Com prazo perto do fim, prefeituras do litoral não enviaram propostas para cobrança de coleta e tratamento de lixo


Por Redação Publicado 06/07/2021 às 14h04 Atualizado 16/02/2024 às 06h59

O inverno mal começou, mas já é hora de pensar em um dos principais problemas de quando chega a alta temporada e, com ela, o calor e muitos turistas: a geração de lixo no litoral. Com os sistemas de coleta, tratamento e destinação dos resíduos sólidos completamente municipalizados, as sete cidades ficam colapsadas ao receberem os visitantes, que potencializam a geração de lixo.

A Lei Federal 12.305, que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos, entrou em vigor em agosto de 2010 e previa que os lixões deveriam acabar em 2014. Com o Novo Marco Legal do Saneamento Básico, sancionado em julho do ano passado, os prazos foram estendidos, seguindo alguns critérios e condicionados à implementação de cobrança pelo serviço: capitais, até dois de agosto de 2021; municípios, com população superior a 100 mil habitantes, até dois de agosto de 2022; entre 50 e 100 mil habitantes, dois de agosto de 2023; e população inferior a 50 mil habitantes até dois de agosto de 2024.

Independentemente do tamanho da cidade, as prefeituras têm um prazo para definir os modelos que irão adotar para a implementação da cobrança dos serviços de coleta e tratamento de resíduos. De acordo com a legislação, as gestões municipais têm até 15 de julho de 2021 para apresentar suas propostas de cobrança. Os gestores devem definir os modelos a serem adotados em cada cidade, a exemplo do que já acontece com as contas de água e de luz, em que a cobrança reflete o serviço utilizado por cada domicílio.

Aterro sanitário em Pontal do Paraná. Foto/JB Litoral

De acordo com o Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento – SNIS/2018, 94% dos resíduos sólidos urbanos estão sob a responsabilidade da administração direta das prefeituras e apenas 26% dos municípios brasileiros têm alguma forma de cobrança por esses serviços, cobrindo em média cerca de 10% das despesas totais com a sua prestação. Além de ser um problema para os orçamentos municipais, o tratamento e a destinação correta do lixo impactam diretamente no meio ambiente e na saúde da população.

Segundo dados do Índice de Sustentabilidade da Limpeza Urbana (ISLU), estudo realizado pelo Sindicato Nacional das Empresas de Limpeza Urbana, (Selurb) em parceria com a consultoria PwC, a média de geração de lixo no Brasil é de 343 quilos por habitante/ano. Mas dados do estudo sugerem que cidades que instituem a cobrança tendem a apresentar reduções significativas na geração, devido à economia comportamental promovida pela medida.

PARANAGUÁ

Com mais de 156 mil habitantes, Paranaguá é a cidade mais populosa do litoral e, em tese, tem até agosto de 2022 para se adequar às determinações do Novo Marco Legal do Saneamento Básico. A prefeitura informou que, atualmente, o valor cobrado pelo serviço de coleta e destinação dos resíduos é uma taxa vinculada ao IPTU, de R$ 1,86 por metro quadrado, limitando-se a 40% sobre o valor total do imóvel. Mas, o valor arrecadado está bem longe de cobrir as despesas com o processo, cerca de 25% do total.

O JB Litoral entrou em contato com as sete prefeituras do litoral, duas delas não enviaram os dados até o fechamento desta reportagem. Das cinco que responderam, nenhuma delas enviou ao Governo Federal as propostas para deixar o processo, que envolve a coleta, tratamento e destinação correta, dos resíduos economicamente viável.

Em Paranaguá, segundo dados de 2020, o município coletou e encaminhou, para destinação final ambientalmente adequada, cerca de 2 mil toneladas/mês de resíduos sólidos domiciliares; 100 toneladas/mês de resíduos sólidos recicláveis; e 1500 toneladas/mês de resíduos sólidos volumosos (entulho).

Detalhou, ainda, como é feito cada procedimento. A coleta de resíduos sólidos é realizada de acordo com cada tipo de material: os domiciliares são coletados por operadores, conforme rotas e turnos predefinidos, e transportados em caminhões compactadores, com destinação final exclusivamente em aterro sanitário. Os resíduos sólidos recicláveis são coletados por operadores, conforme rotas e turnos predeterminados, e transportados em caminhões do tipo ‘baú’. Sua destinação final ocorre exclusivamente nas associações de reciclagem, cadastradas junto ao município. Já os entulhos são coletados por pás carregadeiras, com auxílio de operadores, e transportados em caminhões do tipo ‘caçamba’, com destinação final em aterro sanitário.

MATINHOS

Situação do litoral

Com a terceira maior população do litoral, mais de 35 mil habitantes, e também um dos destinos mais procurados no verão, Matinhos cobra, por ano, até R$ 500 por domicílio para realizar a coleta do lixo. Diferentemente de Paranaguá, a taxa é distribuída e cobrada ao longo do ano na conta de água. Segundo a prefeitura, os vilões do setor são os grandes geradores de resíduos, cujo custo para coletar chega a ser, em apenas um dia, o valor cobrado durante todo o ano de um contribuinte pessoa física. De acordo com a nota enviada pela prefeitura, os municípios fazem a coleta não só domiciliar, a qual é responsável, coletando também de estabelecimentos e outros grandes geradores. Isso não é responsabilidade do município. Desses estabelecimentos, a responsabilidade é de quem gera o resíduo. Esse grande gerador tem que apresentar um plano de gerenciamento de resíduos sólidos, que os municípios precisam cadastrar, posteriormente também realizar o manifesto de transporte de resíduos. Na Lei 12.305/2010, artigo 22, diz que é responsabilidade do grande gerador contratar um transportador, a destinação e também a contratação de um profissional habilitado pelo conselho de classe – engenheiro, biólogo ou bioquímico. Esses vão elaborar o plano de gerenciamento de resíduos sólidos, que deverá ser enviado pelo município. De forma totalmente eletrônica, o município vai fazer isso, através do Primeiro Sistema para Recepção Eletrônica para o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólido. O PGRS digital – módulo de gestão pública está sendo distribuído gratuitamente para todos os municípios do Paraná.

Ainda segundo a prefeitura, Matinhos será a primeira cidade do Estado a se regulamentar perante o Plano Estadual de Resíduos Sólidos, cadastrando seus grandes geradores e comprovando sua sustentabilidade econômica e financeira.

MORRETES

Para atender a população com mais de 16 mil moradores, a Secretaria de Meio Ambiente, Urbanismo, Turismo e Cultura informou que tem contrato com uma empresa especializada para a coleta de resíduos sólidos urbanos e rurais orgânicos (classe II-A) não recicláveis, de porta em porta, e transporte desses resíduos até o local de destinação final no Aterro Sanitário, o Complexo Industrial Eco‐Tecnológico (CIETec), que faz sua reciclagem e tratamento, em atendimento à Política Nacional de Resíduos Sólidos (Lei 12.305/2010). Já a coleta de materiais recicláveis é realizada pela Associação dos Coletores de Materiais Recicláveis de Morretes (ACOMAREM), que destina de forma correta esses resíduos.

Por ano, são coletadas cerca de 275 toneladas de resíduos em Morretes e a cobrança realizada, atualmente, dos munícipes obedece ao seguinte cálculo: R$ 2,37 por metro quadrado da edificação. A taxa é cobrada diretamente no IPTU e o valor total da tarifa varia de acordo com o tamanho da propriedade. O problema é que, entre os municípios do litoral, Morretes é o que menos consegue custear a coleta com a taxa arrecadada, a qual cobre apenas 5,84% do custo total.  A pasta informou, ainda, que recebeu, este ano, a proposta de auxílio pela Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável e do Turismo (Sedest) para o enquadramento do município no Novo Marco Legal e que tal adequação será iniciada até o final de 2021.

GUARATUBA

O município é o único autossuficiente nessa situação. Segundo as informações repassadas pela prefeitura de Guaratuba, a cidade, que tem mais de 37 mil habitantes,contraria o estigma nacional e o que vem acontecendo nos municípios vizinhos, pois o valor arrecadado com a taxa do lixo cobre totalmente as despesas com coleta, tratamento e destinação dos resíduos sólidos.

A taxa cobrada, atualmente, aos domicílios de Guaratuba é de 8 vezes a Unidade Fiscal do Município (UFM) que está em R$ 3,48, o que dá um valor médio de R$ 28. 

A coleta é feita de porta em porta, com caminhão compactador e abrange 100% da área urbana e rural. Os resíduos coletados são destinados ao aterro sanitário, onde são totalmente tratados, de acordo com a prefeitura da cidade. Em 2020, foram coletadas cerca de 19.500 toneladas de resíduos. Questionada pela reportagem, se a administração municipal enviou a proposta de cobrança, a pasta se limitou a responder que o município tem buscado se enquadrar nas diretrizes do Novo Marco Nacional de Saneamento.

GUARAQUEÇABA

Já o município com a menor população do litoral, mas com características que dificultam a cobrança pela coleta e a realização do serviço, Guaraqueçaba, com pouco mais de 7.5 mil habitantes, arrecadou em 2020, R$ 91.085,90, com a taxa do lixo. O que corresponde, segundo a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, a aproximadamente 5% da despesa que a cidade tem para coletar, tratar e dar a destinação correta dos resíduos sólidos, que gira em torno de R$ 1 milhão por ano. 

A secretária de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável, Vanilda Dias, contou ao JB Litoral que a maior dificuldade do município está nas características de comunidades insulares e rurais, pois a prefeitura só arrecada o tributo dos moradores que vivem na sede, que vem cobrado junto com o IPTU. Todas as ilhas, as estradas rurais, nada é cobrado. O valor não arca com as despesas, isso é fato, disse a secretária.

A responsável pela pasta também afirma ser indispensável a consciência da população e revela: o aterro sanitário está com a capacidade esgotada, com apenas 30% do tempo estimado. Sobre a destinação correta do resíduo reciclável, tanto o que vem das estradas rurais, como o das ilhas e até da sede, acaba indo para a associação de catadores da cidade, o restante vai todo para o aterro inaugurado em 2012, com vida útil prevista para 30 anos, e agora, com 9 anos de utilização, já extrapolou a capacidade, o que demonstra que a população precisa ser mais consciente, tanto na separação do lixo reciclável, como no tratamento do lixo orgânico, com medidas como a compostagem, por exemplo.

Segundo Vanilda Dias, está prevista, até o final deste ano, a elaboração do Plano de Gestão Integrado de Resíduos, em parceria com o curso de Engenharia Ambiental e Sanitária, da Universidade Federal do Paraná.  “Também está em estudo um projeto de coleta seletiva nas ilhas, é um trabalho de formiguinha conscientizar a população sobre a separação dos resíduos, mas temos que avançar nisso e também providenciar uma nova célula do aterro sanitário, uma vez que a atual está saturada”, finalizou.

SEM RESPOSTAS E SEM PRESSÃO

O JB Litoral também entrou em contato com as prefeituras de Pontal do Paraná e Antonina. A administração de Pontal afirmou que não havia tempo hábil para o levantamento dos dados, mas que os encaminharia tão logo fosse possível. Já a de Antonina não deu retorno até o fechamento desta edição.

A reportagem também procurou o Ministério Público do Paraná (MPPR) que informou, por meio de sua assessoria de comunicação, não haver procedimentos atualmente instaurados na Promotoria de Pontal do Paraná sobre a adequação do município ao Novo Marco Legal do Saneamento Básico. Mas, o MPPR se limitou à informação daquela comarca, sem esclarecer a situação das demais cidades litorâneas.

Por Flávia Barros