Costurando laços de amizade e transformação: curso de Corte e Costura vai além das agulhas no Sesc Paranaguá


Por Luiza Rampelotti Publicado 01/09/2023 às 09h39 Atualizado 18/02/2024 às 22h04

Em meio aos sons ritmados de máquinas de costura, os olhares concentrados e sorrisos de realização marcam o ambiente do SESC Paranaguá, onde o curso de Corte e Costura se tornou muito mais do que uma atividade educativa; agora as aulas são o ponto de encontro que ultrapassam as agulhas e linhas, tecendo laços de amizade, de superação e transformação. Ao longo de cinco anos e atendendo cerca de 80 pessoas por mês, o curso tem moldado destinos.

Sob o olhar atento da professora Adriana da Silva Anunciação, a formação tem deixado uma marca na comunidade, conectando pessoas de diferentes idades e trajetórias de vida em torno do amor pelo tecido e pela arte de criar. A professora está há um ano e sete meses à frente das aulas.

Com uma carreira iniciada logo após o nascimento dos filhos, há 16 anos, Adriana não apenas transmite habilidades técnicas, mas também compartilha experiências de vida que inspiram seus alunos a abraçarem aquilo que pode ser um hobby ou uma nova profissão. “Eu transmito para eles o que aconteceu comigo. Como sempre vivi da costura, tento incentivar o máximo que posso, com amor, carinho e mostrando que dá certo viver disso se houver dedicação. Pode ser por um hobby, pode ser como profissão, a costura sempre é bem-vinda”, afirma ao JB Litoral.

Ela destaca que sua jornada na profissão, desde os primeiros passos até a abertura de seu próprio ateliê, depois atuando como professora, serve de exemplo de como a costura pode transformar vidas.

A professora Adriana ensina pelo exemplo como a costura pode transformar vidas. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Descobrindo a arte da costura

Meri Albini, aos 35 anos, descobriu que nunca é tarde para aprender algo novo. Inicialmente atraída pelo artesanato, ela ganhou uma máquina de costura que desencadeou uma jornada de descobertas e realizações.

Com um sorriso nos lábios, Meri compartilha como o curso a transformou de alguém que nem sabia ligar a máquina em uma empreendedora. “Eu era completamente ignorante no assunto; tinha a máquina em casa, porém não sabia nem a colocar em funcionamento. Aquela mesma pessoa, que antes nem sabia como ligá-la, embarcou na jornada de confeccionar bolsas e vendê-las. Agora, estou construindo meu próprio empreendimento”, conta Meri.

Ela começou o curso em agosto do ano passado e, nesse período, já passou a colher os frutos da capacitação. Embora Meri não trabalhe com a costura, ela diz que os itens que faz não ficam muito tempo com ela.

As pessoas veem, gostam e pedem para comprar. Então vou vendendo desse jeito. E é muito legal, porque eu não acreditava que conseguiria fazer algo assim, pensava que era muito difícil, mas quando você se dedica consegue”, diz.

Meri ainda destaca que o espaço no SESC não se trata apenas de um local para aprender a costurar, mas também de um ambiente terapêutico. “Tem pessoas que começaram a vir fazer o curso porque perderam entes queridos, tiveram algum tipo de doença etc. Então aqui se transforma num lugar de conversa, de troca de experiências”, comenta.

Meri Albini é uma das alunas; ela começou o curso depois de ganhar uma máquina de costura e não saber como ligá-la. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Realizando um sonho adiado

Cleusa Gonçalves da Silva, aos 69 anos, decidiu finalmente realizar seu sonho de infância e dedicar-se à costura. Após aprender o básico quando jovem, ela encontrou na aposentadoria a oportunidade de resgatar essa paixão adormecida e dar asas à sua criatividade.

Há um ano ela faz o curso no SESC. “Meu sonho era costurar, e depois de aposentada consegui realizá-lo. Adoro costurar e pintar”, revela com entusiasmo.

Hoje, além de confeccionar roupas, Cleusa também canaliza suas habilidades para o voluntariado, colaborando no grupo Very Good, onde faz reformas e confecciona roupas para doação.

Isso mostra que a costura pode ser uma ferramenta para o nosso próprio autodescobrimento, mas, também, de contribuição para a comunidade”, finaliza.

Depois da aposentadoria, dona Cleusa pôde se dedicar ao sonho de costurar. Ela usa a habilidade para fazer trabalhos voluntários. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Costura além das barreiras

Eliane Perpétua de Oliveira, aos 47 anos, tem uma história de persistência e superação no mundo da costura. Apesar de ter enfrentado desafios e obstáculos em sua jornada, ela encontrou na sala de aula do SESC a oportunidade de aprimorar suas habilidades e construir um novo capítulo em sua história.

Comecei aprender a costurar bem novinha, com a minha mãe, mas só o basiquinho. Teve uma época que parei e fiquei muitos anos sem costurar, porque meu ex-marido não me apoiava. Agora faz uns quatro meses que voltei a lidar com a costura, no SESC, e estou me dedicando”, conta.

Com o apoio do atual marido, ela tem colocado em prática tudo o que aprende no curso e já conseguiu até faturar. “Tudo o que já fiz, como roupas, calças, blusas, vendi. É muito gratificante, porque para quem não sabia quase nada, já começar vendendo é ótimo”, conclui.

Após passar por um casamento no qual não tinha apoio para seus projetos pessoais, Eliane encontrou em um novo amor o suporte necessário para se dedicar à costura. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Transformando a paixão em um empreendimento de sucesso

Carmelita Santos Gonçalves, aos 51 anos, encontrou no curso de corte e costura uma forma de unir sua paixão pelo artesanato com a possibilidade de confeccionar suas próprias costuras. Professora de artesanato, ela se viu atraída pelo mundo das agulhas e linhas e agora dá vida às suas criações.

Comecei o curso porque faço bastante boneco de fantoche, e eles têm que ter roupa. Eu fazia a cabeça, o corpo, mas para a roupa, sempre tinha que pedir a uma costureira. Então decidi aprender”, conta.

Há seis meses no curso, Carmelita já confecciona as roupinhas dos fantoches e, inclusive, vários outros itens. “Aprendi a fazer necessaire, da primeira que fiz, já consegui vender 70. Já fiz bolsa, avental, e também vendi tudo. Esse aprendizado me trouxe uma renda extra”, comenta.

Ela destaca que o curso não apenas expandiu seus horizontes criativos, mas também abriu portas para empreender e compartilhar suas criações com o mundo.

Artesã de mão cheia, dona Carmelita aprendeu a costurar para poder fazer as roupas dos fantoches que confecciona. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Costura que cura

Aos 75 anos e viúvo há dois, Antônio Farias dos Santos descobriu uma forma terapêutica de preencher os dias e criar uma conexão profunda com suas memórias e habilidades. Na sala do curso, ele encontra um refúgio para sua alma e um escape criativo em meio às marcas do tempo.

Natural do Piauí e há décadas estabelecido no Sul do país, Seu Antônio carrega consigo uma habilidade que o acompanha há muitos anos: a costura. “Eu sei costurar, já sabia fazer isso muito bem antes, mas costurava em casa”, compartilha com um sorriso nostálgico.

Há cerca de 20 anos, ele realizou o primeiro curso de costura. No entanto, a vida o afastou dessa paixão por um tempo, até que uma oportunidade apareceu: um novo curso, trazido por um desejo interno e também a pedido de seu médico.

O médico perguntou: ‘Antônio, o que que você mais gosta de fazer?’. Eu disse, ‘olha, o que adoro fazer é costurar’. E o médico falou: ‘pois que bom, agora você procura um lugar para ter um incentivo para passar por esse momento que você está passando’”, relata.

O momento ao qual Seu Antônio se refere é o luto pela perda de sua esposa, um companheirismo que durou quase 30 anos. Enfrentar a solidão não é fácil, mas ele encontrou na atividade um aliado que vai além das linhas e tecidos.

Aos 75 anos e viúvo, seu Antônio voltou a praticar sua paixão: a costura. Ele aprende e também ensina no curso do Sesc. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Arte transformadora

Hoje, Seu Antônio se dedica à máquina de costura com um novo propósito. “Ao invés de ficar sofrendo, vou para a máquina, quando não estou fazendo comida, estou costurando”, revela com um brilho nos olhos.

No curso, ele não só aprimora suas habilidades, mas também compartilha seus conhecimentos com outros participantes. Ele recorda que foi sua primeira esposa, uma costureira, quem o ensinou essa arte, um legado que ele carrega até hoje.

Seu Antônio não está apenas tecendo peças de roupa; ele está reconstruindo sua vida com fios de coragem, determinação e criatividade. “Não tem jeito, a pessoa que aprender a costurar se apaixona”, afirma com convicção.

O curso de corte e costura do SESC Paranaguá não é apenas um espaço para aprender habilidades técnicas, mas um local de encontro onde histórias se cruzam, laços se formam e vidas são transformadas. Da professora Adriana aos alunos Meri, Cleusa, Eliane, Carmelita e Antônio, essas histórias ressaltam a riqueza e diversidade que essa atividade pode trazer para uma comunidade, unindo gerações de forma única e inspiradora.