Monitoramento de animais que encalham no Litoral do Paraná identifica as causas de morte de tartarugas, aves e botos


Por Flávia Barros Publicado 28/11/2022 às 07h20 Atualizado 17/02/2024 às 22h39

Quem frequenta as praias do litoral paranaense vê placas espalhadas ao longo da orla de Matinhos, por exemplo, indicando o que fazer ao encontrar animais mortos ou doentes na areia: entrar em contato com o Laboratório de Ecologia e Conservação da Universidade Federal do Paraná (UFPR). Essa comunicação deve ser feita porque os pesquisadores da unidade recolhem os exemplares, fazem um mapeamento e enviam amostras para serem analisadas por acadêmicos do Departamento de Medicina Veterinária Preventiva, do Centro de Ciências Agrárias (CCA) da Universidade Estadual de Londrina (UEL).

E não são poucos os animais recolhidos e estudados. Para se ter uma ideia, apenas no ano passado, cerca de 2.300 animais marinhos, na sua maioria aves, foram encontrados encalhados nos 100 km de extensão do litoral. Outras espécies como tartarugas, golfinhos, lobos marinhos e focas também foram registradas na mesma situação.


CAUSAS DAS MORTES


O JB Litoral conversou com a professora Ana Paula Frederico Rodrigues, coordenadora do projeto na parte que envolve a UEL. Segundo a cientista, que tem pós-doutorado na França e coordena o Programa de Pós-Graduação em Patologia Animal da Universidade, os estudos identificam o que causa a morte dos animais e também analisam o impacto da ação humana no meio ambiente.

É uma pesquisa extensa e difícil pela falta de dados mais antigos. Até 2015, a coleta era semanal, depois passou a ser diária. A autópsia é feita em Pontal, onde são colhidos fragmentos de diversos órgãos e a gente faz a análise aqui na UEL, onde a gente vai evidenciar doenças que acometem esses animais e fazer associação com interações com o homem, isto é, se essas doenças que os animais apresentam são devido às interações com a ação humana”, disse.

Ela explicou que foram identificados que os botos têm morrido por doença nos rins, órgão onde foi encontrado uma concentração muito alta de chumbo, localizado também no fígado desses animais. A professora revelou que o chumbo pode ser de origem natural, como a combustão da madeira, mas também por componentes produzidos pelo homem. “Ainda não dá para fazer essa associação”, comentou.

Já as tartarugas morrem devido à interação com a pesca, doenças pulmonares, pneumonias, alterações decorrentes de afogamento, já que acabam em malhadas e redes de pesca. E nas aves, sobretudo gaivotas, frequentemente, a causa da morte é pelo quadro de pneumonias e disseminação grave em outros órgãos causadas por fungos, geralmente quando o animal tem baixa imunidade.

Ainda não se sabe o que está levando a esse quadro de baixa imunidade, mas a gente acredita que as gaivotas, como são muito próximas do ser humano, têm contato com o ambiente, com acesso a aterros sanitários e a produtos mais degradados que podem levar à imunossupressão. Mas ainda são suposições, precisamos da continuidade das pesquisas para entender como está a saúde desses animais”, explicou Ana Paula.


MAIS HUMANO, MAIS MORTES


O estudo também indica relação de mortes com a poluição e outros fatores, como a significativa quantidade de animais que morrem pela ingestão de plástico, embalagens vazias, tampinhas, canudos, ou mesmo pedaços de redes de pesca velhas simplesmente jogadas no mar pelos pescadores. “Mais ou menos tem se mantido o padrão de mortes. A gente detectou, por exemplo, a presença de um vírus que provocou um grande surto no Rio de Janeiro e matou cerca de 200 botos, que aqui também foi detectado, mas com mortalidade de menos animais. Também a presença de toxoplasmose, que só pode ter sido contraída em contato com água contaminada, mais uma interação nociva com a ação humana”, disse a coordenadora que também integra o Projeto de Monitoramento de Praias (PMP) da Bacia de Santos (SP), em razão da exigência do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama) para estudos e monitoramento antes e depois da instalação de plataformas de petróleo na região.

A fase atual do projeto, no Litoral, teve início em 2019, baseada no Sistema de Informação de Monitoramento da Biota Aquática (Simba), que reúne dados dos PMPs de todo o Brasil. O sistema já monitorou mais de 1 milhão de animais e o projeto da UEL ocupa cerca de 25% deste total.


PERSPECTIVAS


A pesquisadora ainda explicou ao JB Litoral sobre a necessidade da continuidade dos estudos. “Esse projeto gerou e continua gerando uma quantidade enorme de informação, mas que precisa ser analisada para que se tenha conclusões. A previsão é que o projeto dure de 18 a 30 anos, e deve prosseguir com estudos rigorosos sobre a saúde dos animais levando em conta também o tempo, assim como vírus, parasitos e outros agentes envolvidos. O monitoramento deve continuar enquanto estiver funcionando a exploração das plataformas de petróleo”, finalizou Ana Paula Frederico Rodrigues.