Três anos após transplante, dentista fala sobre a luta contra Leucemia e a importância da doação


Por Publicado 28/02/2020 às 16h00 Atualizado 15/02/2024 às 08h15

Não tão conhecido como Outubro Rosa ou Novembro Azul, mas muito importante, o Fevereiro Laranja é o mês de combate à leucemia. A campanha tem como objetivo alertar sobre a importância da doação de medula.

Em entrevista ao JB Litoral, a Dra Alessandra Comparotto de Menezes, médica hematologista do Instituto de Hematologia e Oncologia de Curitiba, explicou que “a leucemia é uma doença maligna que se caracteriza pela proliferação de células doentes na medula óssea”.

Apenas neste ano, mais de 10 mil casos da doença foram registrados, segundo dados divulgados pelo Instituto Nacional do Câncer (INCA). “As leucemias são divididas em dois grandes grupos: as agudas e as crônicas. Ainda há subdivisões que dependem do tipo de células comprometidas, mielóides ou linfocíticas. As leucemias agudas são as mais graves por serem de evolução mais rápida, sendo encaradas como uma emergência. Já na criança a forma mais comum é a leucemia linfocítica aguda e no adulto a leucemia mielóide aguda e a leucemia linfocítica crônica têm prevalências semelhantes”, explicou a Dra.

De acordo com a Dra. Alessandra é preciso ficar atento aos principais sintomas da leucemia. “Sintomas como: fraqueza, febre, infecções, sangramentos, dor abdominal ou aumento ganglionar são os mais comuns. E por tratar-se de uma doença de medula óssea, que é a fábrica das células do sangue, o primeiro exame que mostra a alteração é o hemograma.”

Dra Alessandra é médica hematologista do Instituto de Hematologia e Oncologia de Curitiba (Foto: Divulgação)

Dentista relata seu drama

O dentista parnanguara, Jorge Marcelo Piccinin, de 39 anos, faz parte do pequeno grupo de adultos que são diagnosticados com a leucemia linfocítica aguda. Ele descobriu a doença depois de muitos exames. “Tudo começou entre julho e agosto de 2015. Comecei a ter febre todos os dias, lá por meia noite. Não era muito alta, 37,8, 38 e com qualquer paracetamol baixava, mas não conseguia dormir bem. No começo achei que podia ser até estresse do trabalho. Fora isso, tinha um mal estar chato, me acompanhava o dia todo e aquilo foi me preocupando”, disse Jorge.

Foi numa consulta, em Curitiba, que o médico descobriu a doença. “Resolvi ir para Curitiba fazer uma consulta com a Dra Alessandra. Ela pediu uma bateria de exames, mas mesmo assim não tinha sintomas claros. A febre persistia e o mal estava cada vez pior. Então, por meados de novembro, a Dra decidiu fazer uma biópsia de medula que finalmente deu o diagnóstico, era Leucemia Linfocítica Aguda (LLA). O tratamento começou dois dias depois. Já fui internado e fiz o implante do cateter pra quimioterapia”.

Segundo a hematologista, “são vários os esquemas de tratamentos e a escolha depende do tipo de leucemia: quimioterapia, terapias alvo ou transplante de medula óssea”.

Cura veio em 2016

Jorge contou que foram oito ciclos de quimioterapia. “Foram oito ciclos com intervalo de 21 dias. Isso durou de novembro de 2015 até setembro de 2016. Entre as quimios, fiz diversas biópsias da medula para avaliar o nível da doença. Tudo medido em porcentagem. Na primeira não mudou muito, foi de 65% para 42%. Na segunda foi para 7%, na terceira para 2,5% no terceiro. Foi um tempo muito ruim, os efeitos colaterais da quimio são muito pesados”.

“Mas, como uma luz que veio do céu, no 4º ciclo parei de ter aquela febre que ainda me acompanhava e como se eu ganhasse uma bateria nova, fiz os outros ciclos foram como um passeio”.

Porém, ainda faltava a parte mais importante, descobrir se ele estava curado. “Em outubro de 2016, houve uma tensão a mais quando tudo acabou, precisava fazer a biópsia e saber se estava curado. Então, em outubro de 2016 veio a cura, mas o caminho ainda era longo porque a minha leucemia é rara em adulto e fácil de ter recidiva (volta) e ai fui indicado para o transplante”, disse Jorge.

Transplante ocorreu em 2017

Por mais difícil que seja encontrar um doador compatível, Jorge encontrou o seu em apenas quatro meses. “Fiz o transplante no dia 30 junho de 2017. Tudo que eu sei do doador é que ele é da Alemanha, tem 27 anos e, na época, pesava 85kg. O processo em si foi como uma transfusão de sangue e durou 35 minutos, mas o pior foi depois. Foram 18 dias de tensão. Esperando a célula crescer e “pegar”. Além do medo de pegar qualquer infecção, pois não tinha nenhuma defesa imunológica”.

Ele passou 45 dias no hospital e 100 dias em casa isolado de tudo e de todos, além dos medicamentos, restrições alimentares e diversos cuidados. Após esse período, começou um acompanhamento que dura até hoje.

O parnanguara explica que atualmente ainda precisa tomar alguns medicamentos diariamente e realizar consultas mensais. “Tomo remédio todo dia, faço consulta todo mês e preciso me cuidar para não pegar infecções e outras doenças”. Ele falou ainda sobre as sequelas que a doença deixou. “Devido à leucemia, eu tive uma DECH (Doença do Enxerto Contra Hospedeiro) na pele, então preciso ficar longe do sol, calor e viver hidratando a pele. Tive também uma lesão na retina no olho esquerdo e uma catarata que vou ter que operar, provavelmente foi por causa das radioterapias. Mas a pior sequela foi uma necrose no fêmur, essa pelos corticoides que tomo desde 2015. Ainda não posso esperar, então tenho que conviver com essa dorzinha chata”.

Jorge diz que renasceu no dia do transplante. (Foto: Divulgação)

“Minha vida mudou completamente, não só a minha, mas acho que a de todos que estiveram juntos nessa viagem. Sempre fui muito ativo, sempre correndo, trabalhando. Hoje eu brigo comigo mesmo para tentar me reconstruir. Se não fosse a Ellen, minha esposa, não teria conseguido passar por esse período. Eu me sinto como um soldado que volta da guerra e não sabe mais o seu lugar nesse mundo”, completou.

A importância do doador de medula

No Brasil, são mais de cinco milhões de doadores e mais de 800 pacientes em busca de um doador não aparentado cadastrados no Registro Nacional de Doadores Voluntários de Medula Óssea (REDOME), segundo dados do Instituto Nacional do Câncer (INCA).

A Dra Alessandra salientou a importância do doador. “Quando há indicação de transplante alogênico (quando as células precursoras da medula provêm de outro doador) nas leucemias, o papel do doador é fundamental para atingir a meta do tratamento, que é a cura. Quanto mais pessoas cadastradas, maior a chance de se achar um doador, lembrando que esse doador pode ser não aparentado, isto é, não ser da família”.