Comunidades indígenas da Ilha da Cotinga enfrentam dificuldades durante a pandemia


Por Redação JB Litoral Publicado 23/07/2020 às 17h14 Atualizado 15/02/2024 às 13h20

Por Andresa Costa

A crise pandêmica dificultou a vida para a sociedade em geral e, mais ainda, para todos os que dependem das ações governamentais de suporte à sua subsistência, inclusive os que precisam de adubo para uma terra forte ou as sementes para sua agricultura familiar.

Esse é o retrato das comunidades indígenas na Ilha da Cotinga, sem nenhum apoio ao plantio. Excluídos na maior parte do ano pelo Poder Público, neste momento de pandemia do coronavírus (Covid-19), as aldeias atravessam uma difícil situação.

Embora a tradição do cultivo tenha passado de geração a geração, a cada ano as áreas de plantio têm diminuído, pois além dos espaços destinados às plantações serem reduzidos, devido à baixa fertilidade do solo, a procura por alimentos industrializados, principalmente pelos mais jovens tem aumentado. Os cultivos mais predominantes são milho, mandioca, feijão, amendoim e batata doce.

Juliana Kerexu; “Nada do Governo do Estado chegou para nós até agora”

Apenas a Tekoá Takuaty, uma das cinco comunidades guaranis que existem na região, não recebe subsídio público desde o mês de abril. O auxílio veio da prefeitura, por meio do Centro de Referência de Assistência Social de Paranaguá (CRAS), mas desde o início da pandemia a ajuda cessou. De acordo com a cacique Juliana Kerexu Mirim Mariano o auxílio maior chega por meio de doações da população. Com a incerteza do fim da crise, ela relatou o seu medo de faltar o sustento para o seu povo. “Se pararem essas doações não sei como vamos fazer, ninguém tem um trabalho que possa receber salário. A gente não sabe quando isso vai acabar. Isso me tira o sono, pensar que se essas doações podem não vir amanhã, vai ser muito mais difícil”, lamenta.

Na semana passada, a cacique Juliana relatou ao JB Litoral que os moradores da Ilha da Cotinga receberam apenas seis cestas básicas. Só a aldeia Tekoá Takuaty é formada por 22 pessoas, distribuídas em cinco famílias. A reportagem questionou a Fundação Nacional do Índio (FUNAI), responsável pela distribuição dos alimentos. Em nota, a assessoria de imprensa disse que, “as cestas foram adquiridas pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), com recursos do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos (MMFDH)”. Porém, não informou o número de mantimentos distribuídos à comunidade.

AUXÍLIO ANUNCIADO

No início deste mês, o Governo do Estado, por meio da Secretaria da Justiça, Família e Trabalho destinou 30 mil cestas básicas para famílias de povos indígenas em todo o Paraná. De acordo com informações da Sejuf, “a entrega das cestas complementa os kits de merenda escolar que são oferecidos a cada 15 dias pela Secretaria da Educação. Os recursos são do Fundo da Infância e Adolescência (FIA) e o repasse deliberado pelo Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente (Cedca)”.

O JB Litoral perguntou à cacique a respeito da vinda dos mantimentos e, segundo ela, “nada do Governo do Estado chegou para nós até agora”. Foi questionado, então, com a assessoria de imprensa da Sejuf em relação ao repasse das cestas básicas para a comunidade indígena, mas não houve resposta.

. Antes da pandemia, as comunidades indígenas tinham como base de renda a venda de artesanatos em Paranaguá.

EMATER

O Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (EMATER), órgão vinculado à Secretaria da Agricultura e Abastecimento, prestou assistência à comunidade indígena em 2019. De acordo com o gerente municipal, Leoclides Lazaroto, houve um projeto desenvolvido na ilha com renovação de mudas de mandioca, milho e feijão, assim como um plano para desenvolver a terra. “Estamos sempre à disposição para trabalharmos em conjunto e realizar parcerias. Temos vários projetos com associações de produtores e também com empresas portuárias para realizar ações em favor das aldeias”, disse.

TEKOÁ TAKUATY

A aldeia Tekoá Takuaty foi fundada há quase dois anos. Antes, as pessoas viviam em Pindoty, também na Ilha da Cotinga. A região foi homologada como terra indígena em 1993 e abriga indígenas Guarani Mbya. Ambas as aldeias estão em isolamento. Antes da pandemia, as comunidades indígenas tinham como base de renda a venda de artesanatos em Paranaguá. Com os decretos estadual e municipal, esta prática precisou ser interrompida. Para a cacique, o sentimento é de que a população indígena está esquecida. E a chegada de uma doença urbana e as dificuldades para a subsistência podem ser comparadas ao período da colonização. “Agora é o momento mais delicado da nossa história, tirando a época em que os nossos ancestrais chegaram aqui. É como se estivesse acontecendo tudo de novo”, contou emocionada.