Mulheres ao mar! Cientistas atuam na recuperação da biodiversidade marinha no Litoral do Paraná


Por Redação Publicado 08/03/2023 às 14h39 Atualizado 18/02/2024 às 06h20

Um grupo de cientistas, todas referências em suas áreas de atuação, tem realizado diversas iniciativas e descobertas sobre a fauna e ecossistemas da zona costeira brasileira. Em linhas de pesquisa variadas, essas profissionais avaliam e monitoram a dinâmica e a biodiversidade costeira e marinha na interface com a Mata Atlântica. As pesquisadoras desenvolvem estudos sobre o comportamento da fauna e da flora, participam ativamente de ações de conservação e reabilitação dos animais, de educação ambiental e na formação e efetivação de políticas públicas que garantem qualidade e bem-estar ao Litoral do Paraná.

Essas cientistas do mar integram o Programa de Recuperação da Biodiversidade Marinha (REBIMAR), iniciativa patrocinada pela Petrobras e pelo Governo Federal. As pesquisadoras são ligadas a instituições como Universidade Federal do Paraná (UFPR e CPP-CEM), Universidade Estadual do Paraná (UNESPAR), Universidade de São Paulo (USP), Universidade Estadual Paulista (Unesp) e Instituto Federal do Paraná (IFPR). Além das profissionais com longa experiência, o REBIMAR integra jovens cientistas, que desenvolvem dissertações e teses de pós-graduação, e estudantes em estágios oficiais firmados com essas instituições de ensino.

O conjunto de pesquisas desenvolvidas por essas mulheres é fundamental para entender como o ecossistema costeiro e marinho vem sendo alterado e tem se adaptado à presença humana. As informações científicas geradas vêm sendo essenciais para embasar políticas públicas e ações regionais e internacionais de conservação da zona costeira, do oceano e de toda a biodiversidade. Parte dos trabalhos também é focada na valorização desse território e nas práticas tradicionais culturais realizadas nos ecossistemas.

Camila Domit, coordenadora técnica das ações com tartarugas marinhas


Tartarugas, tubarões e raias são apenas alguns dos colegas de trabalho de Camila Domit. Seus estudos e trabalhos são focados na conservação de ecossistemas e na biodiversidade marinha, com muita pesquisa e monitoramento de fauna. Ela participa de diferentes redes e fóruns nacionais e internacionais referentes à conservação do oceano e sua riqueza, assim como está engajada em estratégias que aproximam ciência, governantes e sociedade.

Camila Domit, coordenadora técnica das ações com tartarugas marinhas. Foto: Assessoria de Imprensa Rebimar

No REBIMAR, Camila coordena as pesquisas envolvendo as tartarugas-verdes, desenvolvendo ações de captura ativa, marcação e soltura dos animais, analise de saúde e uso do habitat, principalmente, na Ilha das Cobras, na Ilha do Mel e na área costeira do Paraná. Como parte dos trabalhos desenvolvidos, está o teste e uso de rastreadores para avaliação do comportamento e  monitoramento da exposição dos animais a riscos e impactos ambientais.

Temos no Paraná a presença das cinco espécies de tartarugas marinhas que ocorrem no Brasil, além de espécies de golfinhos, aves marinhas, tubarões e raias que são ameaçadas de extinção e que utilizam nosso litoral, seja durante o processo de migração, seja para reprodução ou alimentação. O Paraná é área considerada de grande relevância para conservação da biodiversidade marinha e costeira, tanto nas avaliações do Ministério do Meio Ambiente quanto em avaliações internacionais”, diz Camila.  

Cassiana Baptista Metri, coordenadora da fauna de manguezal – especialmente caranguejos

O manguezal é a segunda casa dessa bióloga, mestre e doutora em Zoologia. No REBIMAR, está à frente de várias pesquisas para conservação e avaliação desses ambientes úmidos, para decifrar como são impactados pela presença humana. Além dos manguezais, a cientista Cassiana Metri é referência no estudo sobre os caranguejos-uça, espécie mais comercializada e consumida no Brasil, segundo o IBAMA.

O acompanhamento dos manguezais é feito desde 2018 e as pesquisas demostram a grande capacidade de regeneração desses bosques de mangue. Mas a fauna marinha já tem sido bastante impactada pela ação humana. “Os animais que passam parte da vida no manguezal terão presença de contaminantes no corpo e as outras espécies, que se alimentam deles, vão acumular em escala. Assim como os tubarões e golfinhos, o homem é um consumidor de topo de cadeia e se alimenta dentro desse processo”, explica Metri. Entre seus estudos mais recentes, está a quantificação de metais pesados nos caranguejos-uça.

Cassiana Baptista Metri, coordenadora da fauna de manguezal. Foto: Assessoria de Imprensa Rebimar

Cassiana Metri também é professora na Unespar, no Campus de Paranaguá (PR) e dedica-se à educação científica com os projetos de extensão Todos Contra a Dengue e Coleção de Zoologia.

“Meu pai era pescador esportivo e me ensinou a amar o mar. Na adolescência eu firmei um objetivo de ver o mar todos os meses, o que, morando em Curitiba nem sempre era possível. Porém, durante a graduação, ao visitar o Centro de estudos do Mar da UFPR eu senti que tinha encontrado o meu ambiente. Nessa época comecei a fazer estágios e estou perto do mar até hoje”, conta.


Cláudia Namiki, consultora de Ictioplâncton (ovos e larvas de peixes)

Os olhos atentos dessa bióloga contribuem com diversas pesquisas relacionadas a descrição, ecologia e biologia de ovos e larvas de peixes.  A bióloga quer entender como os fatores físicos e biológicos operam em diferentes escalas espaciais e temporais e afetam a distribuição, crescimento e mortalidade desses pequenos seres.

“Sempre gostei do mar, desde criança, mas minha história com o mar começou de verdade na graduação em Biologia, quando comecei a estagiar no Laboratório Integrado de Zooplâncton e Ictioplâncton. Fiquei fascinada em pensar que animais tão pequenos viviam à deriva nesse imenso oceano, e que alguns deles, como as larvas de meros, poderiam crescer e se tornar animais imponentes”, conta Claudia Namiki, mestre em Ecologia e doutora em oceoanografia biológica.

Cláudia Namiki, consultora de Ictioplâncton (ovos e larvas de peixes). Foto: Assessoria de Imprensa Rebimar

Uma de suas pesquisas avalia como os Recifes Artificiais implantados pelo REBIMAR no Litoral do Paraná serviram de proteção contra atividades destrutivas de pesca de arrasto e ofereceram habitat para a fauna local para recuperação da biodiversidade. Ela estudou e comparou as larvas de peixes presentes nos recifes artificiais e naturais do Arquipélago de Currais.

Com armadilhas luminosas e rede de plâncton, o estudo identificou 12 famílias e 14 espécies, ampliando a lista total de espécies da área em oito espécies e três famílias.  Chama-se atenção especial para o “efeito atrator” dos recifes artificiais para algumas espécies. A grande abundância de ovas de peixe sugere que essas estruturas artificiais podem melhorar a produção local de peixes.

Fernanda Possatto, vice-coordenadora da pesquisa em microplástico

A oceanógrafa Fernanda Possatto integra a equipe de pesquisa que acaba de levantar dados científicos inéditos sobre a presença de microplástico na água, em sedimentos e a ingestão por aves como atobás, gaivotas e fragatas.

O estudo é feito pelo REBIMAR na zona costeira do Paraná, na área conhecida como Complexo Estuarino de Paranaguá. As análises são feitas na água, nos sedimentos e nos animais encontrados nas praias, especialmente em aves costeiras. Os resultados encontrados até agora são preocupantes.

Fernanda Possatto, vice-coordenadora da pesquisa em microplástico. Foto: Assessoria de Imprensa Rebimar

Já confirmamos uma quantidade bem relevante de animais ingerindo plástico. Também encontramos microplástico em regiões próximas à cidade de Paranaguá e também em áreas de preservação ambiental como Guaraqueçaba. Grande parte dos resíduos fica na superfície da água, logo, a dispersão dos mesmos pode ser influenciada por diversos fatores como as variações de marés e a dinâmica das correntes de um modo geral.”

A pesquisadora e professora do ITFPR é uma grande incentivadora de estudantes do ensino médio na iniciação científica que participam da coleta e análise das amostras coletadas. O trabalho realizado no REBIMAR vai contribuir com dados para embasar políticas públicas e ações de educação ambiental.

Marília Cunha Lignon, coordenadora Ecossistema Manguezal

A bióloga Marília Lignon tem liderado um grupo de mulheres no estudo dos manguezais paranaenses e paulistas, campo até então dominado por homens, pela dificuldade física de “caminhar” na lama e nas raízes. É uma grande incentivadora das equipes femininas e prova que o desafio pode ser facilmente vencido com técnica.

“O contato com o mar, areia e sol sempre fizeram parte da minha vida. Fiz biologia e procurei o enfoque marinho-costeiro nas escolhas de linhas de pesquisa por onde passei. Quando coloquei o ‘pé na lama’ não saí mais. Os manguezais entraram na minha vida para ficar. Esse ecossistema, entre a terra e o mar, provê tantos benefícios para a vida no planeta, que me encanta mais e mais a cada dia que passa”, afirma a doutora em Oceanografia.  

Marília Cunha Lignon, coordenadora Ecossistema Manguezal. Foto: Assessoria de Imprensa Rebimar

Suas pesquisas têm trazido dados novos sobre os manguezais, como a capacidade de regeneração desses ambientes e a importância dessas florestas de mangue que oferecem serviços ecossistêmicos à humanidade, como a mitigação dos efeitos negativos das mudanças climáticas. Seu novo estudo avalia o estado de conservação do complexo estuarino de Iguape-Cananéia-Paranaguá e a Baía de Guaratuba. Trata-se da maior área de manguezal no sudeste e sul do Brasil, reconhecido como Patrimônio Natural da Humanidade da UNESCO.

Em outra publicação recente, Lignon investigou fatores que levam à colonização e à disseminação de plantas não nativas nos manguezais. A pesquisa descobriu que a baixa salinidade e o aumento da disponibilidade de nitrato no sedimento têm, não só favorecido o sucesso de plantas não nativas nas florestas de mangue, como resultado também em grande quantidade de troncos de mangue mortos.


Natascha Wosnick, coordenadora de Elasmobrânquios (raias e tubarões)

A coordenadora das pesquisas sobre  Elasmobrânquios (raias e tubarões) do Rebimar, Natascha Wosnick, desenvolve diversos estudos científicos sobre as espécies que frequentam a costa brasileira, envolvendo pescadores e comunidades tradicionais na conservação e na conscientização sobre a importância de proteger as espécies ameaçadas de extinção.

Bióloga, com mestrado em Fisiologia e doutorado em Zoologia pela UFPR, é pesquisadora da Associação MarBrasil e do Laboratório de Predadores de Topo da Universidade de Haifa (Israel). Participa do Plano de Ação Nacional para a Conservação dos Tubarões e Raias Marinhos Ameaçados de Extinção (Pan-Tubarões) e faz parte do Grupo de Estudos de Elasmobrânquios do Maranhão (GEEM) e do Paraná (GEEP).

Não se faz conservação sem ajuda das comunidades tradicionais e do setor pesqueiro. Precisamos dessa sinergia e dessa parceria para realizar as atividades e fazer com que as medidas de conservação que a gente venha a propor sejam mais efetivas, buscando formas de preservar os animais sem prejudicar as atividades econômicas dessas pessoas.”

Natascha Wosnick, coordenadora de Elasmobrânquios. Foto: Assessoria de Imprensa Rebimar

Atualmente Natascha vem desenvolvendo estudos em diversas frentes, incluindo os efeitos da pesca e poluição na saúde e sobrevivência de raias e tubarões, com particular interesse em espécies ameaçadas de extinção. Seu projeto principal envolve a parceria com pescadores artesanais para avaliar como o estresse causado pela captura pode afetar a recuperação de espécies com pouco valor comercial e que são pescadas de forma acidental.

Com estes dados, será possível propor medidas de manejo baseadas na soltura destes animais, considerando as chances que eles têm de sobreviver quando devolvidos à natureza. O projeto também visa a mapear quais são as injurias causadas pelos aparatos de pesca, como por exemplo cortes e fraturas, procurando assim aprimorar o manejo de animais vivos e aumentar as chances de sobrevivência após a soltura.