O Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR) e o Ministério Público do Paraná (MPPR) investigam supostas irregularidades na vacinação em Matinhos. Uma reportagem do JB Litoral apontou que o Relatório Orçamentário do 1º Quadrimestre de 2021 indicava problemas, resultando na divulgação de uma diferença de 16% nas doses de vacina contra a Covid-19 obtidas pelo município.
Após pedir esclarecimentos à prefeitura, o TCE-PR informou à reportagem que passou a apurar outras duas suspeitas: a vacinação de menores de idade e o descarte de imunizantes por um possível “apagão” de refrigeradores. As duas investigações surgiram a partir de áudios de moradores relatando problemas. No caso dos menores de idade, a vacinação teria ocorrido em adolescentes com “comorbidade grave ou Síndrome de Down”. Também há o relato de uma médica afirmando que doses foram perdidas. “Acabou a luz e ele perdeu o lote todo de vacina”, relata a profissional da saúde, que optou por não se identificar.
Como os processos estão em análise, o Tribunal de Contas informou que novos detalhes serão divulgados em um “momento mais oportuno” para não atrapalhar o andamento das investigações. O MPPR, por meio da assessoria de imprensa, confirmou, por telefone, estar checando os eventuais irregularidades e também informou que, após explicação da prefeitura, arquivou o processo referente ao relatório orçamentário por considerar a resposta de Matinhos como “fidedignas e consistentes”.
“Equívoco”
Sobre a diferença no número de doses aplicadas, o TCE-PR destaca que a prefeitura enviou resposta, alegando que “houve equívoco no momento de inserção dos quantitativos de vacinas” no relatório quadrimestral. “O quantitativo excedente de 3.245 vacinas corresponde ao somatório das que foram recebidas no dia 01/05/2021, isto é, 30 primeiras doses da Vacina Coronavac e 1.290 primeiras doses da Vacina AstraZeneca, totalizando 1.320, acrescidas do somatório das recebidas em 06/05/2021, isto é, 70 segundas doses da Vacina Coronavac e 1.855 primeiras da Vacina AstraZeneca, totalizando 1.925”, informou a prefeitura.
O Tribunal segue analisando a vacinação na região. “O TCE-PR está acompanhando e fiscalizando, por meio de cruzamento de dados, o registro dos vacinados no Sistema de Informação do Programa Nacional de Imunização pelos municípios, bem como a efetividade da vacinação da população em relação ao quantitativo de doses recebidas”, informou em nota.
Sobre a questão do relatório orçamentário, o MP-PR informou que “A partir da veiculação, pela imprensa, de notícia relacionada ao possível desaparecimento de vacinas em Matinhos, a 2ª Promotoria de Justiça da Comarca instaurou procedimento administrativo para apuração dos fatos”.
As respostas da prefeitura foram “consideradas pela Promotoria de Justiça como fidedignas e consistentes, considerou-se que ficou demonstrado que não ocorreu o relatado sumiço”, diz o documento, que acrescenta que o procedimento foi arquivado. A nota destaca que outras providências podem ser tomadas com eventuais novas informações.
Município tem 3.407 doses em estoque e vacinou mais mulheres do que homens
Matinhos recebeu, até a última quinta-feira (8), 24.693 imunizantes, aplicou 21.286 e possui em estoque 3.407, número que representa 13,8% do total recebido. Os dados são do LocalizaSUS, plataforma do Ministério da Saúde que divulga como está a vacinação em cada município do país. Nos dados de vacinas não aplicadas, não fica claro quantas são guardadas para a segunda dose, quantas são da reserva técnica de 5% para eventuais problemas e quantas de fato estão disponíveis para aplicação.
Matinhos é hoje a segunda cidade do litoral com mais doses distribuídas e em estoque, perdendo apenas para Paranaguá. As que se encontram armazenadas de Matinhos estão em um patamar próximo da média dos sete municípios, que é de 12%.
Levantamentos feitos, durante semanas, revelam que o número acima da casa das milhares de vacinas estocadas é recorrente em Matinhos. No dia 17 de junho, 20.523 delas já haviam chegado e 13.333 era o número das aplicadas nos habitantes matinhenses, tendo uma diferença de 7.190 doses que deveriam estar reservadas. No dia 2 de julho, os números eram 21.203 doses recebidas e 18.733 aplicadas nos braços da população, resultando na diferença de 2.470 imunizantes que, em tese, estavam guardados.
Segundo o Portal da Transparência do governo estadual, o número em estoque, para segunda a dose, em Matinhos, é de 2.557, mas 460 delas foram aplicadas a mais do que o fornecido para a primeira etapa de imunização dos moradores, portanto, haveria 2.097 vacinas reservadas, exclusivas para as pessoas que já receberam a primeira etapa.
As inconsistências entre os dados federais e estaduais não são identificáveis. Apesar disso, a Secretaria Estadual de Saúde (SESA) informou, em junho, que “O Vacinômetro Estadual passa por uma migração de fonte de dados, com inclusão da fonte nacional. Considerando esse processo, o sistema pode apresentar instabilidade”, diz a nota que ainda afirma que as informações devem ser consultadas, por enquanto, apenas pelo sistema da união.
A Secretaria de Saúde do município, no dia 29 de junho, negou os problemas de vacinação em menores de 18 anos e a perda de imunizantes por apagão em refrigeradores, assim como informou que as vacinas em estoque são destinadas ao público que aguarda a segunda dose e também às grávidas.
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Mais de mil por dia
Desde o início da vacinação, em 19 de janeiro, o município passou, em três oportunidades, da marca de mil vacinas diárias, mas esses números são precedidos por dias de poucas aplicações e os subsequentes também não mantêm o ritmo. O pico de vacinação na cidade aconteceu em 15 de junho, uma terça-feira, quando 1.334 doses foram aplicadas, sendo que nos dois dias anteriores foram apenas 11 e 21 pessoas vacinadas, respectivamente.
Até o momento, Matinhos destinou 11.706 vacinas para mulheres e 9.580 para homens. A faixa etária que mais recebeu imunizantes foi a de 65 a 69 anos, com 2.983 aplicações. As informações utilizadas nesta reportagem foram obtidas por meio da plataforma de banco de dados públicos do Sistema Único de Saúde.
Por Brayan Valêncio