Mãe denuncia conduta de médico em Matinhos; ela acredita que o filho nasceu morto por negligência no atendimento


Por Flávia Barros Publicado 24/01/2023 às 17h55 Atualizado 18/02/2024 às 03h11

Um desabafo dolorido nas redes sociais. Foi essa a forma que a dona de casa Jussara Nunes de Oliveira, 31 anos, encontrou para dividir a dor e a revolta por perder o tão esperado filho caçula, Luan Gabriel, previsto para nascer em 13 de janeiro.

De acordo com Jussara, no dia 6 de janeiro ela não acordou bem. Com contrações, sem sentir o bebê mexer e com dor no peito, foi até o Hospital e Maternidade Nossa Senhora dos Navegantes, em Matinhos, e conta que, por volta das 10h30, foi atendida pelo médico de plantão. Começou naquele momento o que ela acredita ser negligência médica.

O médico me atendeu e começou a procurar o coração do meu neném. Foi grosseiro comigo quando estranhei a demora em encontrar os batimentos. Depois disse que achou e que meu bebê estava saudável”, contou.

TEVE QUE VOLTAR PARA CASA


Em conversa com o JB Litoral, Jussara afirmou que mesmo com dores e sem sentir o bebê mexer, teve que voltar para casa. “Sem ele ter deixado eu escutar o coração do meu filho, questionei, disse que o coração dele estava fraquinho e eu com muita dor. Ele falou que era porque estava nos dias de ganhar e que se ele não nascesse até o dia 15, era para voltar no dia 16. E também que se tivesse alguma dúvida, voltasse de dois em dois dias“.

Mas ela não aguentou as dores e a angústia e retornou para a maternidade 15 horas depois de ter saído de lá, 1h30 da manhã de sábado (7).

Voltei com o coração apertado. Passei o dia sem sentir o bebê mexer e com muitas contrações. Chegando lá fui atendida por outro médico. Ele procurou o coração do meu bebê, estimulou para mexer, mas nada. Então ele disse que não poderia me dar certeza, mas acreditava que meu filho já estava em óbito dentro da barriga“, contou a mãe de outros três filhos, de 14, 10 e 7 anos.

PESADELO


Como se não bastasse a dor da notícia, Jussara relata que ouviu, do segundo profissional, que ela teria que voltar para casa novamente. “Ele me pediu para retornar pela manhã, às 10h, porque não tinha os equipamentos necessários para me atender e que tentaria em algum outro hospital“.

Jussara contou, ainda, que saiu da maternidade e, desesperada, no meio da rua, ligou para a mãe, às 4h da manhã. “Ela pediu para que eu não saísse de lá porque eles teriam que me dar atendimento. Quando minha mãe chegou e disse que iria até a polícia, o médico se comprometeu a fazer o possível; fez algumas ligações, explicou meu caso para o Regional e conseguiu uma ambulância que me levou até lá“, detalhou a dona de casa.

NO REGIONAL, A CONFIRMAÇÃO


A dona de casa e o marido foram recebidos no Hospital Regional do Litoral (HRL), em Paranaguá.

Lá, o médico conversou com a gente e explicou que, pelo que o outro doutor havia passado, meu neném estava em óbito e ele iria fazer uma ecografia para confirmar, pois queria salvar a minha vida“.

Após ouvir que o bebê estava morto, Jussara foi informada pelo profissional que seria feita uma indução do parto, pois, sem cirurgia, ela poderia ir ao velório do filho.

Foi muito difícil, só consegui com a força da minha mãe e meu marido, pois sabia que meu filho nasceria morto. Juntei minhas forças e tive meu neném às 15h18 de 8 de janeiro. Naquele momento, fizemos um esforço para fazer de conta que ele tinha nascido vivo e termos o único momento com ele em nossos braços“, relatou.

INVESTIGAÇÃO


No momento da despedida, mais sofrimento para a família. “Colocamos um colchão dentro da capela e o caixão com o bebê entre mim e meu marido, e ficamos ali, deitados, com ele dentro do caixão, lembrando que ele iria dormir entre nós dois“.


Após o velório e sepultamento do bebê, Jussara e o marido foram até a delegacia de Matinhos e registraram um boletim de ocorrência. De acordo com o documento, o médico do HRL percebeu, após o nascimento, que o bebê já havia morrido “havia um certo tempo“. De acordo com a dona de casa, ela assinou papéis em que autorizou a polícia a ter acesso aos seus prontuários médicos.

A delegacia de Matinhos investiga o caso.


VOLTOU PARA A CAPITAL


Jussara também contou que foi morar em Matinhos, onde a mãe vive no bairro Costa Azul, assim que descobriu que estava grávida, com 14 semanas de gestação. Ela disse que, depois da situação traumática, voltou para Curitiba, onde morava antes da gravidez, para que pudesse ter acesso a um pós-parto e atendimento psicológico. “O secretário de Saúde de Matinhos me procurou, perguntou se eu poderia ir até a secretaria formalizar a queixa. Expliquei que não tinha como me deslocar e ele disse que mandaria um carro me buscar“, contou. Mas ela afirma que, quando chegou no dia marcado, uma outra pessoa que se identificou como sendo da secretaria afirmou que o secretário havia se precipitado e que seria aberta uma sindicância para apurar o caso.

A dona de casa acredita que se o primeiro atendimento na maternidade de Matinhos tivesse sido realizado corretamente, talvez ela pudesse estar em casa com o caçula nos braços. Luan Gabriel seria o primeiro filho do atual marido.

RESPOSTA


A reportagem procurou a Prefeitura de Matinhos. Por meio de nota, a assessoria de comunicação afirmou que a administração municipal se solidariza com a dor da mãe e que ela “foi atendida por profissionais com mais de 20 anos de atuação na área médica e, no mínimo, seis anos de serviços prestados a mães do município“, diz parte do texto.

A gestão alega, ainda, que a equipe médica que atendeu Jussara, “julga como natural o desencontro de algumas informações, mas preza pela veracidade dos fatos e que ela seja preservada, em nome dos bons serviços prestados pelo Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, durante todos estes anos de trabalho“.

Também de acordo com a nota, “Jussara não é paciente habitual do Hospital Nossa Senhora dos Navegantes, portanto não há uma ficha de acompanhamento clínico/médico de sua gestação, que vinha sendo feito em Curitiba, local onde reside a paciente“. No entanto, a nota não explica de que forma o caso será apurado.

DIVERGÊNCIA


Ao contrário do que afirmou a administração de Matinhos, a dona de casa realizou sim todo o pré-natal na rede municipal de saúde da cidade. O JB Litoral teve acesso à caderneta de gestante onde constam os atendimentos e consultas feitos por Jussara na Unidade Básica de Saúde do Perequê, com vários exames laboratoriais e de imagem, todos solicitados e elaborados na rede de Matinhos entre os meses de julho e dezembro de 2022, em que constam que mãe e bebê passavam por uma gestação sem intercorrências, uma gravidez dentro dos parâmetros considerados normais. A última consulta do pré-natal seria realizada em 11 de janeiro.

No atestado de óbito consta como causa da morte do bebê insuficiência placentária.