Desmatamento em área de suposta grilagem do Embocuí está sendo investigada


Por Katia Brembatti Publicado 09/08/2021 às 17h13 Atualizado 04/03/2024 às 15h11

Uma área nobre, na entrada de Paranaguá, é alvo de suspeita de práticas criminais, que está sob investigação do Ministério Público do Paraná (MPPR). À esquerda da BR-277, na região do Embocuí, nas proximidades da chamada Estrada Velha e da Granelmar, há grandes terrenos que estão no centro de um conflito envolvendo empresas e órgãos públicos. A partir de uma denúncia, apresentada pela TKX Atividades Imobiliárias, o promotor Pedro Marco Brandão Carvalho abriu um procedimento para apurar o caso e solicitou que fosse instaurado inquérito policial.

Um dos focos é a suspeita de desmatamento. No início do ano passado, relatos de que a mata nativa estava sendo cortada chegaram a autoridades. Algumas irregularidades foram constatadas, mas com a alegação de restrições provocadas pela Covid-19, algumas vistorias deixaram de ser feitas por servidores públicos. Alguns fiscais destacaram que há na região áreas de supressão antigas, já consolidadas, e ainda outros tipos de alteração, como aterramentos, feitos há bastante tempo. Equipamentos, aparentemente sem uso, também foram encontrados.

Ao menos uma área de vegetação com 20 mil metros quadrados, equivalente a dois campos de futebol, foi desmatada. A situação gerou um auto de infração lavrado pela Secretaria Municipal de Meio Ambiente. A questão ainda é passível de contestação na esfera administrativa, mas gerará uma multa de R$ 10 mil, caso seja confirmada. Outras duas suspeitas também levaram a prefeitura a autuar empresas, acusadas de atividades irregulares na região, resultando em R$ 25,5 mil em multas, ainda em grau de recurso.


Andamento do inquérito


O Ministério Público, em resposta a um pedido de informações feito pelo JB Litoral, respondeu que o caso ainda está em fase de investigação, no aguardo do cumprimento de diligências. Além das suspeitas de desmatamento, também está sendo apurada a suposta atuação de grileiros na região, que estariam loteando os terrenos e promovendo, ainda, as retiradas irregulares de mata nativa. Um dos investigados é João Aristides Ferreira, conhecido como João Catarina.

A promotoria destacou que o objetivo, caso sejam confirmadas as ilicitudes, é inibir a continuidade de ocupações irregulares e danos ambientais; estimular a fiscalização ambiental; acompanhar a adoção de medidas administrativas e criminais; e a recuperação dos danos ambientais causados. Em despacho do dia 29 de junho, o promotor voltou a cobrar um posicionamento do Instituto Água e Terra (IAT), órgão ambiental do governo paranaense, mas ainda não recebeu resposta. Questionado pela reportagem do JB Litoral, o órgão ambiental não se manifestou sobre a falta do parecer, e limitou-se a afirmar que emitiu um auto de infração, no dia 2 de agosto, sobre atividades irregulares, com multa de R$ 4 mil e embargo da área.


Empresas se defendem e apontam erros que teriam sido cometidos


Os focos de questionamentos na região do Embocuí envolvem várias empresas, que foram procuradas pelo JB Litoral para se manifestar a respeito do assunto. A TKX alega que arrematou a área, pertencente ao Banco Rural, em um leilão, e ainda está em disputa judicial para tomar posse, motivo pelo qual prefere não comentar o assunto.

Para entender o caso, é importante explicar que propriedade é o direito a um bem e posse é a situação de fato, o uso. Assim, uma pessoa pode ter a propriedade e não ter a posse e a situação inversa também acontece, quando alguém tem a posse, mas não tem a propriedade. Em caso de usucapião, por exemplo, um posseiro tenta na Justiça garantir o direito à propriedade – ou seja, ao reconhecimento legal de que é dono da área. Já uma pessoa pode ter a documentação referente a um bem e não estar conseguindo, por algum motivo, usar o patrimônio.

O advogado Gabriel Galli representa várias empresas que possuem negócios na região do Embocuí, incluindo João Aristides Ferreira e familiares dele. Atualmente, João Catarina, como é conhecido, estaria aposentado, mas teve atuação relacionada a contêineres. Galli encaminhou uma nota de esclarecimento à reportagem, destacando que haveria uma “evidente confusão” entre duas áreas: uma é fruto de usucapião extrajudicial, diferente do terreno pleiteado pela TKX, e outra que seria dos filhos, essa sim em disputa com a TKX, mas que, de acordo com a nota, estaria respaldada por um instrumento legal de direitos possessórios.

A família Ferreira alega ainda que, em março do ano passado, houve uma tentativa forçada de invasão na área que está sendo disputada. Foi feito o registro de um Boletim de Ocorrência (B.O.) e também se buscou o Judiciário, que concedeu uma liminar de interdito proibitório.

Sobre os autos de infração por suposto desmatamento, a nota informa que a situação está sendo questionada na prefeitura, em recurso, e que “a verdade dos fatos prevalecerá e ficará demonstrada a inexistência de qualquer dano”.


Mais posicionamentos


A reportagem do JB Litoral falou com os empresários responsáveis pelas empresas Transmarine Soluções Logísticas e Simas Incorporadora, autuadas pela prefeitura por supostas irregularidades na região do Embocuí. Ambos contestaram os autos de infração da prefeitura e alegaram que se trata de enganos. Além de notas de esclarecimento, encaminhadas por Galli, também comentaram o caso.

Osmar Munhoz Junior, dono da Transmarine, afirma que as coordenadas indicadas nos autos de infração são diferentes das da área arrendada pela empresa, indicando que poderia ter acontecido um equívoco. Ele destaca, inclusive, que tem alvará de construção e de funcionamento, emitidos pela prefeitura, o que demostraria a regularidade da atuação, segundo o empresário. Contou que pretende fazer um pátio, que se encontra em fase de elaboração, sem definir se será para contêineres, caminhões ou armazenagem, e se colocou à disposição para qualquer esclarecimento.

A nota encaminhada por Galli, representante jurídico da Transmarine, destaca que a empresa é apenas arrendatária, tendo alugado o terreno mediante contrato formal. Além disso, pontua que se trata de uma área diferente da pleiteada pela TKX. O advogado comunica que a Transmarine participou de reunião do conselho municipal de meio ambiente, no dia 5 de agosto, tendo conquistado licença ambiental municipal para a obra. A nota ainda enfatiza que nenhuma atividade empresarial está sendo realizada na área, aguardando os procedimentos para pedir a licença ambiental ao IAT.

Já Leandro Simas, da Simas Incorporadora, atendeu a reportagem negando qualquer ação ilícita na região, afirmando que a situação estava regularizada. A nota de esclarecimento enviada por Galli afirma que há posse da área há mais de 20 anos e ação de usucapião em tramitação judicial. Também declara que não houve qualquer supressão recente de vegetação nativa. E que teve a autorização ambiental para a retirada de uma área de pinus. Por esse motivo, contesta o auto de infração recebido.