No litoral, residências em áreas regulamentadas não têm acesso à rede coletora de esgoto; caso está na justiça


Por Redação Publicado 27/05/2021 às 11h12 Atualizado 16/02/2024 às 03h30

Por Karla Brook

O direito do cidadão ao saneamento básico, além da água potável, é um dos Direitos Sociais previsto na Constituição Federal, porém, hoje, a realidade mostra que, nem todas as residências das cidades balneárias do litoral paranaense contam com rede coletora de esgoto.

Municípios como Guaratuba, Matinhos e Pontal do Paraná, atendidos pela Companhia de Saneamento do Paraná (Sanepar), ainda carecem de saneamento básico, principalmente quando se trata dos balneários mais distantes da região central.

Embora as praias do Paraná apresentem índices acima da média nacional, quando o assunto é a balneabilidade da água, de acordo com o Instituto Água e Terra (IAT), elas ainda necessitam de atenção e investimentos na coleta e tratamento dos detritos.

Em Matinhos, 90% das residências têm rede de esgoto e em Guaratuba, 84% das casas do município são atendidas. Já em Pontal do Paraná, apenas 71% das habitações contam com serviço de saneamento básico.

Esses dados são atualizados e fornecidos ao JB Litoral pela própria Sanepar.

A casa do comissário de bordo, Diogo Miranda, de 36 anos, está entre os 10% da cidade de Matinhos, que não têm os dejetos recolhidos e tratados. “Ao meu ver, se não tem como construir uma rede de esgoto em um local, ele não deveria ser considerado habitável”, foi sua resposta ao ser informado pela Sanepar, que não há viabilidade para instalação do referido sistema na rua onde mora, no balneário Praia Grande.

Diogo e seu companheiro são uma das tantas famílias que, devido às mudanças no estilo de vida, por conta da pandemia de Covid-19, resolveram sair da capital, Curitiba, e morar na praia. O que ele não esperava, ao comprar sua residência, é que, mesmo estando regulamentada pela prefeitura, não possui sistema coletor.

“Eu sei que a situação de saneamento básico é precária em moradias irregulares, mas nunca imaginei que isso aconteceria em imóvel normalizado. Compramos uma casa linda, por sinal, e, com o passar dos dias, na hora de lavar louça, usar os dois chuveiros ao mesmo tempo e lavar roupa, percebemos que a água do esgoto volta no quintal”, contou Diogo.


FOSSAS SÉPTICAS

Ao identificar o problema, o novo morador da Avenida Praia Grande questionou o construtor da casa, o qual lhe disse que a água volta da fossa séptica para o quintal, devido à falta de rede nas moradias da região. “Depois que fiquei sabendo disso, conversei com os vizinhos e, segundo eles, só tem rede de esgoto até metade da rua e esse é um problema antigo que eles enfrentam”, acrescentou.

A reportagem identificou outros moradores que sofrem a mesma situação que Diogo, sem sistema coletor, mesmo tendo casas regulamentadas. No entanto, desanimados com o caso, preferiram não relatar suas histórias.

Dentre os problemas de saúde pública, causadas pela ausência de drenagem, está o escoamento da água pluvial, que entope as tubulações, algo recorrente no litoral. Com a falta de coleta de maneira correta, as fossas ficam entulhadas, transbordam e trazem os dejetos sólidos, junto à água da chuva, da tubulação para as residências. Além do transtorno e do mau cheiro aos moradores, essa situação pode levar à transmissão de diversas doenças.

CASO DE JUSTIÇA

Depois de vários contatos com a Sanepar, solicitando o ligamento nas residências, Diogo e os vizinhos receberam, como resposta, que não é possível fazer a coleta e tratamento na região, mesmo que as residências tenham a tubulação necessária para instalação. Sem uma justificativa para essa afirmação da estatal, ele resolveu recorrer à justiça em busca de seus direitos de saneamento básico.

O morador abriu um processo contra a Prefeitura e a Sanepar e fez, ainda, uma denúncia ao Ministério Público do Paraná (MPPR), que abriu a Notícia de Fato nº 0090.21.000214-4.

O processo ajuizado pede urgência e obrigação de fazer, tanto pela concessionária do Estado, quanto pela prefeitura de Matinhos, a instalação de tal rede na Avenida Praia Grande.

A promotora de Justiça, Carolina Dias Aidar de Oliveira, respondeu à Notícia de Fato e alegou que, por não haver “indícios de lesão ou ameaça de lesão a bem jurídico tutelado pelo Ministério Público”, o documento foi arquivado. Ela destacou, ainda, que a 2ª Promotoria de Justiça de Matinhos faz acompanhamento permanente das políticas públicas de saneamento básico, de acordo com o planejamento de expansão da Sanepar.

SANEPAR NÃO EXPLICA

O JB Litoral procurou a Sanepar para que esclarecesse os motivos de não ser possível a instalação do referido procedimento em toda a Avenida Praia Grande. No entanto, sem explicar, a Companhia respondeu confirmando que o caso está na justiça e responderá apenas via judicial. Além disso, salientou que toda a coleta no litoral do Paraná é tratada.

De acordo com a prefeitura, não há rede de esgoto na Avenida Praia Grande, uma vez que não foi feito nenhum projeto, por parte do Governo do Estado, para as residências que estão localizadas depois do canal, no balneário Praia Grande. Informou, ainda, que a solicitação de implantação da drenagem deve ser feita diretamente à Sanepar. Feito isso, conforme o número de moradores interessados na coleta, será elaborado um projeto e estudada a viabilidade para sua instalação.

OBRAS NO LITORAL

Esse problema, enfrentado pelos moradores na Avenida Praia Grande, faz parte da realidade de muitos outros moradores de Matinhos, Guaratuba e Pontal do Paraná. Contudo, de acordo com a Sanepar, obras que já estão em execução tendem a melhorar o cenário nos três municípios.

Com um investimento de R$1,7 milhão, estão sendo realizadas obras para implantação de 8.500 metros de sistema coletor em Matinhos, que deve elevar o índice do atendimento de 90% para 92%. Isso significa que mais 424 famílias terão acesso ao serviço.

Em Pontal do Paraná, o investimento é de R$2,2 milhões e deve beneficiar mais 710 famílias. Estão em execução 14.200 metros de rede, o que deve resultar no aumento do índice de atendimento no município de 71% para 74%. Em Guaratuba, não há, no momento, obras de expansão para escoamento de detritos.

Diogo, assim como vários outros moradores das praias paranaenses, aguardam mais do que uma justificativa do caso. “Eu não entendo essa falta de organização antes de urbanizar um local. Só espero que a gente consiga o que nos é garantido pela constituição, o acesso ao saneamento básico, e o mais rápido possível”, desabafou.