Falta de transparência nos Termos de Compromisso Urbanístico das empresas gera dúvidas à população


Por Luiza Rampelotti Publicado 20/05/2020 às 08h29 Atualizado 15/02/2024 às 10h20

Para identificar, avaliar, prevenir, compensar e mitigar os impactos na vizinhança de um empreendimento ou atividade, existe o Estudo de Impacto de Vizinhança (EIV) – importante instrumento previsto pelo Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001) para o ordenamento territorial urbano em consonância com a comunidade.

Trata-se de um documento técnico a ser regulamentado e exigido, com base em lei municipal, para a concessão de licenças e autorizações de construção, ampliação ou funcionamento de empreendimentos ou atividades que possam afetar a qualidade de vida da população residente na área ou no entorno.

Em Paranaguá, o EIV passou a ser adotado em 2007, por meio da Lei Complementar nº 60/07 e da Lei nº 2822/07, mas só foi regulamentado em 2013, por meio do Decreto nº 544. Cada município regulamenta a exigência do estudo a sua maneira, conforme o interesse local e o seu Plano Diretor.

Por meio desse estudo de impacto, os empresários podem prever riscos ao empreendimento e adotar medidas para harmonizar a atividade com o seu entorno. Porém, o EIV é aprovado junto ao Poder Público – Município com respaldo do Ministério Público Estadual.

Medidas mitigatórias e compensatórias

Dentro do estudo, as empresas apresentam as medidas mitigadoras propostas, que servem para neutralizar, superar ou reverter os impactos negativos. São aplicadas caso seja possível alterar algum ponto do projeto para reduzir ou eliminar eventuais consequências negativas ao ambiente urbano.

E há, também, as medidas compensatórias, que são utilizadas quando, mesmo com a aplicação de medidas mitigadoras, os efeitos negativos do empreendimento permanecem. Desta forma, elas servem para compensar os impactos causados por meio da equivalência entre perdas e ganhos para o bairro e a comunidade.

Após a análise do Estudo de Impacto de Vizinhança e das medidas propostas, que são, também, apresentadas à comunidade por meio de audiências públicas, se o Município e o Ministério Público aceitarem, ambos os órgãos, junto ao empreendimento, elaboram e assinam o Termo de Compromisso Urbanístico (TCU), para, então, o estudo ser aprovado.  

Para a liberação do alvará de construção, o EIV já deve estar aprovado e o TCU, que tem força de título executivo extrajudicial, já assinado com o cronograma de execução das medidas compensatórias ou mitigatórias.

Transparência dos TCU’s em Paranaguá

Na cidade, a relação de EIVs aprovados e os Termos de Compromisso Urbanístico são disponibilizados no site da prefeitura, na aba da secretaria municipal de Urbanismo. No entanto, não são todos os estudos de impacto que são divulgados e nem todos os TCU’s. Além disso, em alguns Termos de Compromisso não constam quais são, de fato, as medidas que serão tomadas pelos empreendimentos para compensar os impactos negativos à vizinhança, nem o valor dessas atividades ou serviços.

Uma vez que cada medida aprovada pelo Poder Público tem um custo e as obras se tornam públicas, já que a manutenção se torna de responsabilidade do município, elas são, muitas vezes, inauguradas pelo próprio prefeito Marcelo Elias Roque (Podemos) em conjunto com promotores do Ministério Público do Paraná (MPPR) em Paranaguá. Mas, o processo de contratação dessas obras pelos empreendimentos ainda é obscuro. Não se sabe, por exemplo, se cada empresa gastou o que de fato informou para contratar o serviço; nem de que forma é realizada a contratação, se existe um chamamento público ou se as empresas são definidas por critérios internos do próprio empreendimento responsável pela entrega das medidas compensatórias ou mitigadoras, entre outros.

Esta falta de transparência tem gerado dúvidas à população com relação à elaboração do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB) da cidade. Inicialmente, a elaboração desse plano constava no TCU da empresa Terminal de Contêineres de Paranaguá (TCP), como medida compensatória, e foi, inclusive, debatido pelo Conselho Municipal de Saneamento Básico (COMSAB) em reunião, no dia 26 de setembro de 2018. Porém, atualmente, quem está contratando a elaboração do PMSB é a Cia. Brasileira de Logística (CBL).

Plano Municipal de Saneamento Básico: TCP ou CBL?

Na ata da reunião do COMSAB, de 2018, é informado que a TCP, diante das medidas compensatórias a serem realizadas, deveria englobar nos seus trabalhos água, esgoto, drenagem e águas pluviais; e que outra empresa responsável, JM Tratamento de Resíduos Ltda, deveria fazer o Plano de Gerenciamento de Resíduos Sólidos (PGRS), que já estaria licitado pelo Município. Sendo assim, o PGRS seria anexado aos trabalhos do Plano Municipal de Saneamento Básico, objetivando reduzir os custos para a sua elaboração, visando sua utilização pela empresa a ser contratada pela TCP. Entretanto, neste ano de 2020, a elaboração do PMSB está sendo realizada pela Envex Engenharia e Consultoria, empresa de Curitiba, contratada pela CBL, que também realizou a contratação como forma de medida compensatória pelos impactos causados à sua vizinhança.

Com dúvidas sobre a alteração da medida, o JB Litoral procurou a CBL questionando sobre quem definiu a troca da compensação de uma empresa para outra, qual o valor de determinada medida compensatória, entre outros. A empresa informou que todas as questões relacionadas ao Plano foram definidas por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta, assinado entre a empresa, o MPPR e o Município. “Quem determina quais serão as medidas compensatórias, realizadas pelas empresas, é o próprio MP em conjunto com o Município, acreditamos que diante de critérios de prioridade e necessidade para a cidade”, disse.

A reportagem também entrou em contato com a TCP, questionando sobre quem definiu a alteração da compensação de uma empresa para a outra, qual outra medida compensatória teria entrado no lugar, entre outros. Porém, até o fechamento desta reportagem, não houve retorno.

PMSB já está sendo divulgado pelas redes sociais

O que diz a prefeitura e MPPR

A reportagem também procurou a prefeitura e o MPPR (2ª Promotoria e Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente) fazendo, além dos mesmos questionamentos realizados às empresas, perguntas relacionadas à transparência dos EIVs e TCUs, como sobre o valor das medidas compensatórias realizadas pelos empreendimentos em Paranaguá e onde é possível acessar essas informações; a respeito do processo de contratação dos serviços e a fiscalização realizada pelo Poder Público a essas contratações, entre outros. No entanto, até a conclusão desta reportagem, as perguntas não foram respondidas. Sendo assim, o JB Litoral protocolará os questionamentos nos órgãos citados por meio da Lei Federal nº 12.527/11, a Lei de Acesso à Informação.