O valor da fé em Paranaguá que surgiu em outra pandemia


Por Redação Publicado 29/07/2021 às 08h55 Atualizado 16/02/2024 às 08h36

A história sobre Nossa Senhora do Rocio é conhecida por grande parte dos parnanguaras? Provavelmente sim! Mas ainda falta muito para que essa história ganhe o reconhecimento que merece, não apenas no Litoral, mas em todo o Paraná. Essa é avaliação do reitor do Santuário, Padre Dirson Gonçalves.
A devoção não se restringe ao município: Rocio é padroeira do estado, tendo sido reconhecida pelo papa Paulo VI em 1977. Assim, o Paraná passou a ser o único no Brasil com essa concessão dada pelo Vaticano, o que torna Paranaguá uma cidade singular, merecendo o título de Capital Paranaense da Fé.


Geração após geração, famílias de pescadores, de marinheiros e daqueles que buscam refúgio para sanar as dores do corpo e da alma passaram a recorrer à Nossa Senhora do Rocio. É por isso que, atualmente, o santuário vem promovendo ciclos de novenas para pedir “a graça da saúde física, mental e espiritual” para atenuar os males provocados pela pandemia do novo coronavírus. “Pedimos a proteção contra a doença, mas também pelas pessoas que trabalham para conter o vírus. Sim, a ciência é uma evolução espiritual. Uma obra de Deus. E como diz nas escrituras, no livro de (São) Tiago, a fé sem obras é morta”, afirma o padre.

História

Assombros causados por uma pandemia já atingiram Paranaguá muito antes da Covid-19. No começo do século XX, em 1901, teve a Peste Bubônica. Já no final de 1917, a Gripe Espanhola literalmente aportou na cidade e espalhou-se pelo interior do estado da mesma forma como ocorreu em outras cidades portuárias do Brasil. Mas muito antes, outra doença, que ficou conhecida como Peste Grande ou Peste da Bicha, assolou o litoral.
A enfermidade, de acordo com pesquisadores, foi, possivelmente, uma epidemia de febre amarela, primeiramente identificada em Pernambuco em 1685 e estendeu-se pelo litoral brasileiro até atingir Paranaguá no ano seguinte. Há também suspeitas de que a peste fosse cólera. Contam os registros históricos que famílias inteiras foram contaminadas e mortas pela doença. E é justamente no meio do caos, no século XVII, que nasce um dos maiores legados da cidade: a crença em Nossa Senhora do Rocio.


Quando Pai Berê, em 1648, encontrou a frágil imagem entre as tramas de sua rede em meio aos peixes trazidos do mar, teve início uma manifestação de fé inédita no Brasil. Afinal, isso aconteceu quase 70 anos antes de pescadores encontrarem a Senhora da Conceição Aparecida no rio Paraíba do Sul, no interior de São Paulo em 1717. Padre Dirson diz que é difícil entender por quais motivos o fenômeno de Paranaguá não ter atingido a mesma relevância que o milagre de Aparecida. “Pode ter sido um descuido dos responsáveis da Igreja na época. Um estudo mais aprofundado poderá apontar porque um acontecimento se propagou mais que outro”, explica.

Por ter sido encontrada durante a madrugada, a imagem de Paranaguá recebeu a denominação de Rocio, ou Santa do Orvalho. Quando a peste aportou em Paranaguá, os moradores recorreram à devoção, para buscar alento ao sofrimento. A febre cedeu e eis aí o primeiro de uma quantidade sem fim de milagres atribuídos à Santa, ao longo de 373 anos.

Construção

Apesar de as tradições cerimoniais em louvor à N. S. do Rocio serem mantidas até hoje, Padre Dirson lamenta que só os mais velhos saibam sobre a história do milagroso achado. Ele afirma que o povo de Paranaguá é devoto de Nossa Senhora do Rocio, mas falta uma disposição em manter viva a memória. “Muitas crianças não conhecem os detalhes sobre o achado da imagem. Apesar de Paranaguá ser uma cidade abençoada, o milagre registrado aqui não é tão valorizado”, aponta.
O reitor, à frente da comunidade há aproximadamente dois anos, comenta que uma de suas missões religiosas é propagar o legado da Santa para todo o Paraná e também para outros estados do Brasil. A história envolve uma disputa de classes travada na época que a imagem foi achada. A área hoje aterrada, onde fica o Santuário, era uma região empobrecida. Quando a notícia do achado se espalhou, as autoridades religiosas da época quiseram levar a Santa para a região mais nobre e urbanizada da cidade. Por um milagre ou por obra de algum devoto que providenciou o resgate, a imagem voltou para a origem. Por isso, até hoje, há uma procissão de ida – do Santuário para a Catedral e, depois, de retorno.

Padre Dirson acredita que a localização dificulta o acesso de turistas, por exemplo. “Temos o mar em nossa frente e nos outros três lados do Santuário estamos cercados pelas estruturas do porto”, argumenta. Mas nada que interfira na riqueza da fé em Paranaguá. “A todo o tempo recebemos relatos de graças alcançadas por intermédio de Nossa Senhora do Rocio. Pequenas ou grandes, não importa, pois, não se mede uma graça pelo tamanho”, declara.