Asilos lamentam falta de atenção por parte do Poder Público durante a pandemia


Por Luiza Rampelotti Publicado 22/04/2020 às 15h08 Atualizado 15/02/2024 às 09h26
Fachada do Lar Perseverança

A pandemia do novo coronavírus (Covid-19) tem sido cruel nas casas de repouso para idosos ao redor do mundo. Na Espanha, por exemplo, o jornal “El País” divulgou que o surto da doença atingiu asilos em cidades como Barcelona, Valência, Alicante, Ciudade Real e Vitória, deixando, pelo menos, 90 mortos.

No Brasil, esses centros são chamados de Instituições de Longa Permanência para Idosos (ILPIs) e os trabalhadores desses locais denunciam que a falta de condições adequadas, para higienização e prevenção, transforma os asilos em bombas-relógios para a transmissão dos vírus. Eles comentam, ainda, que aos idosos acima de 60 anos e com várias comorbidades (com duas ou mais doenças relacionadas no mesmo paciente e ao mesmo tempo), ela é letal.

Em Paranaguá, as duas casas que abrigam idosos em situação de vulnerabilidade social estão preocupadas com o avanço da pandemia e os impactos que pode ter entre os seus residentes. O Lar de Idosos Perseverança abriga 56 idosos e o Asilo São Vicente de Paulo, 44.

De acordo com a assistente social Manoela Velomim, do Lar Perseverança, uma das maiores preocupações é com relação à aquisição de Equipamentos de Proteção Individual (EPIs) para os funcionários. “Está muito difícil de encontrar álcool em gel, máscaras cirúrgicas, óculos de proteção, toucas e aventais descartáveis. Está em falta até para compra e, quando encontramos, o preço está muito acima do normal. Mas precisamos desses materiais para poder continuar trabalhando protegidos e sem levar riscos de contaminação aos idosos”, diz.

Capacitações para evitar contágio

Ela explica, também, que desde o mês de março, quando as medidas de combate ao vírus passaram a ser adotadas na cidade, o asilo está com os portões fechados e visitas suspensas. “Os idosos não recebem nenhum tipo de visita, mas os funcionários vão e vêm todos os dias, por isso, realizamos capacitações recorrentes para evitar a contaminação deles e, consequentemente, dos idosos, que são o grupo de risco”, diz.

As capacitações envolvem treinamentos relacionados à higienização e cuidados contra o coronavírus. “Os funcionários são obrigados a utilizar os EPIs e a orientação é que se evite ao máximo o contato físico, que não tem como ser zero, pois existem as questões de troca, banho e alimentação dos idosos. Além disso, quando eles chegam na instituição precisam tomar banho, trocar de roupa e pedimos a compreensão de todos para que façam somente o trajeto de casa para o trabalho, para cuidado deles e dos idosos. Eles também precisam fazer a higienização das mãos, com água e sabão, a cada meia hora, e utilizar o álcool em gel  a todo o momento”, explica.

Manoela, Therbio e Marcia, do Lar Perseverança, estão preocupados com os impactos da pandemia entre os idosos

Dos 38 funcionários, os 19 cuidadores e seis técnicos em enfermagem são os que mais têm contato com os idosos, além da equipe multidisciplinar que envolve psicólogo, terapeuta ocupacional, assistente social, nutricionista, entre outros. “Estamos capacitando os funcionários para que identifiquem qualquer sintoma, mas também temos atendimento médico duas vezes por semana. Até o momento, nenhum morador apresentou qualquer sintoma, mas caso venha a apresentar, já temos um plano de contenção, que se trata de um quarto preparado para o isolamento”, informa Manoela.

Medidas de higienização

Nos dois asilos, as medidas de higienização foram intensificadas devido ao coronavírus. De acordo com a supervisora do Lar Perseverança, Marcia Domingues Guimarães, está sendo realizada a desinfecção diária de todos os pavilhões. “Os idosos são retirados dos quartos, passamos cloro em todo o piso, as roupas de cama são trocadas e desinfetadas diariamente. A intenção é que este vírus não chegue até nós”, informa.

No Asilo São Vicente de Paulo, a coordenadora da Instituição, Bárbara Regiane Fraga de Albuquerque, também comenta que foram adotadas todas as recomendações da prefeitura e do Ministério Público do Paraná. “Instalamos duas pias na entrada da instituição para que os funcionários entrem já higienizados, suspendemos as visitas e também os serviços não essenciais. Demos férias antecipadas aos funcionários do grupo de risco, e todos os funcionários que continuam trabalhando têm que fazer a higienização prévia, como a troca de vestimentas e utilização do kit de EPIs”, diz.

Ela informa, ainda, que a cada duas horas é realizada a limpeza do chão com água e cloro e de todas as extremidades e superfícies com álcool 70%.

Dos 30 funcionários que trabalham no São Vicente de Paulo, 14 são cuidadores e duas são técnicas em enfermagem. O atendimento médico também é realizado duas vezes por semana. “Já preparamos dois quartos de isolamento caso haja a contaminação de algum idoso e estamos equipando esses quartos”, afirma a coordenadora.

Asilo São Vicente fica na Rua Júlia da Costa, 700

Saúde mental na pandemia

Com a suspensão das visitas, dos projetos sociais que aconteciam diariamente, levando diversos voluntários e alegria ao asilo, e dos eventos festivos com o objetivo de arrecadar recursos e doações, os idosos têm enfrentando, além da preocupação com o coronavírus, outro problema: enfraquecimento da saúde mental. “Como eles estão sem visita, sem qualquer tipo de contato, observamos que as questões de saúde mental têm se aflorado muito. Todos os dias temos um caso de alguém que fica muito nervoso ou está depressivo. A equipe multidisciplinar está sendo bem atuante e estamos realizando chamadas de vídeo entre eles e suas famílias, sempre acompanhados do psicólogo, porque muitos se emocionam”, diz Manoela.

É o mesmo caso do São Vicente de Paulo. Lá, a coordenadora Barbara comenta que os idosos estão muito tristes. “Eles estão bem carentes com relação às visitas, então trabalhamos com as vídeo-chamadas, mas muitos não têm família para ligar. Para tentar amenizar os sentimentos e preencher as lacunas, temos realizado programações diferenciadas, como noite do cinema, cozinhaterapia, que é levá-los para a cozinha para que eles mesmos preparem refeições, entre outros, mas não é o suficiente”, afirma. No asilo não há profissional de psicologia e terapia ocupacional.

Coordenadora do São Vicente de Paulo pede que população continue doando mantimentos e produtos de higiene

Falta de preocupação do Poder Público

O presidente do Lar Perseverança, Therbio Castro da Silva, se sente impotente diante dos impactos causados pela pandemia e denuncia a falta de preocupação das entidades públicas e privadas com relação aos asilos. “A impressão que temos é que os governos municipal, estadual e federal não estão entendendo a real situação dos asilos, que é um local que abriga pessoas do grupo de risco e, se o vírus adentrar, será letal para a maioria dos idosos. Há notícias no mundo inteiro e, inclusive, no Brasil, sobre asilos em que as pessoas foram abandonadas para morrer lá dentro. Esperávamos um cuidado e apoio muito maior, pois todos que residem aqui têm alguma comorbidade e mais de 60 anos”, lamenta.

De acordo com ele, desde antes da obrigatoriedade das medidas de isolamento e higienização, decretadas pelos governos, a equipe da instituição está seguindo os protocolos nacionais e mundiais a fim de evitar a contaminação por coronavírus. “Apesar de estarmos seguindo todos os protocolos, não temos capacidade de, sozinhos, garantirmos todas as medidas de segurança e higienização necessárias, pois os recursos necessários para implantar essas ações estão além das nossas possibilidades. Infelizmente, não estamos vendo nenhuma entidade pública se preocupando conosco”, comenta.

Diminuição das doações

Assim como o Lar Perseverança, o Asilo São Vicente de Paulo também está sofrendo com a falta de doações neste momento de pandemia. Ambas as instituições sobrevivem por meio de doações, eventos para arrecadação, e um convênio com a Prefeitura, que paga parte dos salários dos funcionários. “A gente sempre teve muita doação, mas com os portões fechados isso parou. Mas precisamos muito, tanto de fraldas, como alimentos, materiais de higienização e limpeza e estamos preocupados, pois não sabemos quanto a pandemia irá durar”, diz Therbio.

Barbara também reforça a solicitação para doações, especialmente dos EPIs, como máscaras cirúrgicas, aventais descartáveis, luvas e álcool em gel. “Mas também precisamos de alimentos, fraldas e, principalmente, leite integral. Precisamos desmistificar a impressão de que o São Vicente de Paulo é um asilo particular, pois não é. Ele é uma instituição filantrópica e também necessita de doações e ajuda”, conclui.