Jornalismo na veia: Gilberto Fernandes será lembrado pelo amor à profissão


Por Luiza Rampelotti Publicado 05/04/2022 às 14h00 Atualizado 17/02/2024 às 05h34
Ao longo de sua trajetória, Gilberto conquistou grandes amigos das mais diversas áreas da comunidade.

Na quarta-feira (30), o jornalista e fundador do JB Litoral, Gilberto Fernandes, faleceu aos 62 anos após complicações em uma cirurgia cardíaca. Gil, como era carinhosamente chamado pelos amigos e família, deixou seis filhos e sete netos, além de incontáveis amigos e admiradores de seu trabalho.

O início dele no jornalismo, na década de 80, foi meio que por acidente. Ele começou como entregador no jornal O Imparcial, de Walter Ezequiel Coelho, e logo descobriu a paixão pela profissão. A partir daí, focou seus esforços em aperfeiçoar-se no jornalismo.

“O Gil começou como office boy, deixando jornal na banquinha, buscando o que era vendido, mas logo se interessou pela área e foi entrando para a produção do jornal e, dali, não parou mais. Continuou a seguir na profissão. Ele sempre foi atuante, fazia a diferença, começou como entregador e logo estava pegando matéria. O jornalismo estava na veia dele”, relembra Henrique Coelho, filho de Walter e parceiro de trabalho no início da caminhada.

Em seguida, foi convidado por Ivan Bueno para auxiliar na criação do impresso Folha de Paranaguá. Por lá, estreitou laços nas áreas política e sindical, absorvendo ainda mais experiência e bagagem para o próximo desafio: apoiar na concepção do jornal Folha do Litoral, de Joel Bonzatto. Ali, ele atuou durante anos como jornalista e colunista, e ficou conhecido por suas opiniões e críticas contundentes e ácidas, além das cobranças ao Poder Público.

Boas lembranças


Falar de Gilberto Fernandes é muito fácil. Foi uma pessoa especial e um dos melhores jornalistas da cidade, se não o melhor. Sou suspeito em falar pela admiração que tinha por ele, pois quando eu era o presidente da Folha do Litoral, ele era mais que um funcionário, como ele mesmo dizia, considerava o meu pai um segundo pai e eu um irmão mais novo. Aprendi muito com o Gil sobre jornalismo e partido político quando fui, durante anos, presidente do PPS. Sei que ele está em um lugar especial. Agora ficam as lembranças de quem teve o privilégio de conviver com ele”, diz Joel Bonzatto Junior.

Ao mesmo tempo em que trabalhava na Folha do Litoral, Gilberto assumiu um compromisso como assessor parlamentar do então deputado estadual Waldir Leite (PPS), de 2003 a 2006. Na Assembleia Legislativa, ele continuou fortalecendo as relações políticas, mas não deixou de lado os vínculos sindicais. No jornalismo, ele sempre fez coberturas da área sindical e, assim, construiu amizades, fontes e, também, aprendeu muito.

Em 2009, decidiu correr atrás do próprio sonho e fundou o promissor Jornal dos Bairros, que era distribuído gratuitamente e noticiava questões comunitárias. Com a ajuda da filha Jéssica Fernandes, o pequeno jornal foi crescendo e logo se tornou um veículo de comunicação completo, que trazia notícias sobre as diversas áreas da sociedade.

Legado no jornalismo


Com o decorrer do tempo, o Jornal dos Bairros se tornou o JB Litoral e passou a ser comercializado nas sete cidades do Litoral. “Estar ao lado do meu pai, desde o início da fundação de seu sonho, foi um privilégio inexplicável. Ter a oportunidade de aprender sobre a profissão que tanto amava com ele, é o que fez toda a diferença na minha forma de conduzir o JB.. Sempre focando no jornalismo que ele fazia, que era o jornalismo de serviço público, que realmente representava os interesses da comunidade, questionando o que havia de errado. Tudo o que eu sei, aprendi com o meu pai, que nunca mediu esforços em passar o seu conhecimento adquirido com a própria experiência para quem se interessasse. Quem eu sou hoje, devo a ele. E minha missão é honrar o seu legado, seu nome, o nome do jornal dele e nunca deixar o jornalismo de interesse público morrer, que é o que mais prezava”, comenta Jéssica Fernandes.

Apesar de estar aposentado nos últimos anos, Gilberto não conseguia deixar o jornalismo de lado e criou o Blog do Gil para continuar fazendo seus comentários e críticas sobre o que achava relevante, especialmente sobre política e sindicatos. Defendia suas ideias com unhas e dentes e, por meio de seu blog, conquistou mais liberdade para dizer o que pensava sem se preocupar com a responsabilidade de chefiar um veículo de comunicação.

Ao longo dos anos, conquistou muitos amigos, conhecidos e até inimigos, mas o fato é que Gil nunca passou despercebido. Um dos grandes amigos foi Sérgio Marinho, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Alimentação de Paranaguá e Litoral (STIA). “O Gil sempre foi um cara aguerrido, que teve pé no chão, mas sempre com suas convicções fortíssimas. Para nós, que fazemos parte dos representantes dos trabalhadores, ele foi um grande homem, que nos ensinou a estar sempre baseados nas leis, com segurança jurídica. Ele deixa um legado dentro do jornalismo, dentro dos trabalhadores portuários e do sindicalismo urbano. Sempre foi um formador de opinião e, para mim, um mestre. Já está fazendo muita falta, aprendi muito com ele. O Gil buscou a honestidade, o caminho correto, fazer o bem sem olhar a quem. Naquela simplicidade dele, jeito carinhoso de falar conosco, nos ensinava muito”, homenageia Sérgio.

Grandes amigos


Na área política, também fez muitos amigos, mas, como todo jornalista que ousa falar a verdade e cobrar resultados, teve alguns desafetos. O ex-vereador Mário Gonçalves, que assumiu a cadeira legislativa na década de 90, relembra de Gilberto Fernandes com carinho.

Apesar de conhecer o Gilberto desde menino, pela amizade com o seu irmão mais velho, Dino, vim a ter uma maior convivência com o Gil quando fui vereador. Ele trabalhava no jornal do Ivan Bueno, vindo mais tarde a escrever na Folha do Litoral, e era frequentador assíduo das sessões da Câmara de Vereadores. Inteligente e perspicaz, embora, muitas vezes, controverso nas opiniões, demonstrava sempre o seu amor pela política e pela cidade de Paranaguá. Conseguiu realizar o seu sonho de fazer o próprio jornal, primeiro com o Jornal dos Bairros, que mais tarde se transformou no JB Litoral e um dos principais veículos de imprensa do Litoral do Paraná, hoje administrado pela “Filhota”, como gostava de se referir à filha Jéssica, de quem tinha muito orgulho.  Lamento profundamente sua partida tão repentina e prematura. Tenho certeza de que o companheiro Gil deixou aberta uma grande lacuna no jornalismo-político de nossa cidade”, comenta.

Até mesmo no meio da imprensa local, entre concorrentes, Gilberto foi um profissional admirado. Claudino Nunes, jornalista e proprietário do portal Agora Litoral, também conta sobre sua relação com Gil. “Trabalhamos juntos na Folha do Litoral e tínhamos um acordo: ele escrevia o que lhe vinha na cabeça, numa coluna diária chamada Folha Urgente, e eu aceitava ou cortava o que “passava da conta” (geralmente críticas que renderiam um processo contra o jornal). Eu lia junto com o Gil e ríamos muito, principalmente das partes que seriam cortadas. – “Imagina a m… que isso não iria dar, Gil”, falava pra ele. E o Gilberto ironizava: – “Não é problema meu. Eu quero é ver o circo pegar fogo…”. Éramos sobreviventes na profissão, mas a vida nos levou para caminhos distintos: ele para o jornalismo impresso e eu para o online. Sempre admirei a forma como o Gilberto se dedicava à família. Brincávamos que até podíamos não ser bons maridos ou namorados, mas como pais a gente dava de 10 a zero na maioria. Fico feliz por ele não ter mudado com o tempo”, diz.

Marca da amizade


Outro grande amigo, Edson Pedro da Veiga, ex-vereador e associado ao Rotary Club, também relembra a amizade com Gil e faz uma bela homenagem. “Amizade, assim começo o descritivo da minha convivência de muitos anos com o Gilberto Fernandes, de tanto tempo que se perde num passado longínquo. Amizade, porque mesmo tendo tantas diferenças (futebol, política, etc.), éramos respeitosos no modo de conviver. Amizade que, por mais de ano, me liberou coluna no JB para, semanalmente, postar notícias do Rotary International e do Rotary Club de Paranaguá Rocio, levando mensagens de Ética e do Servir. Amizade onde confidenciamos momentos bons e difíceis que passamos ao longo da vida, onde testemunhei sua luta para atingir o seu objetivo de construir um veículo de comunicação. Desta amizade fica um vazio, porém, a marca de bons momentos vividos e a saudade que deixou”, finaliza.