Mulher transexual é proibida de usar banheiro feminino em casa de shows, em Paranaguá


Por Gabriel Santos Publicado 20/06/2022 às 14h53 Atualizado 17/02/2024 às 10h55

Uma mulher transexual, de 20 anos, relatou ter sofrido um episódio de transfobia no Clube Ouro Fino Pub Bar, localizado na Vila dos Comerciários, em Paranaguá. A moradora do bairro Jardim Iguaçu, que preferiu não ser identificada por medo de retaliações, contou ao JB Litoral o que aconteceu na madrugada de quinta-feira (16).

De acordo com a jovem, ela estava no banheiro feminino quando uma funcionária tentou retirá-la do local à força, dizendo que teria que usar o banheiro masculino. No momento da abordagem, a mulher se recusou a sair, por entender que tinha o direito de usar o sanitário para mulheres.

Segundo ela, que estava acompanhada por suas amigas, também transexuais, a situação foi muito constrangedora. “Minhas amigas não passaram por isso, mas é importante lembrar que mulheres trans também são mulheres e isso não tem nada a ver com o meu órgão genital, porque a mudança vem de dentro. Não importa o que vista, se é roupa verde, amarela, branca e preta, eu vou continuar sendo uma mulher”, comenta.

Conhecida na cidade, a jovem contou que nunca havia sofrido nenhuma ação preconceituosa desde que iniciou o processo de transformação. Mas agora, depois de passar por esse episódio, ela fez um Boletim de Ocorrência e pretende entrar com um processo judicial contra o local.

A reportagem procurou o estabelecimento para questionar sobre o ocorrido dentro da casa de show. Em resposta, a direção do espaço repudiou o ato e disse já ter entrado em contato com os envolvidos, além de informar que estão dispostos a prestar qualquer esclarecimento.

O que diz a lei?

No país, é muito comum encontrar casos de pessoas transexuais, ou seja, que se identificam com o gênero contrário ao de nascimento, que foram barradas de usar o banheiro da sua preferência em locais públicos e privados. Por mais que não exista uma legislação própria a respeito dos direitos da população transgênero, a comunidade está amparada pela Constituição Federal, que institui o direito à liberdade e a obrigação de serem tratadas de forma digna.

De acordo com o Ministério Público Federal (MPF), com objetivo de proteger os direitos à identidade, à igualdade, à não-discriminação e o princípio da dignidade da pessoa humana, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, em 2015, defendeu que transgêneros não podem ser proibidos de usar banheiros públicos do gênero com o qual se identificam. Em parecer enviado ao Supremo Tribunal Federal (STF), Janot sustentou que “impedir que alguém que se sente mulher e se identifica como tal de usar o banheiro feminino é, sem dúvida, uma violência”.

Segundo ele, no julgamento do recurso extraordinário (RE) 845.779/SC, impedir o uso do banheiro feminino seria o mesmo que negar, individual e socialmente, a identidade feminina da trans, violando-se, assim, o seu direito a uma vida digna. Além disso, Janot complementou afirmando que não é possível que uma pessoa seja tratada socialmente como se pertencesse a sexo diverso do qual se identifica e se apresenta publicamente, pois a identidade sexual encontra proteção nos direitos da personalidade e da dignidade da pessoa humana previstos na Constituição Federal.

Nota do Clube Ouro Fino

Em nota enviada ao JB Litoral, o Clube Ouro Fino afirma que repudia qualquer ato discriminatório. “Ressaltamos que a política do nosso estabelecimento é não tolerar qualquer preconceito, seja ele de raça, gênero ou orientação sexual. Prova é que a diversidade sempre foi a principal característica dos nossos clientes e tudo fazemos para melhor servir o público que nos honra com sua preferência. Sobre o fato que nos veio à tona, desconhecemos que qualquer ato discriminatório tenha sido feito por parte dos nossos colaboradores. Lamentamos o ocorrido e estamos à disposição para demais esclarecimentos”, conclui.