Desde 2017, prefeitura tenta, pelos meios errados, reduzir tarifas de água e esgoto


Por Luiza Rampelotti Publicado 11/04/2020 às 15h41 Atualizado 15/02/2024 às 09h02

Após ter sido eleito, em 2016, com a promessa eleitoral de acabar com a cobrança de 80% da taxa de esgoto em seu primeiro mês de mandato, que se iniciou em janeiro de 2017, e rever o contrato com a então concessionária do serviço de abastecimento e saneamento da cidade, a CAB Águas de Paranaguá, o prefeito Marcelo Elias Roque (Podemos) assumiu a prefeitura sem cumprir com o que disse.

Diferentemente do que prometeu, antes mesmo da transferência do contrato com a empresa, Roque firmou um Aditivo ao Instrumento de Consolidações com a Iguá S.A. (Ofício 1103/2017), em julho de 2017, o qual diminuiu o valor da tarifa em 5% até o dia 31 de março de 2018. Como a companhia tinha grandes dívidas junto a bancos e era suspeita de envolvimento na Operação Lava Jato, ela foi repassada, em março daquele ano, para a Iguá Saneamento S.A., proprietária da Paranaguá Saneamento, atual concessionária dos serviços na cidade.

Sem a revisão do contrato e já passados 10 meses de gestão, ainda sem a diminuição da taxa de esgoto, a população cobrou a promessa do prefeito por meio das redes sociais. Devido à pressão popular, Marcelo Roque pediu a suspensão, em outubro de 2017, da cobrança de esgoto. Na época, o pedido envolveu a Ilha dos Valadares, porque, segundo ele, a Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) ainda estava em fase de teste, e demais bairros onde não havia sistema de separação absoluta.

Acúmulo de vitórias na Justiça

Em novembro a suspensão foi efetuada, após o acolhimento de uma liminar na Vara da Fazenda Pública de Paranaguá que obrigava a empresa a se abster de efetuar a cobrança nas regiões onde ainda não houvesse o sistema reparador absoluto. O prefeito reforçou a notícia, por meio de suas redes sociais, destacando que a concessionária pagaria multa diária de R$ 500 por usuário, caso cobrasse a taxa indevidamente.

Em dezembro, a Paranaguá Saneamento atendeu a decisão judicial e não efetuou a cobrança de esgoto. No entanto, dias após a suspensão, a tarifa voltou a ser cobrada, por conta de uma resolução do presidente do Tribunal de Justiça do Paraná, Desembargador Renato Braga Bettega, que derrubou a liminar anterior. 

Naquela época, a Iguá informou que a cobertura de esgoto chegava a 70% do município, por meio de redes mistas e separadoras absolutas, e todo o esgoto, transportado pelas redes, era tratado em cinco ETE’s denominadas de Costeira, Emboguaçu, Nilson Neves, Samambaia e Valadares.

Em dezembro de 2018, a empresa entregou a primeira Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) modular da companhia, a ETE Cominese, que atende 16 bairros. Com isso, informou que, atualmente, a cidade conta com 100% de água potável, conforme os padrões dos órgãos reguladores, e 79% de esgoto coletado e tratado, estando entre as 100 cidades com maior índice de saneamento do Brasil.

Intervenção também foi derrubada

Apesar da alta taxa de esgoto tratado informada pela concessionária, em outubro de 2018, o prefeito publicou o Decreto de Intervenção nº 920/2018, o qual permitiu a intervenção na empresa devido à “falta de justificativa dos valores cobrados hoje em dia”. Em razão da ação, a prefeitura realizou a ocupação do prédio, que durou somente um final de semana.

No dia 08 daquele mês, a direção da companhia entrou com liminar junto à Vara da Fazenda Pública do Município, contra o Executivo e a Central de Água, Esgoto e Serviços Concedidos do Litoral do Paraná (CAGEPAR), autarquia municipal. O pedido foi pela suspensão de todos os efeitos do Decreto de Intervenção, e o juiz Rafael Kramer Braga atendeu, informando que, apesar de os argumentos usados pela prefeitura, ela não trazia nenhuma consideração específica sobre o caso concreto. “O Município se limita a acentuar a gravidade dos elementos, mas sem dizer de que maneira a intervenção irá eliminar ou reduzir o risco de danos ambientais ou à saúde da população”, disse.

A prefeitura não aceitou o resultado e buscou uma nova tentativa de resgatar a intervenção junto ao Tribunal de Justiça do Paraná. Porém, em novembro, foi mantida a suspensão da intervenção pelo desembargador Hélio Henrique Lopes Fernandes Lima, o qual destacou que “os fundamentos legais e as questões fáticas, que permeiam a situação em análise, se encontram bem delineados nas decisões proferidas nos mandados de segurança antecedentes a esta impetração”. Até hoje, a questão continua nas instâncias superiores da Justiça.

Tentativas junto à Câmara Municipal

Ainda em 2018, a CAGEPAR contratou a empresa Theguyal Consultoria Ambiental para realizar estudo técnico a respeito do serviço prestado pela concessionária. De lá para cá, Marcelo Roque tem buscado, por meio da Câmara de Vereadores, reduzir a tarifa de água e esgoto na cidade, mesmo sabendo que a alteração contratual só pode ser feita por meio do Reequilíbrio Econômico Financeiro do contrato com a concessionária, por um Termo Aditivo, visto que a informação consta na Lei Federal 8.666/93 (Lei das Licitações), e no contrato da concessão pública.

Câmara aprovou leis de redução da tarifa e escalonamento tarifário por unanimidade. Foto/JBLitoral

No primeiro e único aditivo realizado pelo prefeito, em 2017, que concedeu 5% de desconto na tarifa, por tempo determinado de um ano, a cláusula 6ª previa que “as partes deverão, de comum acordo, celebrar e negociar novo termo aditivo com o objetivo de recompor o equilíbrio econômico-financeiro do contrato, dentro do prazo de vigência do desconto tarifário” previsto no documento (até março de 2018). O Termo informava, ainda, que, caso o processo de reequilíbrio econômico-financeiro não fosse concluído no prazo previsto, o desconto tarifário de 5% seria revogado automaticamente, voltando a valer a tarifa anterior, sem prejuízo do seu reajuste ordinário. Desde então, Roque não realizou outro Termo Aditivo para tratar a respeito de um novo desconto. 

Porém, neste ano de 2020, ele criou dois Projetos de Leis (PLs) que preveem a redução da tarifa de esgoto de 80% para 40% e a criação de uma nova medida no escalonamento tarifário pela Paranaguá Saneamento, além de publicar o Decreto 1.911, que reduz em 15% a tarifa de água. Ambos os PLs foram aprovados, por unanimidade, pela Câmara de Vereadores, em março. De acordo com ele, os atos normativos foram embasados por meio dos estudos técnicos realizados pela Theguyal Consultoria Ambiental.

Justiça suspende leis de redução de tarifas

Os atos foram levados, novamente, à Justiça, pela concessionária, que conseguiu, na terça-feira (31), a suspensão das Leis 3.881/2020 e 3.882/2020, além do Decreto nº 1.911. O juiz Rafael Kramer Braga, da Vara da Fazenda Pública, concedeu o Mandado de Segurança Preventivo contra o diretor geral da CAGEPAR, Gabriel do Rozario Antunes, e contra o prefeito.

De acordo com a Iguá S.A., as normas editadas pelo município impõem alteração unilateral do contrato de concessão, sem o devido reequilíbrio econômico-financeiro, além de não ter sido informada da convocação da reunião da CAGEPAR, a qual deliberou e recomendou a redução das tarifas.

A decisão de redução é inconstitucional e ilegal, por não cogitar os efeitos econômicos dela derivados. Não houve qualquer comunicação formal para que a Paranaguá Saneamento pudesse participar da sessão em que houve a deliberação”, diz.

Na ação, a empresa explica que a via adequada para promover medidas de alteração da estrutura tarifária é, exclusivamente, a celebração do Termo Aditivo Contratual. “Não pode o Município tratar de temas que, de acordo com lei complementar municipal, devem ser regulados pela autarquia especial CAGEPAR”, afirma.

Diante do exposto, mais uma vez, o juiz Rafael Kramer Braga decide pela concessão da liminar, devido à prefeitura ter ignorado “total e indevidamente” o pedido de prorrogação de prazo, feito pela Paranaguá Saneamento, para responder à proposta divulgada pelo Município.

Evidente que o estudo apresentado, imbuído de informações e notas técnicas, dificilmente seria respondido apenas no período de 15 dias, já que, obviamente, na resposta, a empresa necessitaria igualmente acompanhar suas justificativas e matérias de defesa com dados próprios e acrescentar novas informações técnicas a toda discussão travada. Justamente por isso que a impetrante requereu a dilação de prazo, por, pelo menos, mais 15 dias”, diz. Entretanto, antes de conceder ou não a prorrogação do prazo, a prefeitura editou os atos normativos citados. “Entender que as alterações tarifárias são desde logo aplicáveis, seria ceifar da impetrante a ampla defesa que lhe deveria ter sido garantida”, esclarece o juiz.

Decisões da prefeitura contra Iguá foram derrubadas pela Justiça

Prefeitura derruba liminar

A prefeitura de Paranaguá informou que, quanto à liminar deferida pela Vara da Fazenda Pública, em favor da Paranaguá Saneamento, o município recorreu da decisão. Na segunda-feira (06), o Tribunal de Justiça do Paraná expediu decisão judicial mantendo a redução sobre o percentual para cálculo da tarifa de esgoto, dos atuais 80% para 40%, e da água para 15%.

Também foi mantida a chamada estratificação das classes de consumo, que permite o pagamento pelo que for consumido e não com cálculo definido conforme as faixas tarifárias.

A Paranaguá Saneamento está recorrendo da decisão.