Aposentadorias da Paranaguá Previdência são contestadas. Entenda o caso


Por Katia Brembatti Publicado 22/07/2021 às 17h42 Atualizado 16/02/2024 às 08h08

A fórmula de cálculo de centenas de benefícios de aposentadoria e pensão, pagos pela Paranaguá Previdência, está sendo alvo de questionamento pelo Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR). O Ministério Público de Contas (MPC) argumenta que foram usadas regras inadequadas e pediu a revisão dos valores. O TCE-PR acatou o pedido e deu 30 dias para que os pagamentos sejam recalculados e modificados. A Paranaguá Previdência tentou suspender o prazo, porém o Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR) negou a liminar. Ainda cabe recurso, mas a situação pode afetar diretamente dezenas de pessoas na cidade.

A questão é complexa, com uma série de nuances jurídicas e precisa de uma explicação detalhada (confira no box “Entenda o caso”). Entre as aposentadorias que estão sendo contestadas estão 13, que foram concedidas de 2017 a 2021, em valores entre R$ 5,5 mil e R$ 34 mil, com média de R$ 11 mil. Com a exceção de procuradores, o teto a ser pago por aposentadorias para os servidores municipais é o salário do prefeito, que está em $ 16 mil.

Uma amostragem, com apenas cinco processos, aponta para R$ 507 mil pagos a mais. A estimativa é de que a diferença represente de R$25 milhões a R$40 milhões para o caixa da Paranaguá Previdência, ao longo do tempo, se os benefícios não forem recalculados. Em algumas situações, conselheiros do TCE-PR têm adotado posicionamentos divergentes. Por exemplo, em casos de diferenças pequenas, na casa de R$ 200 por mês, a revisão não está sendo determinada. Mas o MPC sustenta que esses valores a maior são pagos, na média, por muito tempo, considerando a expectativa de vida de aposentados e pensionistas, representando um volume expressivo ao longo do período.

Questionamentos

Pelo menos, onze benefícios já tiveram redução e mais oito devem ser diminuídos no próximo pagamento, comenta Adriana Maia Albini, diretora-presidente da Paranaguá Previdência. São profissionais de várias áreas (professor, médico, técnico administrativo, etc.), com valores bem variados. Em média, a queda tem sido entre 20% e 50% do benefício. Em pelo menos um caso, ao qual a reportagem teve acesso, o pagamento caiu pela metade – de cerca de R$ 4 mil para R$ 2 mil. 

Ela conta que 236 processos de aposentadoria estão em contestação, sendo 44 já homologados (ou seja, que já tinham sido confirmadas anteriormente). Há também ações paradas (sobrestadas), esperando definições. Segundo a diretora-presidente, a situação criou insegurança jurídica, causando contratempos e pânico entre os segurados. Além disso, Adriana afirma que diversos servidores, ao serem informados sobre o valor que teriam de aposentadoria, decidiram suspender os pedidos e continuar trabalhando.

O cenário alimentou boatos e fez circular listas com nomes de quem seria afetado. “Tinha até nome de gente que já morreu”, relata. A Paranaguá Previdência administra o sistema previdenciário dos próprios funcionários e também da Prefeitura, da Câmara e da Cagepar. Atualmente, são 785 aposentados e pensionistas e 4236 contribuintes. A gestora da entidade declara que o questionamento sobre os cálculos não está acontecendo somente na cidade e menciona uma reunião realizada, durante a semana, entre conselheiros do TCE-PR e representantes da Associação dos Municípios do Paraná (AMP), buscando uma solução.

A presidente do Sindicato dos Servidores Municipais de Paranaguá (Sismup) e conselheira da Paranaguá Previdência, Janete Isabel Passos, questiona a situação. “Foi homologado para uns e por que para outros não? Não achamos isso correto”, diz. Ela também acredita que não faz sentido “mexer no passado”, alterando os benefícios de quem já recebe um determinado valor mensalmente e tem a sua condição de vida atrelado a ele. A sindicalista informa que há suporte jurídico disponível para os funcionários e segurados e que o mais adequado seria recorrer à Justiça antes mesmo de entrar com o pedido de aposentadoria, atitude que já vem sendo tomada por algumas pessoas. “Esperamos poder reverter isso, pois são anos de trabalho e de contribuição”, declara.

Entenda o caso

– Antes de 2006, os servidores públicos de Paranaguá eram regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e se aposentavam pelo INSS.

– A partir de 2006, viraram estatutários (com regras próprias) e em 2007 entraram no regime da Paranaguá Previdência. A partir daí, não mais estavam vinculados ao teto de pagamento de aposentadoria do INSS, que hoje é de R$ 6,4 mil.

– A fórmula de cálculo é feita com base na média dos 80 maiores salários. Assim, alguém que recebeu R$ 14 mil por sete anos, por exemplo, passou a ter direito a uma aposentadoria em patamares semelhantes. Desde que obedecidas algumas condições.

– Foram previstas emendas de transição, considerando a mudança nos regimes previdenciários. Mas o Ministério Público de Contas (MPC) argumenta que não podem usar os benefícios dos artigos 3° e 6° da legislação quem não era concursado antes de 2006 e quem não recolhia a contribuição antes.

– A aposentadoria é concedida (a pessoa deixa de trabalhar e passa a receber o benefício), mas ainda precisa passar por um processo formal: a homologação. É quando um órgão público analisa o processo e referenda, ou seja, confirma que está tudo correto. Quem faz esse procedimento para os contribuintes da Paranaguá Previdência é o Tribunal de Contas do Estado do Paraná (TCE-PR).

– Em 2018, um prejulgado (uma espécie de documento de entendimento do órgão sobre uma situação) do TCE-PR acatou os argumentos do MPC e passou a considerar irregulares as aposentadorias que foram calculadas com base nos artigos 3° e 6°.

– Os pedidos de aposentadoria, entregues a partir de então, passaram a não ser homologados. A Paranaguá Previdência foi comunicada para mudar a fórmula de cálculo.

– Começou uma discussão jurídica sobre isonomia (uma vez que muitas pessoas tinham sido beneficiadas antes) e sobre direito adquirido. Além de tentar impedir que novos casos acontecessem, o MPC passou a pleitear a revisão das aposentadorias já concedidas.

– Há algumas divergências dentro do TCE-PR, com alguns conselheiros determinando a revisão apenas para os casos a partir de 2018 e outros concordando que mesmo as anteriores devem ser recalculadas. 

– A Paranaguá Previdência tenta medidas administrativas e judiciais para reverter a decisão, mas até o momento não conseguiu.