Mãe de Kameron detalha comportamento do marido e da filha “pedi a Deus para me mostrar se algo errado estava acontecendo”


Por Redação Publicado 29/04/2023 às 17h40 Atualizado 18/02/2024 às 10h25

Casa trancada durante toda a tarde, mesmo em dias de muito calor, com um homem de 33 anos no interior, a filha de 8 meses e uma criança de 11 anos, enteada dele, que era impedida de brincar fora da residência com outras crianças da comunidade. Um padrasto possessivo e que gritava com essa enteada, e uma mãe que também a repreendia aos berros. Esses foram os relatos de vizinhos de Givanildo Rodrigues Maria à polícia.

Foram também as informações dos vizinhos que ajudaram a polícia a começar a desvendar o caso, cujo desfecho trágico foi o assassinato de Kameron Odila Gouvêa Osolinski, de 11 anos. A menina havia desaparecido na quarta-feira (26), e o corpo foi encontrado na quinta-feira (27), graças à pista seguida pelos vizinhos, que viram Givanildo saindo de carro, em alta velocidade, por volta das 14h30 do dia anterior, em direção ao Mirante, local onde o corpo foi encontrado parcialmente encoberto por folhas, apenas de calcinha.

Depois disso, com o passo a passo do caso sendo noticiado pelo JB Litoral, o padrasto foi preso e levado para Antonina, onde teria afirmado que a criança foi para a casa de uma amiga fazer trabalho de escola. O fato foi negado pela família dessa amiga, onde Kameron já não ia há pelo menos dois meses.

Na delegacia, Givanildo foi ouvido pelo delegado Isaías Fernandes Machado. De lá, foi transferido para a Cadeia Pública de Paranaguá, de onde saiu com alvará de soltura na noite de sexta (28). No entanto, neste sábado (29) pela manhã, ele chamou a polícia e pediu para voltar para a prisão, confessando que havia matado a menina.

Já na delegacia, em depoimento ao delegado Nilson Diniz, ele declarou que estuprou Kameron, a matou e ocultou o corpo em seguida. Ele afirmou, nessa nova declaração, que havia sido a primeira vez que cometeu o ato com a criança, que resistiu, e ele a asfixiou para conseguir consumar a relação sexual. Ao perceber que havia matado a enteada, colocou o corpo no carro e o escondeu na área de mata.

Depois disso, Polícia Civil e Ministério público pediram que a Justiça decretasse a prisão preventiva de Givanildo, na tarde deste sábado (29).

VÁRIOS SINAIS


Muitas marcas de pegadas de sapato sujo de barro e mato. Foi assim que a mãe de Kameron, a professora Mayrah Merilin Dorigon Gouvea, 30 anos, encontrou a sala de casa na quarta-feira (26), ao voltar da escola onde trabalha. Ela afirmou, em depoimento à polícia, que não desconfiou de nada quando chegou em casa naquele dia, que foi o da morte da filha mais velha.

Mayrah disse ao delegado de Antonina que apenas reclamou com o marido devido ao ambiente estar sujo, mas limpou a sala para que a filha do casal, de apenas oito meses, pudesse ficar no local. A professora foi ouvida na delegacia de Antonina já na madrugada de sexta-feira (28), após o corpo de Kameron ser localizado.

O JB Litoral teve acesso ao depoimento e revela detalhes do que contou a mãe da criança.  

Mayrah afirmou que ela e Givanildo se conheceram há 15 anos, ela com 16 e ele com 19, que queriam namorar, mas sua mãe não deixou. O casal se reencontrou depois que ambos já tinham filhos e estavam separados, quando começaram a namorar e a morar juntos, há dois anos e sete meses, e têm uma bebê de oito meses.

A professora detalhou que a rotina dela é trabalhar das 13h às 17h, em escola perto de casa, no mesmo bairro, em Ipanema do Norte. Kameron estudava pela manhã e chegava em casa minutos antes da mãe ir trabalhar. Ela cuidava da irmãzinha enquanto o padrasto levava a mãe para a escola, de carro. Depois, Kameron ficava em casa durante a tarde, com a bebê e o padrasto.

COMPORTAMENTO ESTRANHO


Mayrah afirmou ao delegado que, no dia em que a filha desapareceu, ela notou que a menina estava distante. A mãe teria dito que a amava, mas percebeu um comportamento estranho. Ela também afirmou que Givanildo tinha ciúmes possessivos dela (esposa) e que tinha brincadeiras brutas com a filha.

Sobre o comportamento do marido com Kameron, a professora contou que Givanildo estava abraçando muito forte a filha nos últimos dias, e que a menina pedia para parar, reclamava de dor.

Foi o próprio delegado que contou para Mayrah que os vizinhos relataram que ouviram barulho na casa por volta das 14h30 e que, em seguida, viram Givanildo saindo com o carro em direção ao Mirante, em velocidade alta.

“O corpo foi achado semienterrado, com folhas por cima e marcações ao lado, o que indica que o assassino voltaria para enterrá-la. Ela estava descalça e só de lingerie. O legista já constatou que ela foi violentada sexualmente, o lugar em que ela foi encontrada é muito grande, uma criança não conseguiria descer sozinha”, disse o delegado Isaías.

No momento em que a mãe ouve do delegado que Kameron havia sido violentada, ela começa a chorar, mas pede que o delegado continue.

SINAIS SÓ PERCEBIDOS DEPOIS DA TRAGÉDIA


A mãe da criança assassinada alega que percebeu várias coisas estranhas nos dias que antecederam o crime, mas só relacionou à possibilidade de o marido ter cometido o ato depois que a filha já estava desaparecida. Ela comentou que, diante da situação, ligou os sinais: como o fato de Givanildo não ter mais mantido relações com ela; ter achado um pano em que ele se limpava após as relações do casal atrás do sofá, sendo que eles não haviam tido relação nos últimos dias; o fato do marido não ter levado Kameron, mesmo com o pedido da mãe, para ser consultada por uma médica que estava atendendo na comunidade, devido à filha ter fluxo menstrual muito intenso e, instantes antes de o corpo ser encontrado, no momento em que Mayrah pediu ao marido para que orassem pelo reaparecimento da criança, ele não conseguia falar o nome de Kameron.

Mas tudo isso eu só notei essa semana. Eu pedi para Deus me mostrar se alguma coisa errada estava acontecendo, porque notei que ele esfriou comigo e que minha filha estava estranha”, disse Mayrah, em depoimento.  

AS LIGAÇÕES

O delegado de Antonina também questionou o fato de Mayrah ter dito a vizinhos que havia ligado para o celular da filha, por volta das 18h de quarta-feira (26) e ela ter atendido. A professora conta que ligou, pois a filha não havia voltado para casa, e que teve a impressão de que a ligação havia sido atendida, com barulho de respiração. Mas alega que tanto o registro dessa chamada quanto a que fez para um soldado da PM sumiram do aparelho, e que não foi ela quem apagou. O aparelho celular é dela, mas estava sendo usado em conjunto com Givanildo, depois que o dele quebrou.

KAMERON DORMIA NA SALA


Mayrah também revelou que Givanildo ficava falando para Kameron que havia pessoas rodeando a casa e com histórias de zumbi, provocando pânico na criança, que passou a dormir no sofá da sala com medo de ir para o quarto.


OMISSÃO?


Nos minutos finais do depoimento, que durou 46 minutos no total, o delegado convoca um investigador que conversou com vários vizinhos da família a participar da oitiva. Ele conta o que os vizinhos disseram sobre o comportamento de Givanildo quando ficava à tarde com a enteada, com a casa totalmente trancada.

A professora nega que soubesse que a casa ficava trancada e o investigador questiona o motivo das brigas e xingamentos relatados pelos vizinhos, os quais contaram que ambos, Mayrah e Givanildo, não teriam paciência com Kameron e que ele tinha ciúme possessivo da menina.

Ela era minha filha, ninguém sabe o que estou sentindo. Eu a criei praticamente sozinha, mas estava muito rebelde, não me obedecia, por isso eu era mais dura com ela, mas nunca agredi minha filha. Eu mandava lavar uma louça ou secar e ela não me obedecia”, disse a professora.

O delegado finaliza com duas perguntas à mãe da vítima: se ela sabia que o marido havia matado um homem antes e que ele era violento com as ex-companheiras. “Sabia, mas ele e a família dele negaram”, respondeu Mayrah.

A outra pergunta foi se existia alguma possibilidade de a professora estar sendo conivente com Givanildo. “Nunca, doutor, eu só comecei a ficar desconfiada mais na hora da oração, porque ele não falou o nome dela. Comecei a ligar os fatos”, alegou a professora.

“CONSCIÊNCIA LIMPA”


Givanildo Rodrigues Maria chegou a negar tudo no primeiro depoimento prestado ainda em Antonina, na madrugada de sexta-feira (28), após o corpo da enteada ser encontrado. O homem foi ouvido depois de vários vizinhos e a companheira dele, mãe da criança, também prestar depoimento à polícia.

Sobre o homicídio ao qual respondeu anos atrás, ele relata que matou uma pessoa quando tinha 16 anos, para “defender o pai”.

Na ocasião, cerca de 36 horas antes de confessar o estupro, o assassinato e a ocultação de cadáver, Givanildo negou tudo e disse que estava com a “consciência limpa”. Ainda assim, o delegado de Antonina autuou o homem por homicídio qualificado e ocultação de cadáver.