Licitação para novo transporte da Ilha do Mel gera mal estar entre moradores


Por Publicado 20/09/2021 às 19h46 Atualizado 16/02/2024 às 13h52

Os moradores e comerciantes da Ilha do Mel realizaram nesta segunda-feira (20) pela manhã uma reunião na Associação de Barqueiros do Litoral Norte do Paraná (Abaline), em Pontal do Paraná, para discutir a licitação para contratação de uma empresa que vai explorar o transporte aquaviário de moradores e turistas do balneário de Pontal do Sul até Ilha do Mel, em Paranaguá.

O processo licitatório foi lançado no início do mês e o vencedor assumirá o transporte que, hoje, é feito pela Abaline. A iniciativa é resultado de um convênio firmado entre o Governo do Paraná, por meio do Instituto de Água e Terra (IAT) e as prefeituras de Paranaguá e Pontal do Paraná.

Como não houve consulta prévia, segundo representantes ouvidos pela reportagem, trabalhadores que, de alguma forma, se relacionam com a travessia se reuniram na tentativa de dar mais visibilidade a suas reclamações e inseguranças. A reunião ocorreu devido a insatisfação dos moradores da região, que cobram a forma que esta situação vêm sendo conduzidas, segundo os moradores, principalmente por não haver diálogo diretamente com os nativos.

Para o presidente da Associação dos Nativos da Ilha do Mel, Agnaldo da Silva dos Santos, a reunião foi uma tentativa de aproximar os cidadãos do poder público e levar aos gestores as demandas regionais. “A gente se reuniu para tentar conversar com o prefeito de Pontal do Paraná sobre essa licitação que está sendo feita. Os moradores do território nativo e as famílias tradicionais não foram consultados. Temos tem um protocolo de consulta que em qualquer situação que vá afetar nossa comunidade a gente se reúne e tenta entender o que está acontecendo“, explica o pescador.

Agnaldo é uma das principais lideranças dos nativos da Ilha do Mel. Foto: Diogo Monteiro/ JB Litoral.

Agnaldo também ressalta ser de extrema importância o diálogo com o moradores porque são eles que irão sentir os reflexos, principalmente, no bolso com essas mudanças. “Estamos aqui para saber se essa licitação realmente vai afetar nossa comunidade. Queremos um parecer dessa data e não concordamos com a maneira que está sendo feita. Não fomos consultados e vai ser prejudicial para todos e inclusive ao comércio. Não queremos que entre uma empresa de fora para concorrer conosco. Fomos os pioneiros e temos gente capacitada para isso. Temos ainda embarcações boas e o transporte é totalmente seguro. Só queremos melhorias e negociar nossa continuidade nesse terminal de embarque de Pontal do Paraná“, diz.

O presidente da Associação de Nativos também ressalta que hoje muitas famílias ganham seu sustento com esse transporte. “No momento a gente tem de 45 a 50 barcos da Abaline, fora as lanchas dentro dos tanques náuticos. São todos nativos que prestam esses serviços com toda a segurança e rapidez possível. Estamos preocupados com essa situação, porque o governo está tentando entrar na Ilha de uma maneira que acaba não consultando a comunidade e o protocolo de consulta que constituímos para defender nossos direitos“, conclui.

Moradores acreditam que seja só o começo

Rafael Santos vive desse transporte e acredita que será muito afetado com a mudança. Foto: Diogo Monteiro/JB Litoral

Um dos nativos que trabalha na travessia, Rafael Santos dos Matos, vê o impacto como uma surpresa ruim e afirma que se as mudanças de fato ocorrer, será prejudicial para quem necessita desse transporte para ter renda. “A gente começou a perder o meio de campo. Eles deviam ter mais respeito com nós, os nativos. Desde a fundação da travessia fomos nós que administramos junto com a prefeitura e os convênios. Mas agora simplesmente o Estado decidiu que não somos nós que vendemos a própria passagem. Eu acho que está errado. Porque nós não podemos vender a nova passagem?“, questiona Rafael que também acredita que, se hoje os nativos perdem a bilheteria, quem garante que em um futuro próximo não vão perder a travessia.

Para o responsável por uma das travessias, a comunidade está por dentro de tudo e sabe quem controla e quem entra e sai da região, por isso, esta decisão da prefeitura acaba sendo maléfica. “A prefeitura jogou uma dívida que não existe e está em juízo agora para não sair as negativas e a gente não conseguir renovar as nossas documentações. Não nos foi informado sobre essa licitação. Ela saiu no começo do mês, pré-feriado. Agora que estamos retomando o trabalho pós pandemia e de cara sai essa licitação“, lamenta Rafael.

Críticas são feitas por diversos profissionais

Alejandro é comerciante há 25 anos na região. Foto: Diogo Monteiro/JB Litoral.

Alejandro Jesus Alfredo, o comerciante mais antigo da região, diz que os colegas estão se sentindo desrespeitados e desprestigiados pela prefeitura. “Nós estamos aqui e criamos isso durante quase 25 anos. Sempre lutamos aqui nos bons e maus momentos. E agora chega um prefeitinho e me coloca uma licitação sem nos consultar, sem dar a oportunidade de ouvir as pessoas que realmente vivem disso. Eles querem trazer um capital de fora e eles se livram do problema“, critica.

Ele também ressalta a questão social da travessia. “São 1.500 pessoas que vivem em função desse terminal. Tem os moradores da ilha, o pessoal dos barcos, do transporte, do comércio, os carrinheiros, enfim. São muitas famílias que vivem em função disso e até agora não chamaram para uma reunião para entendermos como vão fazer e o que pretendem“, diz Alejandro garantindo que se o local fosse entregue totalmente aos moradores, seria um ambiente muito melhor e mais desenvolvido.

A licitação

O processo licitatório 145/2021, Pregão Presencial 80/2021, divulgado pela prefeitura é um pedido da Secretaria Municipal de Educação, como consta no próprio documento, e busca contemplar a empresa que define a menor taxa de administração. A cotação dos valores teve por base a Associação dos Barqueiros das Baias do Litoral Norte do Estado do Paraná Associação dos Barqueiros das Baias do Litoral Norte do Estado do Paraná (Abaline) e tem valor máximo de R$ 4.161.290,00. O documento de 34 páginas ressalta que a data para o Pregão Presencial será nesta terça-feira (21) às 09h. Segundo o texto, o principal objetivo é colocar uma empresa para assumir o trabalho local. “Administração e exploração do terminal aquaviário de embarque e desembarque de passageiros localizado no balneário de Pontal do Sul, no município de Pontal do Paraná, e dos terminais de Nova Brasília e Encantadas na Ilha do Mel no município de Paranaguá, nos termos do convênio 01/2021, firmado entre o estado do Paraná e o município de Pontal do Paraná, com interveniência do instituto água e terra (IAT) e do município de Paranaguá, mediante a implantação de sistema de venda, gestão e controle de tickets para as empresas autorizadas pelo estado a operar o transporte aquaviário de passageiros, incluindo a prestação de serviço de manutenção, segurança, vigilância 24 horas, limpeza e fiscalização dos acessos no cais”, diz o documento que também foca nas regras para o processo licitatório, citando quem pode participar e quais as normas da disputa.

Deflagrada em abril

O JB Litoral e a Agência de Notícias do Paraná (AEN) noticiaram, em abril deste ano, esta situação que foi debatida na reunião, com a assinatura do convênio 01/2021, para a oferta de serviço no transporte aquaviário aos usuários e turistas que visitam a Ilha do Mel com o objetivo de melhorar o atendimento à população.

Na época, assinaram o convênio o prefeito de Pontal do Paraná, Rudisney Gimenes Filho (Rudão); o prefeito de Paranaguá, Marcelo Roque; o diretor de Políticas Ambientais da Secretaria do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo e diretor de Patrimônio Natural do IAT, Rafael Andreguetto; o responsável por projetos ligados ao Litoral do Paraná na Casa Civil, Renato Adur; e demais lideranças do setor. Leia Clique aqui.

A reportagem está apurando as condições e situações deste convênio entre as duas cidades, o governo estadual e IAT e trará novas informações na edição impressa do próximo final de semana.

Paranaguá e Pontal assinam convênio para administrar os terminais de embarque para a Ilha do Mel