Prefeitura mentiu e ainda não fez a prestação de contas do FUNDEB de 2014


Por Redação JB Litoral Publicado 22/05/2015 às 20h54 Atualizado 14/02/2024 às 07h52

Na primeira edição deste mês, em razão do prazo final para prestação das contas do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb) ocorrido dia 30 de abril, questionada pelo JB, a Secretaria Municipal de Educação em Tempo Integral (Semedi), disse ter feito a prestação de contas dos recursos do FUNDEB de 2014 ao Conselho de Acompanhamento de Controle Social do FUNDEB, através de 12 expedientes oficializados em 2014 e mais dois ofícios deste ano enviados em janeiro e fevereiro.

Após a reportagem, uma fonte que preferiu não se identificar temendo represálias, garantiu a reportagem que a prefeitura havia mentido ao jornal e ressaltou que a prestação de contas não fora feita. Mais que isso, ela orientou que o jornal fizesse contato com a presidente do Conselho do FUNDEB, Rosane de Oliveira da Cruz, que é a responsável para avaliar e assinar a prestação de contas da prefeitura, juntamente com os conselheiros.

Procurada pelo JB, a presidente confirmou que ainda não foi feita a prestação de contas e que, a de 2013, havia sido entregue no dia 10 de março deste ano, aprovada com ressalvas pelo Conselho.

Com bastante conhecimento, fruto de sua busca por capacitação e meios de exercer com competência e dignidade a função de presidente do Conselho de Acompanhamento de Controle Social do FUNDEB, Rosane da Cruz por mais de uma hora narrou uma saga de dificuldades, irregularidades e assédio que tem vivido desde maio de 2013, quando assumiu o cargo, que é voluntário.

Nesta reportagem exclusiva, com muita coragem e profundo conhecimento do assunto, Rosane explica que seu mandato se encerra no próximo dia 25 e que não pretende buscar a reeleição.

De acordo com a presidente, a situação de descaso da prefeitura em relação ao Conselho foi tanta que ela se viu obrigada a denunciar a falta de cumprimento das ações necessárias ao funcionamento do Conselho para o Ministério Público do Paraná (MPPR) logo que foi eleita presidente em 2013. Veja a situação enfrentada pela presidente:

 

Secretária Executiva ainda não foi nomeada

Antes de informar as irregularidades que vem acompanhando junto aos gastos dos recursos federais repassados pelo Fundeb ao município, Rosane da Cruz explicou as atribuições do Conselho.

Segundo a presidente, sua função é fazer as reuniões mensais, exigidas pela Lei do Fundeb 11494/2007, onde é necessário, ao menos, uma por mês. Cabe ao Conselho fiscalizar e cobrar dos gestores uma forma correta de gastos dos recursos de acordo com o que determina a Lei de Diretrizes Básicas (LDB), 9394/96. O artigo 70 e 71 desta legislação explica o que pode ser gasto e o que não pode pelos gestores e o Conselho acompanha para ver se a lei e o dinheiro estão sendo trabalhados conforme o que determina seus artigos. Apesar de a presidência ficar nas mãos de um cidadão, os representantes do prefeito municipal são maioria no Conselho: são dois da Secretaria de Educação, dois diretores, dois professores municipais e dois representantes dos pais de alunos.

A presidente explica que os recursos do Fundeb são formados pelo depósito de 25% dos impostos do município, estado e união e o Conselho existe justamente para que esse dinheiro seja gasto de uma forma correta com a educação. Rosane disse ainda que, antes de sua gestão, o Conselho não era atuante e a própria Secretaria de Educação fazia as reuniões com ou sem os conselheiros e eles apareciam apenas para assinar a documentação, segundo relatos de próprios conselheiros da época.

O Conselho passou a ser ativo em 2013. Entretanto, depois de assumir no dia 25 de maio até o dia 4 de outubro, o Conselho não tinha sequer uma sala, computador, telefone e arquivo, a estrutura necessária que a lei do Fundeb exige, além de uma pessoa nomeada pela prefeitura para ser o Secretário Executivo do Conselho. Foi necessário que a Controladoria Geral da União, do Tribunal de Contas do Paraná e do Ministério da Cultura e Educação (MEC) entrasse na justiça contra o município dando ao prefeito 30 dias para que providenciasse a sala, os funcionários e todos os equipamentos necessários. Isto porque ela fez uma denúncia a todos eles e também ao MPPR local e o de Curitiba. A sala foi entregue no dia 4 de novembro e a funcionária passou a trabalhar no Conselho no dia 6 de janeiro de 2014. Mesmo assim, próxima de encerrar seu mandato, a prefeitura ainda não nomeou a Secretária Executiva do Conselho, a professora Luciane Nunes, que mesmo assim continua trabalhando sem o cargo, que é obrigatório.

 

As irregularidades e as prestações de contas

Apesar de ficar quase um ano sem estrutura, Rosane disse que jamais deixou de cumprir com suas obrigações e fez da sua casa a sala do Conselho do Fundeb, onde expedia ofícios, saia para fazer fiscalização pagando o ônibus do seu bolso, inclusive os custos de documentação. A lei lhe garante esta autonomia, porque o cargo da presidente é majoritário, por isso é ela quem determina os caminhos e o rumo que o Conselho vai tomar. Mesmo com toda essa determinação, a presidente diz que jamais participou das reuniões do Plano Político Pedagógico (PPP), como exige a lei, porque a Secretaria de Educação jamais a chamou.

A presidente informou que as dificuldades impostas pela administração fizeram com que no ano passado ela fiscalizasse os gastos do Fundeb de 2013 e, diante de tantas irregularidades que encontrou, propôs em seu relatório um parecer pela não aprovação, mas por ser minoria no Conselho, a prestação de contas foi aprovada com votos dos representantes do prefeito com parecer de aprovação com ressalvas. Entre as irregularidades vividas já no exercício da função pela falta de estrutura e descumprimento do que determina a legislação, Rosane encontrou ainda servidores em desvio de função em número muito alto, servidores trabalhando em outras secretarias e recebendo pelo Fundeb, outras que não mais residem na cidade e continuavam recebendo na fonte do Fundeb. Teve ainda o fato que persiste até hoje da não nomeação da Secretária Executiva do Fundeb pela prefeitura A presidente explicou ainda que os pagamentos dos recursos do Fundeb são divididos em categoria de 60% e 40%.

Os de 60% paga salários para quem está efetivo na docência, ou seja, professores, diretores, coordenadores, pedagogos e orientadores. Os 40% são pagos aos demais, no caso, motorista, servente, auxiliar de limpeza, cozinheira, todos aqueles que são necessários para manter a educação. Entretanto, a presidente encontrou diversas pessoas da categoria de 40% recebendo na categoria de 60%, outra grave irregularidade. Outra irregularidade de 2013 enfrentada pelo Conselho foi o uso do estádio Gigante do Itiberê pelo Rio Branco SC, por ele ser da educação e sua manutenção ser paga com o dinheiro do Fundeb.“Só que a lei do Fundeb é bem clara, você só pode pagar se está em uso das crianças porque ele foi construído com o dinheiro do Fundeb. Era para termos lá uma escolinha de futebol, o desenvolvimento de alguns esportes olímpicos, algum de vara, de corrida, de alguma coisa e a gente não tinha nada disso, não tinha nada desenvolvido para as crianças e sim era usado por um clube”, disse Rosane.

Prestação de contas de 2014

Sobre a prestação de contas de 2014, que o Conselho ainda não teve tempo de analisar, pois entregou a de 2013 em março deste ano, no dia da entrevista, Rosane recebeu, depois de diversas cobranças, a lista atualizada dos servidores que recebem pelo Fundeb e com o pedido do parecer da prestação de contas de 2014. Organizada e meticulosa com documentos como tem sido durante todo este tempo, Rosane ainda terá de analisar a lista, a documentação e depois repassar a todos os conselheiros por endereço eletrônico para que possam também fazer suas análises. Diante de todo o trabalho para fechar as contas de 2013, pelo que já teve conhecimento do gasto dos recursos em 2014, a presidente acredita que seu parecer será, novamente, pela não aprovação porque pouca coisa foi mudada.

 

“Eu continuo com gente com desvios de função, continuo recebendo elevação vertical e horizontal que já entregamos e não foi feita nada, continuo ainda com gente trabalhando nas secretarias sendo professor e não é para estar e sim dentro da sala de aula, um descaso total. Tenho que fazer dizendo que eles gastaram todo o dinheiro dentro da lei e não foi. Tem como dizer que eles investiram na manutenção de uma escola comprando 500 televisores e não colocaram portas e nem janelas? Gente é dinheiro publico.

 

É para ser gasto não com caridade, mas com planejamento, pessoas competentes.“Não temos ainda na prefeitura gente competente e qualificada que faça o planejamento e escute o povo”, desabafou a presidente.

Rosane encerrou a entrevista preocupada com a decisão dos representantes e funcionários da gestão municipal que optaram, mesmo sem ela concordar, pela realização de uma reunião para análise urgente das notas e dos gastos do dinheiro do Fundeb em uma semana, mesmo depois de ter entregado a lista atualizada dos servidores da educação na semana passada.

“Não concordo e não vou fazer. Isso é para ser analisado mês a mês, e agora querem obrigar a análise sem tempo hábil. Deixo claro que, como presidente e representante dos pais das escolas municipais nunca fui convidada e nem os conselheiros, que não tem vínculo com o gestor, para participar do planejamento orçamentário. Essa parte da lei não foi respeitada, da mesma forma a transparência de verdade do dinheiro publico”, concluiu Rosane.