Com chegada de nova instituição em Paranaguá, educação de gênero e diversidade voltam ao debate


Por Redação Publicado 05/07/2021 às 15h50 Atualizado 16/02/2024 às 06h56

Com a chegada da Aliança Nacional LGBTI+ em Paranaguá, um tema deve voltar à discussão do poder público e da sociedade civil: a necessidade de debater gênero, etnia, sexualidade e diversidade entre os estudantes do ensino fundamental e da população geral do litoral.

A iniciativa é que a comunidade tenha maior compreensão e respeito por indivíduos de características diferentes da sua, sejam aquelas relacionadas à condição sexual, à identidade de gênero, às questões raciais e tantas outras violências sofridas pelos grupos considerados como “minorias”, mas que em alguns casos são proporções maiores no estrato social, como é a situação da população negra, que representa 54% do Brasil, segundo o IBGE, mas é a população que mais morre também, sendo vitimada em 75% dos homicídios do país, de acordo com o Atlas da Violência.

Na tentativa de aproximar as pessoas das discussões legislativas, a organização Aliança Nacional LGBTI+ pretende levar demandas às Câmaras Municipais e promover engajamento das causas, entre elas, a necessidade de debater a questão da identidade nos ambientes estudantis. “No que se refere à educação de gênero na escola observo, como docente de sociologia, que a discussão deve transpor o senso comum e viabilizar o espaço para um debate sobre diversidade e desigualdades. A educação de gênero é o exato oposto do que fantasiam e chamam de ‘ideologia de gênero’. Debater gênero no âmbito escolar não deve ser visto como um monstro de sete cabeças, tampouco, deve reverberar os preconceitos que são levados e reproduzidos dentro do ambiente escolar”, explica Bhranda dos Santos, coordenadora do movimento recém-chegado ao litoral.

Para a ativista, é necessário enfrentar o problema do bullying, para que meninos e meninas tenham um ambiente livre de preconceitos para crescer, aprender e desenvolverem-se. “Discutir essa temática é um instrumento para que esses preconceitos sejam superados. Observa-se que muitos estudantes sofreram bullying no período escolar, porque os seus trejeitos não correspondiam ao que se esperava. Isto é, a educação de gênero tem como papel fundamental a conscientização sobre a existência da diversidade”, explica a coordenadora da Aliança Nacional LGBTI+, em Paranaguá.

Psicóloga vê escola como espaço de acolhimento

Para a psicóloga Carla Chemure Cechelero Slongo, a escola é o principal lugar para que tanto a criança e com o adolescente se entendam enquanto indivíduos e tenham a liberdade de falar sobre como se sentem. “O ambiente escolar é um dos principais espaços de aprendizagem e, muitas vezes, é o único lugar onde esse indivíduo pode falar de sexualidade e identidade de gênero”, explica Carla, que também ressalta que os responsáveis encontram certa resistência em lidar com o tema em casa. “Considerando as barreiras que os pais encontram ao falar do assunto, seja por falta de conhecimento, por vergonha, ou por não ter tido essa orientação na sua formação, os responsáveis acabam reproduzindo o comportamento com seus filhos evitando o diálogo, e essa conversa, na minha opinião, é o caminho mais curto para se resolver as questões as quais não temos conhecimento, podendo ser um momento muito importante em família”, diz a psicóloga, ao citar que conversas sobre questões de gênero deve ser um aprendizado intergeracional.

Para a profissional, a discussão é necessária porque é somente por meio do conhecimento que os preconceitos e problemas estruturais são debatidos. “A sede pelo conhecimento é como a água, muitas vezes as barreiras são superadas pela sua força. Toda e qualquer barreira que barre o conhecimento, é uma forma violência. A realidade do mundo atual é muito diferente do que conhecemos no passado, a liberdade de expressão faz parte desta geração e precisamos compreender isso. Precisamos falar de assuntos que ainda são tabus e entender que a sexualidade faz parte do processo de educação e é por intermédio dela que temos a possibilidade de reduzir o preconceito e a falta de tolerância que vivemos atualmente”, explica.

Discussão deve furar bolha


Bhranda e Carla concordam que há importância em trazer essa temática para o centro das discussões, porque acaba envolvendo toda a estrutura social que, muitas vezes, reproduz preconceitos, violenta pessoas e que discrimina indivíduos por características não compreendidas de forma clara. “Ao meu ver, [debater essas questões] é de máxima importância já que as temáticas são tratadas como tabu e com um grande ar de conservadorismo, que tenta de toda a forma obscurecer debates importantes sobre a construção da subjetividade, sexualidade, a identidade de gênero, violências sofridas e, principalmente, sobre o preconceito arraigado nos comentários deferidos às pessoas que pertencem à comunidade. É necessário que todas e todos, enquanto parte da sociedade civil, estejam abertos a reconhecerem seus preconceitos para que possamos combater a intolerância e a violência que vêm ceifando vidas” diz Bhranda. A psicóloga Carla vai na mesma linha de defesa da necessidade de falar mais sobre as pautas. “Ana Freud, a filha de Sigmund Freud, disse: a cura é pela fala. Precisamos curar nossa sociedade do preconceito, da falta de conhecimento, da baixa tolerância e, principalmente, da falta de empatia. E isto pode e deve ser trabalhado pela fala, conversando, dialogando, falando sobre nossas dúvidas e, assim, poderemos entender que o respeito preserva as relações, possibilitando o reconhecimento do outro e de seus direitos”, finaliza Carla.

Com pouco tempo de criação, a Aliança LGBTI+, no litoral paranaense, deve modificar as estruturas de poder e buscar novas discussões públicas e, inclusive, planejar paradas do Orgulho em Paranaguá. Todas as ações estão em discussões iniciais, mas já abrem caminho para dar voz a classes que quase sempre não tiveram representatividade na esfera pública dos sete municípios.

Por Brayan Valêncio