Jairton Rocha, o eterno coxa-branca: um exemplo de superação e amor pelo futebol
No domingo (14), a rivalidade foi deixada de lado no Athletiba, durante a disputa clássica realizada no Estádio Joaquim Américo Guimarães, a famosa Arena da Baixada, entre o Club Athletico Paranaense e o Coritiba Foot Ball Club. O jogo da 6ª rodada do Brasileirão ficou marcado no coração das torcidas após o Furacão convidar o torcedor Jairton Rocha, símbolo do Coxa, para assistir à partida do camarote athleticano.
Seu Jairton, um morador de Guaratuba de 55 anos, que desde 2011 acompanhou mais de uma centena de jogos do Coxa dentro e fora de Curitiba, tem uma história de vida que se confunde com a do próprio time.
Desde a infância, ele foi influenciado por seu pai, um verdadeiro apaixonado pelo clube. Seu Miguel da Rocha dizia com orgulho que, um dia, o filho se tornaria goleiro do Coxa; e não era por vaidade ou presunção, aos 12 anos, Jairton já tinha um time com amigos do bairro e não passava um dia sem falar de futebol.
“Meu saudoso pai torceu pelo Coritiba a vida inteira. Ele era muito apaixonado, e eu cresci acompanhando-o e escutando os jogos pelo rádio. Quando tinha uns 8 anos, na inocência de criança, lembro de ter perguntado: ‘Pai, quem é esse tal de Coritiba?’, no que ele prontamente me respondeu: ‘É um time de futebol, filho, o maior do Paraná!’”, lembra o torcedor.
No dia em que entendeu sobre o que o pai tanto comentava, a paixão pelo time só cresceu e Seu Jairton se tornou um verdadeiro e eterno coxa-branca.
A interrupção de um sonho
O amor pelo esporte corria em suas veias, era o Coxa no peito e a bola no pé. Mas, no início da adolescência, entre um jogo e outro, Jairton sentia uma dor inexplicável no quadril. Ia para escola, jogava, corria, brincava e a dor permanecia. Não sabia a razão, só sentia aquele incômodo persistente que travava sua perna esquerda quando chegava o frio do inverno.
“Quando minha perna doía muito, minha família me levava para o Hospital de Paranaguá. Fomos três vezes lá, nessa terceira, o médico disse que teria que me engessar porque um osso estava nascendo deformado. Colocaram gesso da ponta do pé até meu tórax por causa de uma dorzinha que a gente nem sabia o que era”, conta Jairton.
Após passar quase dois meses com mais da metade do corpo imobilizado, ele viu sua vida e os sonhos do pai se perderem junto com a vitalidade das suas pernas. Quando finalmente tiraram o gesso, as articulações dos joelhos, pés e quadris não mais funcionavam, estavam enrijecidas e os músculos atrofiados.
A mãe, Neide Rocha, ainda buscou encaminhamento médico e um meio de transporte para tentar levar o filho para a fisioterapia em Curitiba, mas, apesar dos esforços, a família morava a 130 km da capital e não conseguia arcar com as despesas. Foi então que a atrofia muscular se tornou uma sentença na vida de Jairton. Na época, a mãe sofreu a dor da perda dos movimentos do filho, e seu Miguel a morte de um sonho.
O episódio, que marcaria para sempre a vida do guaratubano, aconteceu em 1981. Também foi naquele ano que o adolescente perdeu o pai para um acidente vascular cerebral (AVC), causado por uma Embolia Cerebral.
Um caso de superação
A condição imposta pela perda dos movimentos trouxe dificuldades para Jairton e o deixou preso a um leito, mas ela não o impediu de viver uma vida plena, construir uma família e passar o legado de paixão pelo Coritiba para seus três filhos, Maikelly, Jairton Júnior e Igor do Rosário.
Hoje, graças ao apoio da esposa Solange (52), com quem é casado há 33 anos, ele acompanha os jogos dentro e fora do estado, e já participou de momentos marcantes do Coritiba, como nas duas partidas dramáticas contra o Botafogo e o São Paulo no Brasileirão de 2013, quando o time esteve por um fio de ser rebaixado para a série B.
“Lembro como se fosse hoje, porque foram partidas inesquecíveis. Eles precisavam ganhar e a primeira partida seria contra o Botafogo. Daí me telefonaram para ir lá no treino motivar os atletas. Não sei se foi pelo meu discurso ou pela vontade de fugir do rebaixamento, mas o time conseguiu vencer por 2×1, e no jogo seguinte, contra o São Paulo, venceu por 1×0”, relembra o torcedor.
Além de ter a oportunidade de conhecer os jogadores, Seu Jairton foi apresentado para o então presidente do clube, Vilson Ribeiro de Andrade, e para o maior ídolo do Coritiba, o ex-jogador Dirceu Kruger.
Naquele ano, o eterno coxa-branca caiu no gosto da torcida e se tornou um dos símbolos do time paranaense. Desde então, Jairton tem passe livre para os jogos que acontecem no Estádio Major Antônio Couto Pereira e até fez amizade com a equipe técnica e os jogadores do Coxa.
“Sempre sou muito bem recebido pela diretoria do clube, mas gosto mesmo é de ficar no meio da galera, não sou chegado em camarote. Quando a gente ganha, o pessoal comemora, joga cerveja para cima, me molha inteiro. Acho muito divertido, acompanhar o Coritiba é minha alegria, minha emoção, às vezes decepção também, mas faz parte da vida”, confessa.
Convite para o camarote do Athlético
Recentemente, um convite inesperado do Athletico Paranaense repercutiu nas redes sociais. Com a liberação para a presença das duas torcidas no clássico Athletiba, Seu Jairton teve dificuldade para conseguir ingressos. Ao compartilhar sua situação no Twitter, ele foi surpreendido com uma mensagem do clube rival, que o convidou para ser um visitante especial na partida.
“As duas torcidas se mobilizaram, e para minha surpresa, recebi o convite do Athletico. Aceitei porque temos que saber separar as coisas, deixar de lado a rivalidade, e faço de tudo para ver o jogo do Coxa, até aceitar o convite do principal rival”, diz às gargalhadas.
Quando ele fala que faz de tudo pelo time, não é mera força de expressão. Para acompanhar os jogos, o torcedor e sua esposa têm todo um planejamento para vender copos e arrecadar o valor do transporte até o estádio.
“Nós não temos carro, então pegamos Uber, que custa um valor expressivo daqui até Curitiba. Por isso, quinze dias antes de cada jogo, começo a venda dos nossos copos personalizados”, explica.
Um devoto do Futebol
Com dinheiro para o transporte e ajuda da esposa Solange, não tem tempo ruim ou distância que o impeça de assistir religiosamente ao time do coração. E para alimentar ainda mais o gosto pelo esporte, Seu Jairton é técnico de um time de jovens guaratubanos, o Juventude, desde 2016.
“Gosto demais do futebol, minha alegria é estar na beira do campo, torcendo com a turma do Couto Pereira ou treinando os meninos do Juventude. São duas paixões: uma é o esporte e a outra é minha família”, conclui o eterno coxa-branca.