Indígena de Pontal do Paraná representa o Litoral na Feira Nacional de Ciências, em Brasília


Por Amanda Batista Publicado 10/09/2023 às 21h03 Atualizado 18/02/2024 às 22h58

Liliane Acosta Hortega, ou simplesmente Jaxuka, em Guarani, é aluna da Escola Estadual Indígena Guavira Poty, do balneário Shangri-lá, em Pontal do Paraná. Neste ano, a estudante de apenas 16 anos desenvolveu o projeto “Observatório Solar Tekoa Guaviraty” e foi selecionada para participar da 4º Mostra Nacional de Feira de Ciências, em Brasília.

Nesta segunda-feira (11), ela embarca pela segunda vez para a capital do país. Para chegar até a feira nacional, ela desenvolveu um longo trabalho com ajuda das orientadoras Renata Zuba, Nahyr Carneiro e Patrícia Faustino. O objetivo era criar algo que, para além de científico, fizesse parte da cultura Guarani Mbyá. Foi assim que surgiu a ideia de criar o observatório solar que utiliza a sombra de uma haste chamada “gnômon” para observação da passagem do tempo por meio do movimento solar.

Inicialmente, elas construíram o observatório na praia, com ajuda do cacique (Chamai, em Guarani) Dionísio Rodrigues e do ancião da aldeia Tekoa Guaviraty, João Acosta, na manhã do primeiro dia da primavera de 2022, em 22 de setembro. Em paralelo à construção, os alunos do colégio indígena e estudantes da Universidade Federal do Paraná (UFPR) receberam uma capacitação para entenderem a importância da ferramenta aos povos originários.

Resgate dos conhecimentos ancestrais


De acordo com Liliane, a pesquisa resgata os conhecimentos ancestrais do povo Guarani antigo, os Taviterã, sobre o reconhecimento das estações do ano, o planejamento de épocas de plantio e a localização geográfica através do movimento do sol.

O observatório é constituído por uma haste e por seixos formados por rochas. Ele possui uma forma circular para representar a Terra e as rochas maiores marcam os pontos cardeais, pontos colaterais e o nascer e o pôr do Sol durante o ano, tudo isso na língua do povo Guarani Mbyá.

Ele era usado para a pessoa não se perder, para saber quando era a melhor época para plantar, saber a hora, entre outras coisas. Tinha várias funções, mas foi algo que a gente perdeu o costume com o tempo”, explica a estudante indígena.

Após a construção da réplica na aldeia, a professora Nahyr Carneiro inscreveu o projeto na XI Feira Regional de Ciências do Litoral do Paraná, da UFPR de Matinhos, onde o observatório ficou em primeiro lugar em sua categoria. “Nós inscrevemos três projetos na feira: o observatório da Lili, o estudo da palmeira jussara e o estudo das águas. A princípio, explicamos aos alunos que era um ambiente muito competitivo, que é normal não conseguir um prêmio, mas que era uma vitória estarmos ali, já que havia uma pré-seleção”, conta a professora.

Mas, para a nossa surpresa, todos eles subiram ao pódio e o observatório conquistou o primeiro lugar”, comemora Nahyr.

Reconhecimento nacional


Após vencer a amostra regional na UFPR de Matinhos, e a estadual, na UFPR de Curitiba, em março deste ano, o projeto foi o único do Litoral a ser selecionado para a 5ª Conferência Nacional de Alternativas Para Uma Nova Educação (V CONANE), realizada também em março, na Universidade de Brasília. Já em abril, ele foi um dos três projetos do Paraná selecionados para a 4º Mostra Nacional de Feira de Ciências, financiada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação.

Durante todas as apresentações, Liliane exibe o observatório em português e em Guarani, para os alunos indígenas que também participam das competições. Ela conta que nunca imaginou que alcançaria a feira nacional com o projeto.

Achei que não estava indo bem na apresentação e disse para minha amiga que ia perder. Quando me chamaram lá para a frente e disseram que ganhei em primeiro lugar, meu coração ficou acelerado. Ali eu falei que ia seguir em frente na ciência, porque cheguei aonde nunca imaginei”, conta.

Com as malas prontas para embarcar para Brasília, ela diz que está contente por poder mostrar um pouco da sua cultura na capital do país. “Vou continuar estudando o observatório e minha cultura para não perder as raízes da minha etnia, para mostrar às pessoas que o observatório é importante para nós, indígenas. Alguns já esqueceram como ele funciona, mas tem famílias que ainda entendem, o importante é não esquecer como a gente vive”, finaliza Liliane.