Negligência na fiscalização faz prefeitura revogar concessões, atendendo ao MPPR
Reféns da falta de competência no gerenciamento das concessões e permissões de bens públicos para uso comercial por parte da Prefeitura de Paranaguá, 180 permissionários terão revogados seus decretos até o dia 30 de abril pelo Prefeito Marcelo Elias Roque (PODEMOS), atendendo a Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) do Ministério Público do Paraná (MPPR).
Uma investigação do MPPR comprovou diversas irregularidades em cerca de 80% de todas estas concessões num período histórico de mais de três décadas, o que remonta a gestões dos Prefeitos José Vicente Elias, Waldyr Salmon, Carlos Antonio Tortato, Mário Manoel das Dores Roque, José Baka Filho e Edison de Oliveira Kersten.
O JB Litoral teve acesso ao processo investigativo, recomendação e TAC firmado entre a prefeitura e o MPPR no dia 16 do mês passado, assinado pelo prefeito e pelo Promotor de Justiça, Drº Leonardo Dumke Bussato, do Grupo Especializado na Proteção do Patrimônio Público e no Combate à Improbidade Administrativa do Litoral (GEPATRIA).
Um levantamento nos documentos feito pela reportagem mostrou que a atual gestão repassou ao GEPATRIA somente 126 decretos municipais de concessão e permissão dos 180 citados no processo de investigação.
Destes decretos enviados, a grande maioria, um total de 77, foi assinado pelo Prefeito Mário Roque nos períodos de suas duas gestões (1997 a 2000 e 2001 a 2004). Entretanto, na relação repassada pela prefeitura consta a informação de apenas 92 lugares de uso comercial, alguns deles, nem mais existem.
Há, ainda, 44 decretos assinados pelo Prefeito José Baka Filho, cinco por Vicente Elias, quatro por Carlos Tortato, dois por Waldir Salmon e apenas um pelo Prefeito Kersten.
Mercado, Rodoviária e Ilha dos Valadares
São 30 no piso inferior, no novo Mercado Nilton Abel de Lima, na área de hortifrutigranjeiros, porém, um deles sem decreto de concessão e consta apenas um nome “Laudeci”, todos do ano de 2010. Mais 18, um deles sem decreto e identificado como sendo da “Barcopar”, na área de restaurante, cafeteria, lanchonete, floricultura, artesanato, confecções e salão de beleza. Os decretos são dos anos de 1989, 1992, 1993, 2004, 2010 e outros sequer mostram data e número. Tem, também, 21 no Mercado do Café e um sem decreto, datas que variam dos anos de 1992, 1993 e 2004. No Terminal Rodoviário são 12 pontos com lanchonete, revistaria, venda de passagens, guarda volumes, barbearia, restaurante e lan house, que também não existe mais. Todos dos anos de 1998, 1999, 2000, 2004 e 2004. Na Passarela da Ilha existem três pontos na área de lanches, sucos e lanchonete dos anos de 1999, 2001 e 2002 e na Praça Ciro Abalem são seis e um sem decreto no ramo de salgados, doces, frutas, calde de cana e conservas, sem informação dos números e datas dos decretos.
Irregularidades históricas e recorrentes
Ao longo de 34 anos a investigação do MPPR levantou diversas irregularidades cometidas nas concessões na escolha dos particulares beneficiados, a qual se deu, segundo consta no documento, “por meio de simples decreto do Poder Executivo, permitindo, evidentemente, a prática de favorecimentos políticos, sem se assegurar igualdade de condições a eventuais outros interessados em explorar comercialmente os espaços disponibilizados”.
Entre as irregularidades, foi constatado que vários imóveis sequer estavam sendo ocupados pelo particular originalmente beneficiado pelo ato da administração municipal e, em muitos deles, o pagamento de despesas de manutenção – como água e energia elétrica – vinha sendo feito pela prefeitura, em prejuízo do erário, uma vez que cabe aos permissionários a responsabilidade de arcar com as despesas de manutenção e funcionamento.
Vale destacar, ainda, que a venda ou entrega dos espaços a terceiros é ilegal, uma vez que o local é público. Também foi constatada a prática da sublocação, algo que não é permitido. Ocorrendo isto, além do atual ocupante pagar um aluguel ao proprietário, as despesas de manutenção também não estavam sendo efetuadas, segundo conta no TAC.
Revogação dos decretos até o dia 28
No acordo firmando com o Ministério Público, a prefeitura deverá revogar todos os decretos de concessão e permissão, que se encontrem ocupados, até o dia 28 deste mês e notificá-los, até dia 31 de março. A desocupação dos espaços deve ocorrer até o dia 31 de julho e, caso não ocorra, deverá ajuizar ação de reintegração de posse até o dia 31 de agosto. Entretanto, caso a prefeitura opte por manter a concessão e permissão deverá fazê-lo mediante concessão de uso, a título oneroso, precedida de licitação, na modalidade de concorrência pública, cujo edital deverá ser publicado até o dia 30 de abril. O contrato deverá ser feito por tempo determinado, consta no TAC.
Prefeitura informa permissionários
O anúncio da necessidade de regularização das concessões dos espaços públicos gerou polêmica e ganhou as redes socais com todo o tipo de informações.
Com isto, a prefeitura se reuniu com permissionários para falar sobre o Termo de Ajustamento de Conduta assinado entre o Ministério Público e o Município. “Queremos fazer tudo dentro da lei para que não haja transtornos futuros”, disse o Prefeito Marcelo Roque. “A situação não começou do dia para a noite, mas há muitos anos. Não foi iniciada por esta gestão, mas estamos fazendo o que a lei determina, embora seja uma atitude impopular. Estamos trabalhando para que o permissionário tenha tempo de se regulamentar”, completou.
De acordo com o Controlador da Prefeitura, Drº Raul Luck, uma licitação deverá ser feita para garantir o uso do espaço por um período de sete anos, podendo ser prorrogável por mais sete. O edital ainda não foi feito, pois encontra-se em estudo e preparação.
Em caso de descumprimento do acordo, o prefeito e o secretário municipal de Serviços Urbanos de Paranaguá incorrerão em multa pessoal e solidária no valor de R$ 5 mil para cada espaço público em situação irregular, além de estarem sujeitos a responder ação civil pública pela prática de ato de improbidade administrativa.
Clubes não entraram no TAC
Vale destacar que nesta TAC espaços usados por clubes, como Robalos Rebeldes, Aero Parking, Equipe Águia Clube de Ultraleve de Paranaguá e Céu Azul Paraquedismo, que também usam área pública por meio de suas sedes, não constaram no documento e na investigação. Entretanto, o prédio onde funcionou o Grupo de Apoio ao Programa Educação Respiratória (GAPER), que estava em área pública, em 2014, foi demolido para dar lugar à Unidade de Pronto Atendimento (UPA), a qual o Governo Federal construiu em parceria com a prefeitura municipal.
STF prevê permissão sem licitação
Esta polêmica acabou ganhando as redes sociais e, no domingo (18), o Diretor do Departamento de Outorgas da Secretaria Nacional de Portos (SEP), Ogarito Borgias Linhares, postou uma decisão do Supremo Tribunal de Federal (STF), que prevê permissionário sem a necessidade de fazer licitação, como recomenda o MPPR.
Ele explica que é preciso haver uma posição da Câmara Municipal que autorize a renovação geral de todas as permissões, aliado a um programa de ajustes das distorções, como não pagamento de luz, água e ainda arrendamento para terceiros. “Retirar o pessoal num momento de crise como este, será traumático e socialmente injusto”, defende Linhares. Ele explicou que a decisão é do Poder Executivo, que não pode ser obrigado a licitar permissões, porque não é o que prevê a legislação. “Não se trata de prestação de serviço público e sim de uso de espaço público em caráter precário”, orientou.