Editorial: Sem dignidade para nascer: a revoltante (e repetida) situação do Regional


Por Redação Publicado 06/02/2022 às 16h42 Atualizado 17/02/2024 às 01h18

Era final do ano passado e casos envolvendo mães e seus bebês, com graves denúncias de violência obstétrica no Hospital Regional do Litoral já ocupavam as nossas páginas. Histórias tristes, revoltantes, “dignas” dos piores relatos de tortura, um show de horrores acontecendo bem diante dos nossos narizes, a ponto de se perder a fé nas pessoas… Esse era o cenário no HRL, no apagar das luzes de 2021. Promessas foram feitas de que as denúncias seriam investigadas, caso fossem protocoladas na ouvidoria do hospital que deveria ser referência, deveria ser alento, um porto seguro para as mulheres e seus bebês de todo o litoral, com lindas histórias de vida, não de constrangimentos e traumas. Vem janeiro, nasce um novo ano (sorte de 2022 que não dependeu do atendimento do HRL para nascer) e somos, infelizmente, surpreendidos com mais (des)casos. O primeiro de uma jovem mãe, enfrentando uma saga para conseguir parir o filho já morto. Com dores físicas e psicológicas, a espera de uma vaga para, enfim, realizar o parto. Foram três dias de agonia, sem aguentar de dor e sendo jogada de Morretes, onde mora, para Paranaguá, e a tão merecida vaga surgiu depois do caso já estar sendo cobrado por nós ao hospital e ao estado, na noite do dia 22.

Eis que na manhã seguinte, outra jovem mulher sai de sua casa, em Guaratuba, e chega ao HRL, onde estava marcada uma cesariana para sua caçula vir ao mundo. O dia 23 seria uma data feliz na vida daquela família, mas ao passarem pela porta de entrada, o cenário era outro, tudo lotado, sem chance de ter a pequena nos braços, mandaram o casal de volta pra casa. O dia nem terminou e as dores do parto surgiram, o casal voltou ao hospital. Empatia zero, humanidade zero, a moça, de 21 anos, passou pela agonia de sequer ser examinada, mesmo com os pedidos do marido para que as enfermeiras a avaliassem, durante uma hora e meia. A bolsa estourou e ali, na frente de uma recepção cheia de desconhecidos, expostas ao risco de contaminações, mãe e bebê se conheceram, no chão, como se fossem animais na rua.

O que dizer diante de uma situação tão desumana? Que argumentos serão suficientes para o hospital tentar explicar um desserviço que poderia ter consequências ainda piores para mãe e filha? A bebê está bem, por um milagre, porque se dependesse da assistência que ela merecia, não estaria. A mãe está se recuperando fisicamente, porque o trauma de ter passado por essa experiência, quem vai reparar? O pai, que não arredou o pé do lado da esposa, está até agora com o nó na garganta e não é para menos, esse nó não está só na garganta dele, está na revolta de todos nós.