Mulheres na política: fraude em cota feminina pode levar a impugnação de toda a chapa


Por Brayan Valêncio Publicado 16/07/2024 às 11h45
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Durante um encontro com os partidos e pré-candidatos da cidade portuária, realizado na última quarta-feira (10), o juiz Leonardo Lago explicou que, em casos extremos, o partido pode ser impedido de participar das eleições devido à fraude nas cotas de gênero. Foto: Juan Lima/JB Litoral

Atualmente, a representatividade de gênero é uma questão central na política e envolve a busca por uma democracia mais inclusiva e equitativa. As cotas femininas nas eleições são medidas adotadas em muitos países e visam garantir a participação mínima de mulheres nos processos eleitorais, corrigindo a histórica sub-representação feminina nas esferas de poder. Tal entendimento consta em acórdão do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) do Brasil, que pacificou o assunto e determinou que as regras sejam seguidas em todas as eleições proporcionais, independentemente de estar em disputa o cargo de vereador, deputado estadual ou deputado federal.

A advogada Emma Roberta destaca que a presença feminina é essencial para garantir uma abordagem mais holística e equilibrada na formulação de políticas pública. Foto: Arquivo pessoal
A advogada Emma Roberta destaca que a presença feminina é essencial para garantir uma abordagem mais holística e equilibrada na formulação de políticas pública. Foto: Arquivo pessoal

No Brasil, a legislação vigente exige que pelo menos 30% das candidaturas sejam ocupadas por mulheres. Esta medida, na visão de Emma Roberta Palú Bueno, que é mestre em Direito Constitucional e presidente da Comissão da Mulher Advogada da Ordem dos Advogados do Brasil – seção Paraná (OAB-PR), além de promover a equidade de gênero, fortalece a democracia, uma vez que as mulheres representam metade da população e devem ter suas vozes igualmente representadas nos órgãos decisórios.

Ao JB Litoral, a jurista explica ainda que a cota feminina existe na lei desde 1996, mas que só começou a punir efetivamente com cassações de mandatos a partir de 2016. “O que acontece é que muitos partidos registram 30% de mulheres, mas na prática elas não são candidatas reais. Essas mulheres apenas são registradas para cumprir a cota exigida. Mas, o objetivo da lei é justamente privilegiar e impulsionar as candidaturas femininas. Então, caso seja reconhecido que uma única candidatura era fictícia, toda a chapa tem o registro ou o mandato indeferido”, explica Emma Roberta.

Ou seja, se um vereador homem for eleito em um partido que se comprove que mulheres foram usadas como laranja, aquele vereador também perde o mandato, mesmo que tenha atuado de forma correta durante todo o processo eleitoral.

Justiça vê perspectiva positiva com cotas femininas


Na decisão que assegurou que a chapa toda fica prejudicada em caso de candidaturas fictícias, o TSE entendeu que a implementação das cotas femininas não apenas aumenta o número de mulheres candidatas, mas também promove a diversidade de perspectivas nas políticas públicas. Isso porque, segundo o voto conclusivo dos ministros, a presença feminina em cargos eletivos é fundamental para a formulação de políticas que atendam às necessidades específicas das mulheres, além de enriquecer o debate público com visões diferenciadas sobre questões sociais, econômicas e culturais.

Segundo o juiz da 5ª Zona Eleitoral de Paranaguá, Leonardo Marcelo Mounic Lago, os partidos que não cumprem as cotas femininas enfrentam várias penalidades legais e administrativas. No Brasil, a legislação eleitoral prevê sanções rigorosas, incluindo a rejeição do registro das candidaturas e a imposição de multas.

Durante um encontro com os partidos e pré-candidatos da cidade, realizado na última quarta-feira (10), Leonardo Lago explicou que, em casos extremos, o partido pode ser impedido de participar das eleições, o que representa um golpe significativo para qualquer agremiação política. Além das penalidades legais, o descumprimento das cotas pode afetar negativamente a reputação do partido junto ao eleitorado, especialmente entre as mulheres e grupos que defendem a igualdade de gênero.

Essa situação é tão grave que mulheres têm perdido seus cargos por causa do não respeito da cota de gênero. Essa proporção tem que ser respeitada. Não basta ser formalmente candidata, tem que ter ato de campanha. Um exemplo do que pode caracterizar fraude são as votações zeradas ou inexpressivas”, diz o juiz eleitoral.

A advogada Emma Roberta destaca ainda que a presença feminina é essencial para garantir uma abordagem mais holística e equilibrada na formulação de políticas públicas e, não se atentar a isso, vai gerar punição para qualquer um que tenha atuado nessa prática. “Se for provado no processo que dirigentes do partido ou outras pessoas sabiam ou participaram da fraude, será declarada a inelegibilidade desse indivíduo. Ou seja, pode ficar oito anos sem participar de eleições”, conclui.

111 candidaturas derrubadas no Litoral em 2020


O JB Litoral levantou, junto ao Tribunal Regional Eleitoral, a quantidade de candidaturas derrubadas nas eleições municipais de 2020 nas sete cidades da região litorânea. Ao todo, 111 postulantes a políticos foram declarados inaptos pela Justiça Eleitoral. A maior quantidade vem de Paranaguá, que teve 56 candidaturas que não prosperaram. Na sequência aparece Guaraqueçaba, que teve 17 homens e mulheres com o registro negado.

As cidades de Morretes, Pontal do Paraná, Guaratuba e Antonina tiveram 10, 9, 8 e 6 pedidos de candidaturas negados, respectivamente. Por fim, a cidade de Matinhos derrubou 5 registros na última eleição municipal.

Do total de inaptidões, 38 foram mulheres. Paranaguá sozinha representa mais da metade das candidaturas femininas indeferidas em 2020.

Procurada para detalhar quais e quantas destas candidaturas foram derrubadas por fraude eleitoral, a assessoria de imprensa do Tribunal Regional Eleitoral informou que “o processo judicial eletrônico não permite levantamentos como esses” e que iria analisar junto à assessoria jurídica da corte se existe algum observatório sobre fraude em cotas de gênero. Mas, até o momento, a reportagem não obteve retorno.

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