Do campo para cidade: Agricultura familiar representa quase 22% dos produtos consumidos na rede municipal de ensino de Paranaguá


Por Amanda Batista Publicado 04/08/2023 às 14h23 Atualizado 18/02/2024 às 19h15

A agricultura familiar é uma das principais responsáveis pelo abastecimento do mercado interno do país com alimentos saudáveis. Ela une a preservação dos recursos ambientais e promove o desenvolvimento sustentável, de acordo com o Anuário Estatístico da Agricultura Familiar, publicado na última terça-feira (27).

Por lei, ela deve fornecer 30% dos alimentos destinados à merenda escolar, através do Programa Nacional de Alimentação Escolar.

Em Paranaguá, a produção que chega à cozinha da rede municipal de ensino começa nas colônias, é lá que o produtor rural Felipe Zanelato Teriano planta couve, alface, brócolis, agrião, entre uma série de outras hortaliças. Ele é um dos 27 produtores ligados à Associação dos Produtores Rurais do Município de Paranaguá (Aprumpar) que, por meio do Edital de Chamada Pública nº 13/2022, distribui hortaliças, leguminosas e vegetais para cerca de 15 mil alunos.

A produção focada em hortaliças não acontece por acaso. Durante o inverno, a região produz uma grande quantidade de folhosas, que encontram no clima frio e seco um ambiente propício ao crescimento. Já no verão, é a vez do cultivo de verduras, raízes e grãos como milho verde, berinjela, quiabo e mandioca.

O agricultor Felipe Zanelato fala sobre a produção e os desafios da agricultura familiar em Paranaguá. Foto: Secretaria de Educação.


É a estação e as condições climáticas que determinam o que os produtores vão entregar ao município, explica Felipe, agricultor que desenvolve a atividade há 29 anos. “Em algumas regiões do estado, eles conseguem produzir hortaliças o ano inteiro, mas nossa plantação aqui é cíclica. Procuramos nos adequar ao calendário do programa, porém, tem momentos que não tem jeito, basta um vendaval para estragar a produção”, diz Felipe.

Através da parceria com a Secretaria de Agricultura, semanalmente, os agricultores colhem o plantio que é levado à sede da Aprumpar, na Colônia Maria Luiza, onde os alimentos são selecionados pela equipe administrativa da associação, liderada pela auxiliar Vânia Alves Antônio Franco.

Quando as verduras e hortaliças chegam aqui, temos que pesar para saber se está de acordo com o que foi solicitado. Toda terça-feira etiquetamos as cestas e encaminhamos conforme o cronograma, daí o caminhão da Prefeitura faz a distribuição”, explica Vânia.

Graças à parceria com a Secretaria, a associação consegue fazer a entrega para as 81 instituições de ensino do município, e os alimentos frescos, colhidos na terça-feira, são servidos ao longo da semana para os alunos.

Alimentos são etiquetados e distribuídos para todas as instituições de ensino do município. Foto: Secretaria de Educação.

Produção de pães e bolos


A aquisição de produtos da agricultura familiar não se limita apenas à produção agrícola. Aurelizia Coelho Marques, a Dona Dida, padeira da Colônia São Luiz, é uma das associadas que participam do edital por meio da fabricação de pães e bolos. Em apenas um dia, ela produz 115 pães para o ensino fundamental da rede municipal.

Dedicada, a senhora de 66 anos procura sempre deixar a cozinha limpa para a preparação. Com o apoio da ajudante Maria do Rosario Lima, ela faz pães de 1kg que são fatiados, embalados e rotulados ali mesmo.

Dona Dida fala sobre o processo de produção, que começa cedinho, às 4h da manhã, e comemora o bom tempo que faz os pães crescerem mais rápido. “A gente bate a massa equivalente a 18 pães na máquina, depois tem que deixar descansar até crescer bem. Hoje, como está quente, é bem mais rápido. Depois que crescem, a gente assa, fatia e embala aqui mesmo, com o rótulo da associação”, diz a produtora.

A fabricação acontece de acordo com o cronograma de entrega. Na segunda-feira (24), os pães frescos e quentinhos já estavam prontos para serem levados à associação e distribuídos para os alunos no dia seguinte.

Da esquerda para direita: dona Maria e dona Dida fazem pães na Colônia São Luiz. Foto: Secretaria de Educação.

Não adianta fazer só pensando no que vai ganhar. Se não fizer as coisas com amor, não adianta. Dizem que quando não tem amor o bolo fica embatumado e os meus são sempre fofinhos”, diz Dona Dida.

A dedicação é tamanha, que ela deixou de visitar a família, no Nordeste, para cumprir o compromisso com a educação no município. “Meu irmão viajou e me chamou para ir junto porque temos família lá, mas não fui porque tinha esse compromisso. Sabia que nessa semana o pessoal precisaria que eu fizesse os pães e a gente tem essa responsabilidade com as crianças”, afirma.

Alimentação saudável é prioridade


A nutricionista do Departamento de Alimentação Escolar da Secretaria de Educação, Camile Cosentino de Carvalho, conta que a qualidade e variedade do cardápio das crianças é a prioridade no município. É por meio do cardápio desenvolvido pela equipe de nutrição que os alunos têm acesso a uma dieta balanceada.

É pela merenda que muitas crianças podem consumir uma dieta equilibrada. Nosso cardápio oferece uma variedade de alimentos que, infelizmente, algumas delas não teriam acesso em casa”, explica.

Outra nutricionista da Secretaria de Educação, Lígia Faria Vicente, também destaca a importância do investimento na formação dos hábitos alimentares dos alunos. “É ali que se formam os hábitos alimentares que eles levarão para a vida, além de ser uma importante fonte de nutrientes, vitaminas e minerais”, ressalta.

Além de garantir alimentos frescos e variados para as crianças, o Programa Nacional de Alimentação Escolar incentiva os agricultores locais a darem continuidade às atividades no campo. O último edital, lançado determina que a Prefeitura tenha um gasto de R$ 407.621,63 com aquisição de gêneros alimentícios da agricultura familiar. A venda é até R$ 40 mil para cada produtor que tiver uma Declaração de Aptidão ao Pronaf (DAP), o que representa uma fonte de renda segura para os pequenos produtores rurais.

Caminhão da Prefeitura ajuda na distribuição semanal. Foto: Secretaria de Educação.


Demanda não é suprida


Apesar dos esforços dos associados, a baixa variedade e quantidade das culturas do Litoral e o pequeno número de agricultores participantes da chamada pública são as principais razões que levam a equipe do Departamento de Alimentação Escolar a buscar associações fora da região para atender integralmente à rede municipal.

Segundo a nutricionista Lígia Faria Vicente, a Aprumpar tem prioridade em todas as seleções. Porém, quando ela não consegue atender a demanda, outras associações do Litoral e do estado podem participar.

É mais barato adquirir produtos da agricultura familiar produzidos aqui mesmo no município. Quando precisamos buscar de outras regiões, existe um problema de logística, porque não temos uma Central de Captação, então os aprovados precisam distribuir de escola em escola, o que gera um alto custo e eleva o tempo de distribuição”, explica Lígia.

A nutricionista do Departamento de Alimentação Escolar, Patrícia Santos Garcia, conta que devido a essas limitações, o município tem dificuldade para conseguiu alcançar os 30% de produtos da agricultura familiar determinados pela lei. Devido às limitações, o departamento adquiri produtos de outras associações participantes da chamada pública. São elas: Associação de Pequenos Produtores Rurais e Artesanais de Antonina (Aspram) e a Associação dos Agricultores Familiares Rurais, Fruticultores, Agricultores Faxinalenses, Agroindustriais Familiares e Agricultores Orgânicos (Agrifam), de São Mateus do Sul (PR).

A dificuldade em atingir a meta é por conta da alta demanda do município. Neste ano, estamos com uma programação com três associações do Paraná. Se tudo der certo, vamos chegar a 22% de produtos da agricultura familiar. Precisamos atingir o maior índice possível porque, a cada ano que passa, ao não atingir o percentual, podemos ter a diminuição dos recursos do FNDE”, explica Patrícia.

Cooperativa pode ser solução


Como a Aprumpar é uma associação, os produtores não podem inscrever agricultores de outras regiões, também não podem comprar produtos e repassar ao município. Porém, a entidade já deu início ao processo jurídico para se tornar cooperativa. Assim, ela poderá comprar da agricultura familiar de outros locais e repassar para a Educação, que atingirá o coeficiente mínimo para manter os recursos advindos da União.

O agricultor Felipe Zanelato explica que outro benefício será a expansão das culturas dentro do município, já que cooperativas podem buscar equipamentos, apoio técnico e maquinário junto ao Poder Público. “Não conseguimos fazer tudo sozinhos, precisamos de parceiros, de outras famílias. Para dar conta, precisávamos de maquinário agrícola, mas como é muito caro, só vamos conseguir por meio da cooperativa, o que trará benefícios para todos os 55 associados, não só aqueles que contribuem com a merenda escolar”, conclui.