Guardiã das sementes: Luzinete ajuda a promover a agricultura sustentável e recuperar a Mata Atlântica, em Antonina


Por Luiza Rampelotti Publicado 08/03/2022 às 11h43 Atualizado 17/02/2024 às 03h10

O Litoral paranaense tem fortes restrições para desenvolvimento da agricultura, por estar em uma área de preservação da Mata Atlântica. Mas isso não impede que a agricultura familiar aconteça e beneficie centenas de famílias, especialmente em Antonina, Guaratuba e Morretes, onde existem grandes áreas ocupadas por uma variedade de culturas, entre elas banana, mandioca, palmito e etc, que contribuem economicamente com o Estado.

Na cidade de Antonina mora Luzinete Souza, de 54 anos, uma agricultora familiar considerada guardiã das sementes. Ela faz parte da Rede Sementes da Agroecologia (ReSA), que nasceu em 2015 como um espaço de articulação e organização de iniciativas que dizem respeito à agrobiodiversidade no Paraná. As guardiãs são mulheres que têm um profundo respeito e uma relação muito próxima com a natureza. Se preocupam com todo o processo de resgate, multiplicação, colheita e armazenamento de sementes e mudas.

Luzinete vive na comunidade agroflorestal José Lutzeberger, acampamento do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) imerso na Mata Atlântica. O acampamento é formado por cerca de 30 famílias e está localizado em parte da Área de Proteção Ambiental (APA) de Guaraqueçaba.

Antes de ser ocupado pela comunidade, ela conta que o território era devastado pela pecuária extensiva de búfalo e por crimes ambientais, como o desvio do leito do Rio Pequeno, que atravessa a área. Desde a ocupação do território, os camponeses iniciaram um trabalho de recuperação do bioma da Mata Atlântica, aliado à produção de alimentos a partir da agroecologia e da agrofloresta – sem utilização de agrotóxicos e com integração da produção de alimento com a mata nativa.

Agricultora desde criança

Integrante da ReSA há cinco anos, ela fala com muito carinho do projeto no qual se tornou especialista em mudas frutíferas, nativas e flores ornamentais, já que o clima litorâneo é muito úmido e com muita maresia para as sementes. “A proposta da ReSA é adquirir sementes e mudas diretamente das famílias guardiãs ligadas à rede e distribuí-las para famílias agricultoras – que já produzam ou que estão iniciando. A estimativa é que 2,5 mil famílias do Estado recebem as sementes crioulas, tornando-se também guardiões e multiplicadores da agrobiodiversidade no Paraná”, explica.

A Rede de Sementes da Agroecologia tem como objetivo fortalecer a agroecologia como modelo para a produção de alimentos, garantindo uma maior autonomia às famílias produtoras e consumidoras, promovendo o conhecimento e a multiplicação das variedades e das experiências. A ReSA conta com o apoio do Ministério Público do Paraná (MPPR) e diversas organizações e movimentos sociais que atuam pela preservação da agrobiodiversidade.

Sou agricultora desde criança, tenho no sangue desde o meu pai e mãe. Como dizem, é uma herança genética que só eu e outro irmão carregamos. E olha que somos em 12 irmãos”, revela Luzinete.

Promovendo a agricultura sustentável e orgânica em seu território e região, ela conta que a área total de plantação possui 240 alqueires, totalmente orgânica e certificada pela ReSA. A guardiã afirma que acultura mais vendável na comunidade é a banana, mandioca, abóbora e as verduras folhosas e alguns tubérculos como inhame e batata doce.

Guerreira na luta pela terra

Trabalho na comunidade há 45 anos, aqui casei, tive filhos, formei filhos. Um é formado na Escola Latino Americana de Agroecologia e o outro decidiu tocar o trabalho do meu falecido pai fazendo a cachaça artesanal aqui na comunidade. Sou dona de casa, agricultora, costureira, crocheteira e manipulo alimentos para merendas escolares”, conta Luzinete.

Com todas as suas funções, uma das mais especiais para ela é sua atuação no acampamento do MST, o qual faz parte há 18 anos e também atua na coordenação. “Aqui a gente vê a vida passando. Por exemplo, os campos de agroflorestal que já implantamos e vemos crescer. São alguns campos que já estão produzindo frutos, mas começaram com hortaliças e temos até árvores nativas. É muito gratificante. Sou mais uma guerreira na luta pela terra”, conclui.