Projeto Amigo dos Amigos: um refúgio diante da luta contra a dependência química em Paranaguá


Por Cleverson Teixeira Publicado 09/08/2024 às 10h17
Criado há 18 anos, o projeto é realizado na Escola Municipal Maria José Henrique Tavares.
Criado há 18 anos, o projeto é realizado na Escola Municipal Maria José Henrique Tavares.

O uso constante de drogas é uma preocupação crescente em todo o país. No Paraná, segundo a Secretaria de Segurança Pública (SESP), houve um aumento de 50% nas ocorrências relacionadas ao consumo de entorpecentes nos últimos dois anos, e, até abril de 2024, foram contabilizados mais de 2 mil casos. Esse cenário alarmante revela a importância de iniciativas que proporcionem apoio e tratamento aos usuários de substâncias ilícitas.

Em Paranaguá, o Projeto Amigo dos Amigos, criado há 18 anos, é visto como uma luz no fim do túnel para aqueles que querem sair desse mundo obscuro. Todas as noites de segunda-feira, a partir das 20h, os dependentes químicos e ex-usuários compartilham histórias, sentimentos e experiências nas instalações da Escola Municipal Maria José Henrique Tavares, no Jardim Santa Rosa.

Ao JB Litoral, o líder do projeto, Juliano Freire, explicou que os encontros são estruturados em torno de assuntos e dinâmicas específicas para o tratamento da dependência química. Ele também citou a importância da família dos usuários nesse processo, pois é ela que convive de forma direta com o dilema desencadeado pelo uso de drogas.

O projeto não tem uma cura, remédio, não tem a injeção, mas tratamos e levamos um pouquinho mais de experiência para tentar tirar a pessoa do vício. Gostamos, também, de tratar os familiares, porque são os que mais sofrem”, disse Juliano.

Juliano Freire está à frente do projeto Amigo dos Amigos.
Juliano Freire está à frente do projeto Amigo dos Amigos.

ACOMPANHAMENTO CONTÍNUO E TOTAL DE PARTICIPANTES

O apoio oferecido não se resume apenas às reuniões nas segundas-feiras. Durante a semana, é realizado um acompanhamento contínuo, com visitas aos participantes que necessitam de ajuda adicional. Além disso, são feitas atividades para integrar os membros do grupo, mostrando que é possível ter uma vida fora das drogas.

Alguns pedem ajuda. Diante disso, vamos na casa de um e de outro, para realizarmos esse acompanhamento pessoal. De vez em quando, também fazemos festa. No mês passado, teve Festa Junina. Então, isso tudo é para atrair eles para o projeto e para entenderem que tem uma nova vida para se viver”, relata o líder do projeto.

Mesmo sem ajuda de custo, o projeto já beneficiou inúmeros usuários ao longo de quase 20 anos, por meio do esforço em conjunto com as famílias dos dependentes químicos. Atualmente, 64 deles participam de forma regular das reuniões. Ainda conforme Freire, caso essas pessoas precisem ir para uma casa de recuperação, o projeto fornece o auxílio necessário.

Há pessoas que não precisam de casa de recuperação, mas existem algumas que sim. Se a pessoa não conseguir, damos um auxílio para ela. Cada caso é um caso, porém mais da metade consegue esse apoio somente com o projeto”, salientou.


FORMALIZAÇÃO DO PROJETO


Recentemente, a diretoria do projeto deu entrada no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas (CNPJ). Isso facilitará o trabalho da rede de suporte aos dependentes químicos, que poderá receber apoio do poder público.

Nós assumimos, em novembro do ano passado, a diretoria deste projeto. E o primeiro passo foi fazer com que ele tivesse uma identidade. Então, estamos conseguindo o CNPJ. Inclusive, o estatuto já está montado para, futuramente, termos um local próprio e oferecer tratamento psicológico e tudo mais”, concluiu Juliano Freire.


TESTEMUNHO DE SUPERAÇÃO


Renan Mendes Barbosa, de 32 anos, é um exemplo vivo do impacto positivo do projeto. Em entrevista ao JB Litoral, o técnico em refrigeração compartilhou a sua dolorosa jornada durante o período em que consumia drogas. “Eu trocava confraternização, a companhia da minha esposa e da minha filha pela droga. Cheguei a tirar as coisas de casa. Muitas pessoas julgam o dependente químico, mas ninguém sabe o que se passa. É uma doença que manipula a cabeça da gente”, contou.

O ex-usuário de entorpecentes também relata como chegou ao fundo do poço. Conforme ele, tudo colaborava para que os seus olhos não enxergassem a alegria de viver. “Estava cansado da humilhação. Eu sabia da minha profissão, da minha capacidade, do amor que tinha dentro de mim, mas não conseguia enxergar isso porque estava com os olhos e ouvidos tapados. Eu começava a julgar as pessoas que me amavam”, afirmou.

“Eu trocava a companhia da minha esposa e da minha filha pela droga”, disse Renan.
“Eu trocava a companhia da minha esposa e da minha filha pela droga”, disse Renan.

LIBERTAÇÃO


Passado um tempo, a transformação de Renan começou a se manifestar por meio de um encontro espiritual e da decisão de se internar em uma clínica de reabilitação. Cerca de três meses depois, ele conseguiu uma recolocação no mercado de trabalho, além de ter reconquistado a sua família.

Eu precisava de uma reeducação e é onde precisei conter as minhas emoções. Aprendi com os nãos. Hoje estou feliz, pois a minha família voltou. E não faço por amor à minha família, faço por amor a mim, primeiramente, porque não tem como eu cuidar de alguém se eu não cuidar de mim”, complementou.




Durante a conversa, Renan também enfatizou a relevância do projeto Amigo dos Amigos. Para ele, o encontro faz com que os participantes percam o medo de expressar aquilo que sentem. “Esse projeto é uma bênção, uma reunião onde todo mundo expressa os seus sentimentos. Às vezes, tem pessoas que não conseguem se abrir lá fora, mas aqui, numa conversa, ela vai ver um irmão falando algo que precisa ouvir ou algo que ela queria falar, e é onde começa a partilhar a sua emoção”.

Livre das drogas há um ano e seis meses, ele não deixou de falar do apoio contínuo e da fé em sua recuperação. “A dependência química tem cura, mas a cura são os caminhos do Senhor. É Jesus Cristo. Ele é a vida. Ele nos liberta. Hoje tenho qualidade de vida”, finalizou Renan Mendes Barbosa.

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