MPPR e MPF recomendam fiscalização com base na Lei da Mata Atlântica, ao invés do Código Florestal


Por Luiza Rampelotti Publicado 04/05/2020 às 21h42 Atualizado 15/02/2024 às 09h48

O Ministério Público do Paraná (MPPR), em conjunto com o Ministério Público Federal (MPF), emitiu, no último dia 15, a Recomendação Administrativa Conjunta nº 01/2020, que busca garantir que a Superintendência do IBAMA no Estado e o Instituto Água e Terra do Paraná (IAT) não cumpram o Despacho 4.410/2020, do Governo Federal, datado de 06 de abril, assinado pelo Ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, que impõe a prevalência da norma geral do Código Florestal (Lei Federal 12.651/2012) em face da Lei da Mata Atlântica (Lei Federal 11.428/2006). Ou seja, o Governo Federal passa a permitir a consolidação de ocupação de Áreas de Preservação Permanente (APP) e de Reserva Legal desmatadas ilegalmente até 22 de julho de 2008, o que não é permitido pela Lei da Mata Atlântica, que proíbe a consolidação de supressão clandestina e não autorizada de vegetação nativa ou o perdão pela prática ilícita.

A recomendação também visa que ambos os órgãos (Ibama e IAT) não cancelem os autos de infração ambiental, termos de embargos e interdição e termos de apreensão lavrados com base na constatação APPs com atividades agrossilvipastoris, de ecoturismo e de turismo rural, ou de ocupação de áreas de Reserva Legal com uso alternativo do solo, proveniente de desmatamento ou intervenção não autorizada a partir de setembro de 1990 a julho de 2008.

Lei da Mata Atlântica prevalece sobre o Código Florestal

Na prática, o MPPR e o MPF orientam que o Ibama e o IAT mantenham em suas atividades fiscalizatórias a aplicação da Lei da Mata Atlântica para a proteção do bioma Mata Atlântica no Paraná, apesar de ela ser anterior ao Código Florestal. Isto porque, segundo a Recomendação, a lei geral, ainda que posteriormente editada, não prevalece sobre a lei especial se esta não foi expressamente revogada. “Considerando a submissão histórica da Mata Atlântica no Brasil a um processo desenfreado de supressão e degradação, se previu, desde o ano de 1990, legislação especial com previsão de regime de sua utilização e preservação de modo diferenciado em relação aos demais biomas brasileiros. Por isso, a Lei Federal 11.428/2006 é considerada especial e impõe a sua prevalência sobre a Lei 12.651/2012 nas questões de conflito”, informa o documento.

No entanto, a partir do Despacho de Ricardo Salles, podem ser anulados atos de infração ambiental, termos de embargos e interdição e termos de apreensão emitidos em face de ocupações indevidas de APPs. “Na avaliação do MPPR e do MPF este entendimento é equivocado e resultado de forte pressão do setor econômico vinculado ao agronegócio”, diz o Ministério Público.

Desmatamento e coronavírus

Além disso, uma das justificativas para a emissão da Recomendação Administrativa afirma que é importante lembrar, especialmente em tempos da pandemia do novo coronavírus (Covid-19), que há diversos estudos científicos que apontam a relação entre o desmatamento e diminuição da biodiversidade nos ecossistemas com o aparecimento e ampliação das doenças emergentes e reemergentes.

De acordo com o Ministério Público, cerca de 150 milhões de pessoas vivem hoje na abrangência da Mata Atlântica e dependem, direta ou indiretamente, das diversas funções ambientais do bioma. “Nesse sentido, a preservação e recuperação dos remanescentes dessa vegetação são essenciais para a sustentabilidade econômica do país”, além da melhora nas condições de saúde da população.

Entenda o Despacho do Governo Federal

Por meio do Despacho 4.410/2020, o governo Bolsonaro recomendou aos órgãos ambientais que desconsiderem a Lei da Mata Atlântica e apliquem regras mais brandas constantes no Código Florestal para áreas ditas consolidadas nas regiões de domínio da Mata Atlântica. Essas áreas são aquelas com atividades econômicas que exploravam terras antes de 2008. Com o Despacho, não será mais necessário recuperar áreas consideradas irregulares e ilegais pela Lei da Mata Atlântica.

O Ministério do Meio Ambiente, por meio do Despacho, acatou o parecer nº 115/2019, da Advocacia Geral da União, elaborado a pedido da Federação da Agricultura do Estado do Paraná (FAEP) e da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), que decidiu que o Código Florestal e suas disposições se aplicam ao bioma Mata Atlântica. Com este parecer, proprietários rurais também poderão solicitar o cancelamento de multas.