Funai retoma demarcação de terra indígena em Pontal do Paraná para garantir preservação do povo Guarani Mbyá


Por Redação Publicado 21/08/2023 às 10h42 Atualizado 18/02/2024 às 20h51
Somente a família Timóteo, composta por 6 pessoas, vive na aldeia Karaguatá Poty. Foto: Diogo Monteiro/JB Litoral

A Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) retomou o processo de demarcação da Terra Indígena (TI) Sambaqui, mais conhecida como aldeia Karaguatá Poty, no Guaraguaçu, em Pontal do Paraná, conforme recomendação do Ministério Público Federal (MPF). O território é de ocupação tradicional do povo indígena Guarani Mbyá.

O processo de demarcação da área estava em uma das etapas finais em janeiro de 2020. Porém, o então ministro da Justiça, Sérgio Moro, mandou o processo de volta à Funai baseado no parecer do ex-presidente Michel Temer, que impunha a aplicação administrativa do chamado “Marco Temporal”, uma interpretação jurídica não prevista na Constituição.

Segundo essa tese, os indígenas que não estavam em suas terras em outubro de 1988 (data de promulgação da Constituição) ou que não lutaram por elas, não teriam mais direito algum sobre as terras, ainda que sobre elas existissem pareceres antropológicos demonstrando que pertenceram a seus antepassados.

Na ocasião, Moro devolveu à Funai 17 processos de demarcação de terras indígenas, e a TI Sambaqui, de Pontal, estava entre elas. Na época, o então ministro agiu de acordo com a promessa de campanha do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), que proclamava que nem “um centímetro quadrado a mais de terra indígena” seria demarcado enquanto fosse presidente.

Aldeia Karaguatá Poty

Com a mudança na gestão do Governo Federal, o MPF enviou uma recomendação à Fundação em fevereiro de 2023 para que retomasse a demarcação da Terra Indígena Sambaqui, a fim de garantir a sobrevivência dos povos originários na região.

De acordo com o órgão, o Guarani Mbyá possui uma população de cerca de 200 mil pessoas em todo o mundo, com pouco mais de 74 mil em território brasileiro, constituindo o grupo indígena mais numeroso do país.

Ao justificar a importância da demarcação, o Ministério Público ainda aponta que o passado histórico do Litoral do Paraná e a farta documentação disponível comprovam a presença indígena e o movimento dos Mbyá em busca de antigos territórios na costa litorânea, na década de 1940.

A aldeia Karaguatá Poty é uma das sete existentes no Litoral. Para chegar até ela, é necessário percorrer 12 quilômetros pela Estrada Ecoturística, de chão batido, que pode ser percorrida de carro e é considerada uma das últimas áreas ao longo do litoral paranaense que apresenta ambientes com características primitivas ainda intactas.

Ela é formada por apenas uma família, composta por 6 membros: a liderança indígena Florinda Timóteo, seu marido (o cacique Irineu), suas duas filhas Lúcia e Eliane, e seus dois netos, uma bebê menor de 1 ano e uma criança de 4 anos.

A gente mora aqui desde 1999. Viemos do Rio Grande do Sul, depois fomos para Guaraqueçaba, para a Ilha da Cotinga e, então, para o Guaraguaçu. Antes, moravam 17 famílias aqui, mas o lugar não é bom e todos foram embora. Só a gente ficou”, comenta Florinda ao JB Litoral.

Importância da terra para o povo Guarani Mbyá

A Terra Indígena Sambaqui está localizada em uma planície arenosa, no interior da Mata Atlântica-Serra do Mar. A TI abrange 2.795 hectares, com perímetro aproximado de 38 km, o que a enquadra no conceito de terra tradicionalmente ocupada pelos indígenas, conforme artigo 231 da Constituição Federal.

São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens”, aponta a Constituição.

A TI é composta por duas aldeias ligadas por vínculos de parentesco: Tekoa Karaguata e Tekoa Guaviraty, conhecidas em português como Sambaqui e Xangrilá, respectivamente.

Conforme estudos antropológicos da Funai, a manutenção da TI Sambaqui no Litoral do Paraná é essencial por se tratar de uma região com disponibilidade de recursos naturais imprescindíveis para a reprodução física e cultural do grupo indígena. Além disso, a área possui o sítio arqueológico do Sambaqui, de grande valor simbólico para o povo Mbyá.

*Com informações do MPF e do Terras Indígenas no Brasil