Guaratuba pode ter tido prejuízo mensal de R$ 1 milhão a R$ 2 milhões nos últimos 5 anos em royalties de petróleo


Por Luiza Rampelotti Publicado 10/08/2022 às 09h35 Atualizado 17/02/2024 às 14h52

Desde maio de 2021, a prefeitura de Guaratuba está buscando, por meios judiciais, corrigir o enquadramento legal realizado pela Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis e, consequentemente, implementar a receita dos royalties mensais recebidos pelo município, decorrente de suas atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural.

Para isso, a Prefeitura contratou, via Inexigibilidade de Licitação nº 1/2021, o escritório de advocacia Perman Advogados Associados, sediado em Brasília (DF). A empresa deve realizar peticionamentos, audiências, sustentações orais, interposição de recursos e tudo que se entender pertinente ao desenvolvimento do processo, até o trânsito em julgado da ação.

Entenda: O Poder Executivo Municipal foi procurado, em fevereiro de 2021, pela Perman Advogados Associados, informando que seu escritório conta com equipe técnica qualificada para defender os interesses do município, aumentando seus créditos tributários e financeiros e fortalecendo-os economicamente.

A empresa informou que Guaratuba é afetada pela exploração de petróleo e gás natural, e que essa relação se materializa através da própria produção e extração em si, bem como pelas diversas instalações que possui, tais como dutoviárias, petrolíferas, gaseíferas e demais estruturas.

Dessa maneira, explicou que os concessionários das atividades de exploração e produção de petróleo e gás natural devem pagar uma compensação financeira aos estados e municípios brasileiros, ao Comando da Marinha e ao Ministério da Ciência e Tecnologia. 

A compensação financeira são os royalties, estabelecidos pela Lei do Petróleo, e para o seu cálculo, são levados em consideração a produção de cada campo, o preço do petróleo e do gás e a taxa de câmbio.

Dado ao grau de complexidade dos critérios de apuração e a constante evolução do cenário das atividades de exploração e produção em cada ente federativo, é comum haver incorreções nos recebimentos. Dessa forma, (…) o fluxo de recebimento dos royalties de petróleo e gás natural em Guaratuba apresenta déficit”, afirmou o escritório de advocacia.

Prefeitura contratou o escritório para buscar a correção do valor dos royalties, que seria de R$ 1 milhão a R$ 2 milhões por mês. Foto: JB Litoral


Prejuízo mensal de R$ 1 a R$ 2 milhões nos últimos 5 anos


Segundo a Perman, estima-se que o município tenha sofrido perdas sucessivas nos últimos 5 anos, que variam entre R$ 1 milhão e R$ 2 milhões.

Com a apresentação feita ao prefeito Roberto Justus (União), a Prefeitura decidiu realizar a inexigibilidade de licitação e contratar a empresa pelo prazo de até 72 meses para mover a ação em busca do ressarcimento e correção dos valores. O contrato define que o pagamento do escritório será feito somente depois do trânsito em julgado da ação, sendo o total de 15% dos royalties vencidos e a vencer com o valor atualizado.

Representação


No entanto, em 2 de março de 2022, o advogado guaratubano André Guilherme Montemezzo realizou uma representação contra o Poder Municipal no Tribunal de Contas do Estado (TCE-PR) devido à situação. Entre outras coisas, ele denunciou que houve ilegalidade na contratação por inexigibilidade de licitação, uma vez que a Prefeitura possui sua própria Procuradoria Jurídica que poderia ter realizado a ação ou, então, aberto um processo licitatório, pois existem outros escritórios advocatícios que fazem o mesmo trabalho.

O objetivo do contrato é cobrar valores supostamente não repassados para o Município que poderiam ser recuperados de forma retroativa (últimos cinco anos) e, ainda, para que estes valores passem a ser recebidos como receita futura. Porém, o tema de recuperação de royalties não é mais novidade e, hoje, muitos escritórios de advocacia e as próprias procuradorias municipais propõem as ações para pleitear este direito”, diz André.

Ele ainda afirma que, de acordo com várias decisões dos Tribunais de Contas da União e dos Estados, quando o Município possui equipe jurídica própria não existe motivos para “terceirizar” essas atividades, que devem ser executadas pelos próprios advogados do ente público.

Empresa pode receber até R$ 30 milhões


O advogado também questiona o valor dos honorários dos profissionais da Perman. Uma vez que a remuneração seria de 15% do valor eventualmente recuperado, ou seja, a quantia não repassada nos últimos 5 anos, com base na previsão da proposta apresentada pelo escritório, os advogados receberiam dos cofres públicos cerca de R$ 9 milhões para propor uma única ação.

Porém, ainda consta no contrato que o escritório deverá receber 15% de todos os valores futuros que vier o município a receber nos 5 anos seguintes, ou seja, uma previsão de mais R$ 9 milhões, totalizando R$ 18 milhões, além dos honorários de sucumbência, que podem variar de acordo com o percentual fixado pelo juízo, mas daria em média R$ 12 milhões.

Esses valores são exorbitantes em razão da baixa complexidade e do tema que já está consolidado há anos nos Tribunais Superiores e, portanto, causam certamente danos ao erário público. Por isso, é importante apurar a legalidade da contratação sem licitação”, comenta André Montemezzo.

O que diz o TCE-PR


O Tribunal de Contas do Estado acatou a representação e determinou a intimação do Poder Municipal, do prefeito Roberto Justus, do procurador geral do município, Ricardo Bianco Godoy, e da Perman, para se defenderem das possíveis irregularidades noticiadas e juntada de documentação que entenderem pertinente.

De acordo com o conselheiro Ivens Zschoerper Linhares, no Despacho 737/22, de 20 de julho, ele decidiu receber para processamento na denúncia os seguintes apontamentos de irregularidade: contratação de escritório de advocacia sem licitação para prestação de serviços não especializados, em contrariedade à Lei Federal nº 8.666/93; contratação de escritório de advocacia para desempenho de atividades passíveis de serem executadas pelas procuradorias jurídicas municipais, em contrariedade ao Prejulgado nº 6 do TCE-PR; e contratação de escritório de advocacia com previsão de pagamentos antieconômicos e desnecessários, nos termos do artigo 89 da Lei Complementar Estadual nº 113/2005, de maneira indeterminada e sem limitador contratual, em contrariedade à Lei 8.666/93.

Além disso, vale destacar que a inexigibilidade de licitação se caracteriza pela impossibilidade de competição. A inviabilidade pode ser tanto pela exclusividade do objeto a ser contratado, como pela falta de empresas concorrentes. O mais comum é quando existe apenas um fornecedor para determinada demanda.

A contratação parece violar o conteúdo do Prejulgado nº 6 deste Tribunal, que estabelece que a contratação de consultoria jurídica deve estar voltada para questões que exijam notória especialização, com a demonstração da singularidade do objeto da matéria ou alta complexidade”, informou o conselheiro do TCE-PR.

O JB Litoral questionou a Prefeitura a respeito da situação. A assessoria de imprensa informou que o município ainda não recebeu a intimação oficial acerca dos termos da decisão proferida pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná e que aguardará sua respectiva ciência para posterior manifestação.

Também afirmou, entre outras coisas, que “sabe-se, por outro lado, que a denúncia foi perpetrada por advogado que se posiciona declaradamente como opositor da atual gestão municipal e, ainda, que possui ordem restritiva em relação ao prefeito, eis que o ameaçou de morte. Outrossim, a denúncia, em si, não é merecedora de qualquer atenção, especialmente porque ataca como irregular um procedimento administrativo de contratação de serviços que seguiu escrupulosamente os precisos termos da Lei Federal 8.666/93, portanto, ocorreu de modo absolutamente legal e por meio dos procedimentos administrativos corretos”.