponibilizei todo o meu material, meus insumos, os fornos, para ensinar a comunidade a trabalhar com a arte em vidro. Isso foi feito dentro do projeto Fundição Guará, realizado por meio da Lei Rouanet, que vai durar um ano inicialmente”, explica ao JB Litoral.

De acordo com ela, o projeto Fundição Guará visa formar novos artesãos utilizando vidro de descarte, um recurso subaproveitado no Brasil. “Além de promover a sustentabilidade, a iniciativa também gera renda para a comunidade local. E, com o apoio da Casa da Cultura, os alunos têm a oportunidade de vender suas criações nas feiras de Matinhos”, diz a designer.

As aulas ocorrem na Arena Vicente Gurski às quintas-feiras, acolhendo cerca de 40 alunos de todas as idades, unidos pelo interesse em transformar o descarte em arte. “Em Matinhos, muitos vivem da pesca ou do turismo, mas essa oportunidade de aprender uma nova técnica, de gerar renda e de contribuir para o meio ambiente, abre portas para novas possibilidades”, destaca Désirée.

Exposição e reconhecimento

Os frutos do trabalho podem ser vistos na exposição “Transforma”, aberta ao público de 14 de agosto a 14 de setembro no Paço Municipal. A mostra apresenta obras e utilitários produzidos pelos alunos, todos desenvolvidos a partir de garrafas, espelhos e vidros planos reciclados, utilizando técnicas de vitrofusão em fornos de alta temperatura.

Cada peça da exposição carrega não apenas o talento e a criatividade dos alunos, mas também uma mensagem poderosa sobre a importância da reciclagem e do reaproveitamento. Os visitantes têm a oportunidade de ver como o vidro, que muitas vezes é considerado um resíduo, pode ser transformado em arte de alto valor, refletindo a riqueza da fauna, flora e dos pontos turísticos da cidade”, avalia Désirée Sessegolo.

Os alunos do projeto, como Kátia Araújo e Maria Teresa Rivera Vaz, expressam com entusiasmo o impacto que a Fundição Guará teve em suas vidas. Kátia, estudante de licenciatura em Artes da Universidade Federal do Paraná, vê o curso como uma chance de aprendizado e uma possível nova fonte de renda. “Matinhos é uma cidade turística, e este projeto pode se tornar uma nova fonte de renda e um hobby gratificante. Além disso, o aspecto ambiental é fundamental, pois transformamos vidro descartado em arte”, explica.

Maria Teresa, com anos de experiência em artesanato, destaca a importância da sustentabilidade e do aprendizado constante que o projeto oferece. “A cada dia, aprendemos algo novo e inovador. A capacidade de reutilizar vidro descartado e transformá-lo em algo belo e útil é uma experiência maravilhosa. Esse projeto é um verdadeiro exemplo de como a arte pode contribuir para a sustentabilidade”, afirma.

Projeção internacional

O Fundição Guará também está ganhando reconhecimento além das fronteiras do Brasil. Em setembro, o projeto será representado no The Venice Glass Week, o mais importante festival de arte em vidro do mundo, em Veneza, na Itália. Uma das obras da exposição “Transforma” será selecionada para representar o Brasil, destacando o diferencial da arte vidreira brasileira com um enfoque socioambiental, marca registrada de Sessegolo e do projeto.

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