Salários congelados há 5 anos: estivadores de Paranaguá pressionam TCP por reposição salarial e ameaçam greve

Os estivadores enfrentam perdas salariais de 33,5% desde a última reposição inflacionária em 2019, enquanto a empresa acumula lucros e deve R$ 50 milhões em impostos ao município.


Por Luiza Rampelotti Publicado 01/06/2024 às 16h26
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Categoria acumula cerca de 33,5% em perdas salariais devido à falta de reposição inflacionária pela empresa TCP. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Na última segunda-feira (27), o Sindicato dos Estivadores de Paranaguá e Pontal do Paraná (Sindestiva) aprovou, durante Assembleia, um indicativo da greve devido à falta de avanço das negociações para um Acordo Coletivo de Trabalho (ACT) com o Terminal de Contêineres de Paranaguá (TCP). A última reposição inflacionária dos cerca de mil estivadores aconteceu em 2019; de lá para cá, eles acumulam cerca de 33,5% em perdas salariais.

Ao JB Litoral, o presidente do sindicato, João Fernando da Luz, o Nando, explicou que a empresa TCP não está facilitando a renovação do acordo, o que tem trazido preocupação para a classe. “A nossa grande preocupação não é somente a questão financeira, mas também a questão da legalidade da nossa profissão no terminal”, diz.

De acordo com ele, devido à falta de renovação do ACT, o sindicato deixou de arrecadar R$ 14 milhões nos últimos cinco anos, o comércio de Paranaguá está deixando de receber uma média de R$ 500 mil ao mês, e os estivadores estão trabalhando 12 meses e recebendo, efetivamente, apenas 10. “Pela estimativa da Bolsa de Valores, no ano passado, o TCP arrecadou R$ 2 bilhões, dos quais R$ 800 milhões foram arrecadados exclusivamente na faixa portuária, isto é, por meio dos estivadores. Chega a ser ridículo a empresa deixar de repassar os R$ 14 milhões que são dos estivadores por direito. É inaceitável essa situação, estamos no limite, buscando apenas a reposição salarial”, afirma Nando.

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Em 2023, TCP arrecadou R$ 2 bilhões, dos quais R$ 800 milhões foram arrecadados exclusivamente na faixa portuária, isto é, por meio dos estivadores. Foto: Claudio Neves/Portos do Paraná. Foto: Rodrigo Leal Felix/SEIL


Desrespeito ao trabalhador e R$ 50 milhões em dívidas com o Município


O prefeito Marcelo Roque (PSD) se uniu à luta dos estivadores e divulgou, em suas redes sociais, um vídeo criticando a empresa. “A nova direção do TCP não fala com os trabalhadores, além disso, deve impostos ao Município. O reajuste inflacionário dos estivadores é direito adquirido. A empresa tem que atender a Estiva, tem que atender às demandas do Poder Municipal, os impostos têm que entrar na Prefeitura para podermos investir em saúde, segurança, educação. O TCP não pode fazer isso com a cidade”, disse. 

Ao JB Litoral, a Prefeitura de Paranaguá informou que o Terminal de Contêineres deve cerca de R$ 50 milhões ao Município. A dívida é composta pela falta de pagamentos do Imposto Predial, Territorial e Urbano (IPTU) e de Taxas de Alvará.

Procurado, o Terminal de Contêineres de Paranaguá, administrado pelo grupo chinês China Merchants Port Holding Company (CMPort) desde março de 2018, afirma, por meio de sua assessoria de imprensa, que “há uma discussão judicial de âmbito nacional sobre a legalidade da cobrança de IPTU sobre áreas concedidas pelo Poder Público por contratos de arrendamento. Desta forma, a empresa segue exercendo seu direito de questionar a cobrança dentro da legalidade, e reforça seu compromisso com a arrecadação do município, sendo hoje a maior arrecadadora de impostos de Paranaguá, representando 20% do ISS arrecadado pela cidade”.


Justificativa do TCP é uma “grande farsa”, diz presidente do Sindestiva


Além disso, sobre a falta de renovação do Acordo Coletivo de Trabalho com os estivadores, a empresa afirma que “a conclusão da negociação do acordo com os trabalhadores avulsos da estiva está se prolongando por um tempo superior ao desejado, o que também se deve em razão dos momentos de instabilidade do Sindestiva e das diversas alterações na sua direção sindical”.

No entanto, de acordo com o presidente Nando, a suposta “instabilidade” do sindicato, mencionada pela empresa, se trata apenas de uma “desculpa”. “Tivemos problemas internos no Sindestiva, mas isso é mais uma desculpa dada pela empresa, pois apesar dos momentos de dificuldades, que já foram superados, negociamos com a Fospar, que nos repassou a reposição inflacionária e, inclusive, um ganho real de 3% a mais nos salários. Afinal, a Assembleia é soberana independentemente de quem esteja na direção do sindicato”, explica.

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O presidente da Estiva, Nando, explicou que a empresa não está facilitando a renovação do ACT, o que tem trazido preocupação para a classe. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Segundo ele, a justificativa do TCP é “uma grande farsa” e, em seu ponto de vista, a empresa está aguardando o desenrolar de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) que tramita na Câmara dos Deputados e pede a quebra de exclusividade dos trabalhadores portuários avulsos (TPA). “Entendemos que a grande instabilidade mesmo hoje está em Brasília, com a tentativa patronal de acabar com nosso direito à exclusividade, e entendemos que o TCP está querendo se aproveitar disso, ganhar tempo até a tramitação da ADI. Mas isso não acontecerá, e se eles não resolverem isso em 30 dias, até o dia 27 de junho, vamos entrar em greve”, destaca.


Impacto direto na economia local


O secretário municipal de Trabalho, Emprego e Assuntos Sindicais, Everson Fernando Leite de Farias, que também é estivador e já fez parte da direção do sindicato no passado, afirma que o impasse entre estivadores e TCP reflete diretamente na economia de Paranaguá, uma vez que os trabalhadores estão perdendo seu poder de aquisição e o comércio também está deixando de arrecadar. “Todo trabalhador da faixa portuária, em todos os segmentos, gasta seu salário em nossa cidade. Isso é fato, já está comprovado. Se o trabalhador está sendo bem remunerado, a cidade vai bem. Então, nossa grande preocupação é com a precarização da mão de obra. Não adianta o terminal empregar mil trabalhadores, mas com salários que não são dignos, que não garantem o autossustento do trabalhador”, avalia.

Segundo Everson, desde que a atual gestão assumiu o TCP, a empresa não tem dado a atenção aos trabalhadores e nem ao Poder Municipal. “Eles usufruem da cidade, de tudo que temos aqui, e não estão dando retorno nenhum. Vemos que está existindo má fé em não negociar com o trabalhador, e não entendemos que tempo é esse que eles querem ganhar. O TCP não tem tido respeito com os trabalhadores e nem com o Município, pois não paga seus impostos”, ressalta.


Categoria está revoltada


Quem também está preocupado são os estivadores, que veem seu poder de compra diminuir mês após mês. A reposição inflacionária, que recupera o poder aquisitivo perdido devido ao aumento do custo de vida e mantém o valor real dos salários, não ocorre há cinco anos. O estivador João Lozano, que foi presidente do Sindestiva de 2015 a 2020, comenta que toda a categoria está exigindo a greve caso as negociações não sejam concluídas.

Participei da Assembleia no último dia 27 e está bem difícil de controlar a categoria, pois todos estamos revoltados. Sou associado, já fui presidente e sei tudo o que a nova diretoria está sofrendo. A inteligência e transparência com que a direção do sindicato está administrando, é muito importante para nós e faz com que toda a classe esteja junto, lutando pelo mesmo objetivo”, diz.

O secretário do Sindestiva, Nesias Paulino de França, também falou ao JB Litoral. Ele afirmou que, se não houver uma definição em breve nas negociações, o sindicato buscará meios legais para garantir o direito à reposição inflacionária.

Podemos pedir a intermediação do Ministério Público nessa situação, pois o que vemos é um descaso com o sindicato e com o trabalhador. Pedimos apenas a reposição inflacionária, que é lei, é direito”, conclui.

Uma nova reunião entre o Sindestiva e o TCP está agendada para esta segunda-feira (3), onde será discutida a possibilidade de um acordo para evitar a greve.

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