Vereador Edu, ex-chefe e servidor do IAP são condenados por formação de quadrilha


Por Luiza Rampelotti Publicado 15/05/2020 às 17h43 Atualizado 15/02/2024 às 10h11
Edu foi condenado a 7 anos de reclusão, por falsidade ideológica e a perda do mandato e do cargo na Receita Estadual

No início de abril, a 2ª Vara Criminal de Paranaguá emitiu nova condenação referente à Operação Valadares, ação deflagrada em 2012, pelo Ministério Público do Paraná (MPPR), voltada a coibir organização criminosa que atuava na concessão de licenças ambientais falsas a empresas. De acordo com a Justiça, as ilegalidades tinham participação direta de servidores do escritório regional do Instituto Ambiental do Paraná (IAP), além de um vereador e um empresário.

O vereador Eduardo Francisco Costa de Oliveira (PSL), mais conhecido como Edu, ingressou na Câmara Municipal de Paranaguá em 2000 e, desde então, já se reelegeu por quatro mandatos consecutivos. Ele é, também, servidor da Receita Estadual do Paraná. Devido à condenação, deve cumprir sete anos e três meses de reclusão, em regime semiaberto, por falsidade ideológica. Além disso, foi condenado à perda do mandato eletivo na Câmara de Vereadores e do cargo público na Receita Estadual.

O ex-chefe do IAP, Matomi Yasuda, foi sentenciado a 13 anos e três meses de reclusão, em regime inicialmente fechado, pela prática de crime ambiental, falsidade ideológica e corrupção passiva. Foi condenado, também, à pena de quatro anos, quatro meses e 15 dias de detenção, em regime inicial semiaberto, por crimes contra a administração ambiental.

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Condenado a 13 anos de reclusão, ex-chefe do IAP diz que recorrerá da sentença. Ele alega que não fez nada de errado e nada tem a esconder

O então chefe do IAP na Ilha do Mel, Paulo Sérgio Nogueira, foi sentenciado a cinco anos e nove meses de reclusão em regime semiaberto, também por falsidade ideológica e crime contra a administração e à perda da função pública. 

O quarto réu, Samuel Gomes Chagas, servidor do IAP, perdeu o cargo e foi condenado a quatro anos e três meses de reclusão, a ser cumprida inicialmente em regime semiaberto, por crime contra a administração ambiental.

O quinto, o então fiscal do IAP na Ilha do Mel, Djalma Souza Boni, deve cumprir três anos e nove meses de reclusão, em regime aberto, por crime contra a administração ambiental, além de ter perdido a função pública.

O último denunciado, o empresário João dos Reis, proprietário da JRF Transportes, foi sentenciado a quatro anos e quatro meses de reclusão, em regime semiaberto, por corrupção ativa. No entanto, João faleceu no último dia 27 de abril.

Todos os réus podem apresentar recurso às condenações.

Entenda os crimes cometidos

A ação penal, apresentada pelo MPPR, trata da concessão indevida pelos denunciados de licença ambiental para instalação de um estacionamento de caminhões no posto de combustíveis “O Cupim”, em um manguezal, que se trata de área de preservação. Além disso, de autorização ilegal para o desmatamento de terreno com vegetação do Bioma Mata Atlântica para a empresa Andali Operações Industriais Ltda, de liberação irregular de dragagem em canais de trapiches na Ilha do Mel, em benefício da Abaline, e de liberação de licença prévia em favor da empresa JRF Transportes devido à promessa de vantagem indevida.

A denúncia foi apresentada em agosto de 2012 pelo Ministério Público e, inicialmente, diz que Matomi, Edu e Samuel formaram uma quadrilha com o propósito de praticar crimes contra a administração pública, com a finalidade de obter ilegalmente benefícios econômicos e políticos. Procurado pelo JB Litoral, o ex-chefe do IAP afirma que recorrerá da decisão e que as denúncias são equivocadas. “Conforme gráficos da época teve sim aumento na concessão de licenças, mas para pessoas simples que não recebiam suas licenças e os processos ficavam simplesmente parados na instituição. Eu não fiz nada errado e, antes mesmo do inquérito ser feito pelo MP, liberei ao Ministério Público, por meio de uma autorização por escrito, o meu sigilo telefônico e financeiro, pois não tenho nada a esconder”, diz.

Caso “O Cupim”

O MPPR traz alguns fatos para corroborar na acusação. O primeiro deles se trata do “caso posto O Cupim” e afirma que, em agosto de 2011, no escritório regional do IAP em Paranaguá, a empresa formulou requerimento de autorização ambiental para terraplanagem no imóvel. No mesmo mês, Matomi emitiu a autorização ambiental. Entretanto, nos meses seguintes, a Secretaria Municipal de Meio Ambiente e o IBAMA emitiram auto de infração ambiental contra a empresa, afirmando que a área se tratava de manguezal.

Para o órgão, a autorização foi concedida em desacordo com as normas ambientais, pois não poderia ter sido dada antes da concessão de licença prévia e de licença de instalação. Além disso, de acordo com a acusação, a autorização também não poderia ter sido concedida, pois o imóvel “possui passivo ambiental em aberto”. Segundo Matomi, na época da liberação, “não constava nada de irregular no sistema do IAP para que a licença não fosse concedida. E ela foi dada nos limites da lei, pois a área já era limpa, só faltava a terraplanagem”, afirma.

Caso Andali

Outro fato é denominado como “caso Andali” e esclarece que, em janeiro de 2012, a empresa Andali Operações Industriais Ltda foi autuada administrativamente, pelo IAP, por ter realizado “desmate com corte raso de florestas nativas em estágio inicial de bioma Mata Atlântica, fora da área de preservação permanente e reserva legal, sem autorização do órgão ambiental competente”, tendo sido aplicada uma multa à empresa.

De acordo com a denúncia, Samuel teria elaborado e apresentado estudo/laudo ambiental parcialmente falso em processo de licenciamento ambiental de interesse da Andali. Segundo o MPPR, o servidor do IAP se omitiu ao não estabelecer condição de reparação do passivo ambiental da área em decorrência de auto de infração anterior; ao não estabelecer a prévia necessidade de averbação da reserva legal à margem da matrícula; e ao não estabelecer a necessidade de prévio pagamento de multa ambiental.

Por exercer a função de chefia na época, o órgão afirma que Matomi teria o dever funcional de impedir a elaboração do estudo, mas nada fez. A acusação aponta, ainda, que ele tinha conhecimento das irregularidades, pois era coproprietário do imóvel objeto do licenciamento ambiental. Porém, o chefe do IAP concedeu autorização florestal em favor da empresa, desconsiderando a impossibilidade da concessão da autorização sem anterior concessão de licença prévia e licença de instalação e sem a quitação do passivo ambiental em aberto.

Segundo Matomi, “o chefe do IAP não faz laudo, ele recebe de seus subordinados, e no sistema do instituto a licença não sai quando se tem alguma pendência ambiental, ou seja, a multa pode ter sido dada após a liberação, e assim o sistema não irá acusar”. Ele se defende dizendo que “confirmando as datas, é possível ver que nada de irregular foi feito e, após o ocorrido, a empresa conseguiu novamente a licença, pois não tinha nada de irregular. Além disso, a área foi vendida à Andali em 2006, de lá para cá, a responsabilidade era da empresa”, diz.

Ele afirma, ainda, que a respeito do “desmate de floresta nativa”, a área possuía árvores goiabeira e guapezeira, que não são consideradas vegetação nativa.

Caso Abaline

Segundo o MPPR, esse caso aconteceu entre março e abril de 2012, quando o vereador Edu, o ex-chefe do IAP Matomi e o ex-chefe do instituto na Ilha do Mel, Paulo Sérgio, teriam inserido informações falsas em requerimento de autorização ambiental para dragagem na Ilha do Mel, formulado pela Associação dos Barqueiros das Baías do Litoral Norte do Estado do Paraná (ABALINE). De acordo com a denúncia, os envolvidos, a fim de obterem a autorização com maior agilidade, “iniciaram a formalização do procedimento administrativo de autorização ambiental falso, com a inserção da ABALINE como requerente da autorização ambiental”.

O órgão afirma que Paulo teria intervindo ante a associação a fim de que seu representante legal assinasse o requerimento de autorização; e de acordo com a acusação, a assinatura do requerimento, por parte da ABALINE, se deu com o intuito de promover politicamente o vereador Edu. Por isso, todos teriam cometido o crime de falsidade ideológica.

Em abril daquele ano, os três acusados, mais Djalma, então fiscal do IAP na Ilha do Mel, teriam concorrido para a elaboração e apresentação de estudo/laudo ambiental parcialmente enganoso e falso por ação de omissão, na medida em que deixaram de fazer constar no documento que seria necessário prévio estudo ambiental a ser realizado pela própria ABALINE e, em consequência da primeira omissão, eximiram-se quanto ao dever legal de emitir um estudo ambiental técnico a respeito da mencionada pretensão da dragagem.

No mesmo mês, Matomi, em unidade de desígnios com Edu, concedeu autorização à associação, a fim de que se realizassem obras de dragagem nos quatro canais da Ilha do Mel. Ocorre que, conforme consta na denúncia, a autorização foi expedida em desacordo com as normas ambientais, uma vez que não foi observada a exigência de anuência prévia do COLIT, nem a necessidade de estudo ambiental prévio.

Matomi se defende afirmando que a dragagem era pleiteada há anos por toda a população. “A Techint, generosamente, antes que as dragas fossem embora, disse que faria o serviço sem cobrar nada do Estado. O Instituto das Águas, Marinha e IAP fizeram, em conjunto, a licença e as provas estão nos autos. Não foi pedido nada, simplesmente nada, em troca, pois era e é um serviço que tinha que ser feito, pois na maré baixa não entravam barcos médios na ilha por causa do assoreamento. Todas as reuniões sobre o assunto foram realizadas na Techint, no IAP e Marinha, com a presença de todos. Na época, o COLIT não era necessário, veio a ser uns anos depois e, hoje, não é mais”, conta.

Caso JRF

Outro fato imputado a Matomi, vereador Edu, Samuel e João dos Reis trata sobre o “caso JRF”. De acordo com o MPPR, entre abril e maio de 2012, o empresário prometeu vantagem indevida de R$ 25 mil ao chefe do IAP a fim de que ele emitisse licenças prévias e de instalação em desacordo com as normas ambientais em favor da empresa JRF Terminal de Contêineres e Transportes de Cargas Ltda. Em contrapartida à promessa, Matomi Yasuda teria praticado o ato pretendido por João. Em razão disso, o proprietário da empresa teria cometido o crime de corrupção ativa majorada. 

O Ministério Público afirma que Matomi aceitou para si e para o vereador Edu a promessa de vantagem indevida e, por isso, os dois teriam praticado o crime de corrupção passiva majorado.

Entre março e junho de 2012, o então chefe do IAP teria deixado de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental, dada a sua atuação no processo administrativo que originou a licença prévia em favor da empresa, visto que permitiu a realização de terraplanagem com uso de mais de 100 metros cúbicos de terra, proveniente de mangue, e sem qualquer licenciamento ambiental.

De acordo com Matomi, nenhuma das denúncias procede. “Nunca pedi nada e, que eu saiba, não existe prova material e nem verbal, pois nunca foi pedido nada, apenas fiz o meu trabalho. A JRF tem até hoje sua licença, pois até a Polícia Ambiental foi no local e não achou nada de irregular antes e depois do ocorrido”, conclui.

Vereador foi procurado

O JB Litoral também procurou o vereador Edu para que se manifestasse a respeito da condenação. No entanto, ele não foi encontrado por meio de nenhum dos telefones informados e não respondeu à tentativa de contato, realizada por meio de mensagens enviadas pela equipe de reportagem.

Quanto aos demais envolvidos nos fatos, devido ao curto prazo entre a produção do material e impressão do jornal, não foi possível entrar em contato com todos. Em razão disso, o JB Litoral deixa o espaço aberto, durante esta semana, para que Paulo Sérgio Nogueira, Samuel Gomes Chagas, Djalma Souza Boni e um representante da empresa JRF se manifestem. Os interessados devem contatar a equipe por meio do telefone (41) 3425-7324 ou do e-mail jornalismo@jblitoral.com.br.