Irregularidade faz legislativo revogar lei que altera estrutura administrativa da prefeitura


Por Cleverson Teixeira Publicado 26/01/2021 Atualizado 15/02/2024

A Câmara Municipal de Antonina revogou, em sessão extraordinária realizada na quinta-feira (21), a Lei N.º 48/2020, a qual alterava a estrutura administrativa do município. A legislação, sancionada no dia 18 de dezembro de 2020, pelo prefeito José Paulo Vieira Azim (PSD), o Zé Paulo, criou cinco novas secretarias. Com isso, de 14 pastas, o órgão municipal passou a contar com 18, na atual gestão.

Tinham sido implantadas as Secretarias de Governo e Planejamento, Segurança e Cidadania, Extraordinária de Assuntos Fundiários e Habitação, Cultura e Patrimônio Histórico, além da Secretaria de Esporte e Lazer. Os departamentos de Turismo e Cultura e de Educação e Esportes foram desmembrados com a mudança. Os gastos previstos, para o funcionamento do novo sistema de governo, presumiam uma despesa anual de R$ 1,7 milhão.

Antes da revogação ter sido aprovada na casa de leis, Zé Paulo já havia anulado, no dia 11 deste mês, os decretos dos novos cargos e de outras funções. A data de exoneração coincide com o dia em que foi apresentada uma denúncia ao Ministério Público do Paraná (MPPR), feita pelo advogado Lucas de Barros Peluso.

O principal motivo de recorrer ao MPPR seria a irregularidade cometida na criação de novos cargos durante a situação de calamidade pública, ocasionada pela pandemia da COVID-19. Dessa forma, para embasar o pedido de providência com relação ao ato praticado pela administração municipal, foi mencionada no requerimento a Lei Complementar N.º 173/2020, editada pelo Congresso Nacional, a qual se refere ao Programa Federativo de Enfrentamento ao Coronavírus. Nela é citada a proibição do aumento de despesas nesse período.

“Eu fiz o protocolo na câmara, assim como no Ministério Público. Depois disso, postei nas redes sociais. Eu creio que o prefeito já deve ter se adiantado em algum momento, antes de receber a recomendação do MP. Mas, de qualquer forma, eu creio que o Ministério Público adotou alguma ação, porque foi muito rápido”, disse Peluso.

Nova lei é revogada por unanimidade

Durante a sessão plenária, os 11 parlamentares votaram a favor da revogação. Na abertura da discussão, sete deles pediram a palavra. O primeiro a se manifestar foi o vereador Odinei Pinheiro (Cidadania). Breve em seu discurso, ele justificou o porquê de concordar com a extinção do projeto. “Ele foi criado em meio à pandemia, então eu não sou favorável”, afirmou.

Lei foi revogada por unanimidade no legislativo (Foto/ Ivan Ivanovick)

Já o parlamentar Alceu Salgado (DEM), antes de dar a sua opinião sobre a súmula discutida, leu um trecho da norma, a 173/20, que proíbe a criação de cargos nessa fase. Conforme ele, nenhum representante do legislativo se atentou aos fatos. “Passou batido pela casa de leis, mas foi aprovada. E o prefeito, verificando esse erro, pediu a revogação. Isso vai contra a opinião pública. As pessoas, via redes sociais, ficaram bravas com essa casa e com esse projeto. Mas todos têm que entender que isso é por força da lei”, relatou.

Assim como Salgado, o vereador Diogo Machado (PSC), o mais votado nas eleições 2020, disse concordar com a legislação, salientando o entendimento da anulação da validade do projeto. “Não é uma questão pessoal, mas uma questão de inconformidade com a lei. Então, também sou favorável à revogação”, complementa.

Valmir Godoi (PSD), um dos que votaram a favor da alteração da estrutura administrativa do órgão municipal, em 2020, afirmou que foi uma falha não ter questionado a implantação desse novo plano. “Foi cometido um erro por nós, por não termos indagado a lei como deveria ser indagada. Mas ainda bem que isso, agora, está sendo corrigido”, disse o vereador reeleito.

Vereador diz que erro serve como lição

O novato Gladison Carlos dos Santos (DEM), conhecido como Guanandi, o 9º mais votado, aproveitou o momento reservado ao discurso e ressaltou a importância de analisar tudo o que passa pela câmara. “Isso, para nós, principalmente para mim, que sou de primeira viagem, fica como um ensinamento e um alerta. Porque as coisas que aqui adentram devem ser, antes de tudo, muito bem discutidas, para que não surja nenhuma dúvida. Nós precisamos ouvir o povo, também. Para que, amanhã ou depois, não sejamos mal compreendidos”, reforçou.

Na sequência, foi a vez do 1º secretário da mesa diretora, o vereador Wilson Clio de Almeida (PL), pedir a palavra. Ele disse que a lei pode ser analisada em um outro momento. “Não se nega a necessidade de separar algumas secretarias e da criação de novos cargos. Outros prefeitos tentaram e não conseguiram. Mas o momento é inadequado. A vacina está aí. Logo, a nossa vida, a cidade e o país vão voltar ao normal e essa lei pode ser revista”, relatou Clio, o qual já foi vice-prefeito de Antonina na gestão 2013/2016.

E, por fim, o último a se manifestar foi o vereador Hélio de Freitas Castro (PSL). De acordo com ele, as secretarias criadas tinham relevância para a sociedade. “Eram cargos muito importantes, como o da Secretaria de Segurança e outros da vigilância em saúde. Em tempo, ele percebeu que não era o momento”, concluiu.

Os vereadores José Alves de Souza (PSD), Elizandre Rodrigues Machado (PSD), Tharson Assanuma (PSL) e o presidente da casa, Paulo Roberto Broska (PSC), não falaram sobre o assunto.

11 secretários estão oficialmente nomeados

Depois da revogação dos decretos de nomeações para os cargos criados a partir da lei 48/20, as secretarias da prefeitura estão ocupadas pelos seguintes nomes: Leonardo dos Santos (Meio Ambiente); Eliseu Marchiori Trancoso (Assistência Social); Marcio Hais de Natal Balera (Relações Institucionais); Jorge Alberto Sonda (Comunicação Social); Thiago Afonso de Souza (Turismo e Cultura); Marivane Pereira Martins (Educação e Esportes); Luiz Antonio Carvalho (Obras e Planejamento); Yuri Yoriai Osaki (Agricultura e Pesca); Odileno Garcia Toledo (Saúde); Rafael Neves Alves (Finanças); Thiago Fernandes de Souza (procurador Jurídico). As Secretarias de Administração, de Gabinete e de Indústria e Comércio ainda não constam na lista de nomeações do Diário Oficial do Município.

O que dizem especialistas da área jurídica

Para entender sobre as penalidades que podem ser aplicadas diante da aprovação da lei e nomeações, mesmo que revogadas, o JB Litoral conversou com duas profissionais da área jurídica. De acordo com a especialista em Direito e Processo Eleitoral, Emma Roberta Palú Bueno, por mais que a Lei 173/2020 tenha um entendimento vago e conflitante, de alguma forma, o prefeito poderá prestar contas com a justiça por ter sancionado o projeto. “Ele pode responder, porque a lei é explícita a proibir aumento de despesa, embora ainda não tenha posicionamento jurisprudencial”, afirma Bueno, que também é diretora Jurídica do Instituto Política por/de/para Mulheres.

A professora, advogada e mestre em Direito, Tailane Costa, também acredita que alguma pena pode ser atribuída ao gestor municipal, mas deixa claro que a legislação não transparece, detalhadamente, o resultado para esse tipo de prática. “A Lei 173 ainda traz muitas incógnitas. Ela estabelece as penalidades da Lei de Responsabilidade Fiscal. Mas ainda não tem exatamente qual que é o efeito. Ele pode responder, sim, de repente por aplicação de multa, num primeiro momento, e por improbidade, pelo simples ato de ter promulgado a lei. Tem alguns entendimentos nesse sentido. Mas ainda é uma zona muito cinzenta”, pontua.

A advogada reforçou que a criação da legislação municipal pode influenciar na questão do controle de despesas da gestão atual. “Não sabemos, exatamente, como vai ser na prática, porque é uma lei que não detalha as sanções. Pode interferir na lei de responsabilidade fiscal. Tem todo um conjunto que ainda é muito sombrio. Houve, agora, o primeiro parecer do Tribunal de Contas do Paraná (TCEPR) falando que aquele limite de gastos é o limite nominal, então não está ligada à porcentagem do limite prudencial de contratação”.

Prefeitura e MPPR não se manifestam

O JB Litoral entrou em contato a Secretaria de Comunicação do Município, para saber o porquê da criação da lei 48/20 diante da situação crítica em que se encontra a saúde pública. Questionou, também, se o órgão municipal recebeu alguma notificação do Ministério Público. Nenhuma resposta foi dada até a conclusão da reportagem.

O departamento de jornalismo pediu informações ao MP a respeito dos procedimentos que tomaria após denúncia encaminhada a 1ª Promotoria de Justiça da Comarca de Antonina, mas, até o fechamento desta edição, não obteve retorno.