Dia dos Pais: “Minhas filhas são os maiores prêmios da minha vida”, diz pai trans


Por Luiza Rampelotti Publicado 12/08/2022 às 12h38 Atualizado 17/02/2024 às 15h00

Junior Bratti tem 42 anos e é um homem transexual, isto é, sua identidade de gênero não corresponde à de seu sexo de nascimento. Morando em Pontal do Paraná há 20 anos, foi no litoral paranaense que ele encontrou um lar para viver com suas duas filhas: Camila e Heloísa Bratti.

Ele conta que sempre se identificou com o sexo masculino, mas demorou muitos anos para assumir a identidade. Durante o período “no armário”, viveu relacionamentos com outros homens e, então, engravidou.

Nas gestações, Junior ainda atendia pelo nome de batismo, Adriana, e foi somente aos 26 anos, em 2006, que decidiu que era o momento certo de enfrentar o preconceito que poderia sofrer e se libertar do fardo de viver uma vida a qual não se sentia feliz. “Com 26 anos resolvi chutar o balde e assumir minha vida. Então me separei e passei a viver conforme eu queria, mas as pessoas já viam alguma coisa diferente em mim antes”, conta.

Neste Dia dos Pais (14), Junior conta ao JB Litoral como é ser um pai trans, apesar de reconhecer que sua situação é diferente da maioria dos homens trans no Brasil, ele diz que nunca teve problemas com o preconceito, mas que já recebeu olhares “estranhos”.

Se você impuser o respeito, também é respeitado. E minhas filhas nunca sofreram nenhum preconceito também por conta da minha orientação sexual”, diz.

Pai solo, ele cria as meninas de 19 e 17 anos sozinho há mais de 16 anos. Conta que já enfrentou muita dificuldade financeira e que foi no esporte que encontrou uma oportunidade de melhorar de vida.

Aos 42 anos, Junior levou algum tempo para se assumir como homem trans. Isso só aconteceu há cerca de 16 anos. Foto: Diogo Monteiro/JB Litoral


O esporte mudou a minha vida”, diz Junior


Em 2012 passei a correr e, então, minha vida só foi mudando para a melhor, porque o esporte facilitou muito. Minhas conquistas vieram no pódio e as pessoas não me viam como trans, mas como atleta. Tenho diversos troféus de corridas”, comenta.

Atualmente, Junior trabalha como chefe de setor na secretaria municipal de Esportes de Pontal do Paraná, está no segundo ano da faculdade de Educação Física na Universidade Federal do Paraná (UFPR) e faz autoescola. A rotina cansativa não o intimida ou o impede de sonhar alto, seu objetivo é trabalhar com assessoria esportiva e promover projetos esportivos para crianças na cidade.

Fazer tudo isso cansa, mas penso que esse é o momento, porque a oportunidade bateu na porta. Não esperava que passaria no vestibular da UFPR, por exemplo, mas Deus tem me abençoado muito e hoje vivo meu melhor momento. Não voltaria atrás em nada”, destaca.

Para ele, que foi criado sem estrutura familiar, sem pai ou mãe, vivendo em casas diferentes, quando as oportunidades chegam, precisam ser agarradas com as duas mãos. “Morei um pouco com cada um, trabalhei limpando casas, passei dificuldade financeira, e nunca imaginei que estaria vivendo tudo isso hoje, junto das minhas filhas”, comenta.

Corredor profissional, ele acumula diversos troféus e medalhas, mas afirma com convicção que seus maiores prêmios são as filhas. Foto: Diogo Monteiro/JB Litoral

Pai e filha estudam juntos


Com a chegada das filhas, Junior conta que a sua vida mudou. Foi quando a filha mais velha, Camila, de 19 anos, estava estudando no Ensino Médio, que ele decidiu também voltar aos estudos, e se formaram quase que ao mesmo tempo. Depois, ela passou na faculdade de Administração Pública, também na UFPR, e o pai realizou o sonho de cursar Educação Física, na mesma instituição.

Isso faz com que pai e filhas sejam muito unidos e pontos de apoio uns para os outros. “Minhas filhas sempre foram as primeiras da lista, de todas as competições, elas são os maiores prêmios da minha vida. Tudo o que faço é pensando nelas”, se emociona.

A filha Camila, de 17 anos, conta que o pai é sua inspiração de vida. Heloísa segue o mesmo entendimento. “Desde que me entendo por gente, nunca tive problema em relação à orientação dele, e sempre me inspirei nele. Sempre nos ajudamos e ver toda sua força, coragem e determinação influenciou muito em quem estou me tornando. Nós o amamos muito e só temos a agradecer por tudo, por ter nos criado e nos ajudado a ser quem somos”, conclui.  

Por Luiza Rampelotti com entrevistas de Diogo Monteiro