Médico se desculpa por ter pedido para crianças serem “escudo humano” em manifestação na BR-277


Por Redação Publicado 09/11/2022 às 12h37 Atualizado 17/02/2024 às 21h02
Pedro dantas, médico

Na quarta-feira (2), o JB Litoral divulgou uma reportagem e um vídeo que mostrava o médico psiquiatra Pedro Pessoa Ribeiro Dantas, de Paranaguá, pedindo para que idosos, mulheres e crianças fossem “escudos humanos” contra possível ação da Polícia Rodoviária Federal (PRF) durante manifestação dos caminhoneiros na BR-277, KM 5. O vídeo ganhou repercussão nacional e diversos influenciadores, páginas e portais divulgaram as declarações do médico.

Procurado pelo JB Litoral para esclarecer as falas, Pedro Dantas afirmou que cometeu um equívoco ao usar a palavra “crianças”. “Eu falei que nós teríamos que proteger os caminhoneiros, porque peguei um carinho muito grande por eles, pelo amor que têm ao Brasil. Falei idoso porque sou idoso, tenho 70 anos, falei mulher porque minha esposa também estava lá e disposta a ficar, mas crianças foi realmente algo mal colocado. Tenho vergonha de ter dito assim, mas o resto eu falaria novamente, porque eles são responsáveis e estavam ali voluntariamente”, disse.


Entenda


Em uma live realizada na quarta-feira (2), por volta das 17h30, e publicada nas redes sociais, é possível observar que várias pessoas continuavam bloqueando parte da BR-277, no KM 5, próximo ao Posto Aldo, em Paranaguá, em apoio aos caminhoneiros que estavam interditando a rodovia em busca de intervenção federal por se oporem ao resultado das eleições do dia 30 de outubro, que elegeram Luiz Inácio Lula da Silva (PT) como o próximo presidente do Brasil. Em determinado momento, o psiquiatra Pedro Dantas pega o microfone e começa a discursar incentivando que a população permaneça no local.

A gente não pode deixar isso aqui abandonado só com os caminhoneiros, porque eles [a polícia] vão vir aqui e mandar os caminhoneiros saírem. Nós temos que manter vigília aqui de madrugada, quem puder; quem não puder vai para casa e volta mais tarde, porque de madrugada, se isso aqui ficar vazio e não tiver ninguém para ficar na frente dos caminhões, não vai ter como não tirar os caminhões”, disse.

Na continuidade de seu discurso, ele falou que “ninguém está afim de levar bala de borracha e porrada”. Segundo ele, o que protege os caminhoneiros é o povo, “são as senhoras, as pessoas mais idosas, nós é que protegemos eles, porque eles [a polícia] não vão dar porrada em mulher, em criança”.

Eles [a polícia] não são covardes, por enquanto ainda não é a polícia de Maduro que temos aqui. Daqui a pouco, se essa coisa que eu não quero dizer o nome assumir, vai ser a polícia de Maduro, igualzinha a polícia de Fidel, que não tá nem aí para criança, para mulher, para nada”, comentou.


Escudo humano para proteger o movimento”, disse o médico


O médico pediu para que todos os manifestantes continuassem no local para que os policiais não pudessem cumprir a ordem que receberam. Segundo ele, nem os policiais queriam cumprir a determinação para desbloqueio das vias.

Só que se não tiver outra maneira, eles vão ser obrigados a cumprir, porque não vão ter desculpas para dizer o porquê não cumpriram. Agora, se tiver criança, mulher, idoso na frente dos caminhões eles não vão botar a mão, com certeza. Nós precisamos ter esse escudo humano para proteger o movimento”, disse.

Ele ainda previu que os policiais realizariam a tentativa de desbloqueio no período da madrugada. “Se eles forem espertos, eles vêm pela madrugada, que é a hora de vir. É assim que eles vão agir se forem espertos. Então não vamos abandonar isso aqui em momento algum”, concluiu.

Pedido de desculpas


Após a repercussão negativa do vídeo, Pedro contou que sequer está acessando as redes sociais “para não se irritar”, mas que foi alertado de que “as pessoas estão dizendo como se eu tivesse mandando as crianças e mulheres irem para linha de frente apanhar no lugar dos outros”.

Se pegarem o vídeo por inteiro, sem tirar do contexto a minha fala, eu falei que essas pessoas, estando ali, a polícia teria uma desculpa para não fazer [desobstruir a via], porque eu creio que a própria polícia não queria fazer nada, eles só estavam cumprindo ordens. Não era para elas estarem ali para apanhar no lugar dos caminhoneiros, era uma defesa moral, não física”, explicou.

Novamente o médico se desculpou pelas falas que incluíram as crianças. “Ninguém era obrigado a ir, as pessoas iriam voluntariamente. Por isso o que eu falei foi totalmente errado, porque criança não vai voluntariamente. Não era minha intenção falar isso, quando vi, saiu sem querer”, finalizou.

Medidas legais


Devido o teor do vídeo, o Ministério Público do Paraná (MPPR), o Conselho Regional de Medicina e outras autoridades foram marcadas na publicação centenas de vezes por perfis pessoais. As pessoas pediam que os órgãos tomassem alguma atitude com relação ao caso.

De acordo com o MPPR, “a respeito das informações veiculadas, e considerando que o médico que supostamente aparece nas imagens é servidor municipal de Paranaguá, o MPPR, por meio da 4ª Promotoria de Justiça de Paranaguá, que tem atribuição nas áreas de Proteção à Saúde e ao Patrimônio Público, instaurou Notícia de Fato, que tramita sob sigilo para apuração das notícias relacionadas ao caso”, informou.

Além disso, a 5ª Promotoria de Justiça de Paranaguá, que tem atribuição na área da Infância e Juventude, após ter conhecimento das informações divulgadas pela imprensa e que circularam em redes sociais, instaurou Notícia de Fato para verificar eventuais situações de risco envolvendo crianças e adolescentes em manifestações que ainda estavam ocorrendo, na sexta-feira (4), às margens das rodovias da cidade.

Já o Conselho Regional de Medicina do Paraná (CRM/PR) informou que não recebeu denúncia contra o médico. “Há compartilhamento de vídeo que o mostra, em conduta pessoal, mas não tivemos nenhuma denúncia formalizada”, disse.

O órgão afirmou que a questão será analisada pela Corregedoria, para ver se há entendimento de possível ilícito ético enquanto profissional de medicina.

Preso em abril


Pedro Pessoa Ribeiro Dantas é médico psiquiatra da Prefeitura de Paranaguá desde 2012. Em abril deste ano, ele chegou a ficar preso por dois dias na Cadeia Pública devido à prisão em flagrante pelos crimes de porte ilegal de arma de fogo, ameaça e vias de fato.

De acordo com o Boletim de Ocorrência, portando uma arma de fogo na cintura, Pedro foi a casa de um homem tomar satisfação por uma discussão que ele teria tido com sua sogra em data anterior, e foi agredido pelas pessoas que residiam ali.

O documento informa que Pedro chegou ao endereço e passou a injuriar o homem, dizendo que iria “moê-lo no pau”, até que, em certo momento, o filho – menor de idade – do homem abriu o portão para o pai sair e foi atingido com um soco no maxilar pelo médico, que invadiu a casa. Conforme o B.O., o proprietário da casa reagiu a agressão contra seu filho, dando um soco no rosto de Pedro e imobilizando-o; neste momento, a arma teria caído no chão e sido recolhida pela esposa do homem.

Na sequência, duas pessoas que passavam por eles separaram a briga e o médico saiu do local, sabendo que a polícia teria sido acionada. O Boletim de Ocorrência ainda afirma que o proprietário da casa entregou a arma de fogo de Pedro (uma pistola Taurus PT 58 HC Plus, calibre .380) à Polícia Militar.

Como a arma não era registrada, o médico foi apresentado na delegacia e entregue ao plantão da Polícia Civil, sendo preso em flagrante por porte ilegal de arma de fogo. Sobre a situação, ele disse ao JB Litoral que realmente foi ao local armado, mas não usou a arma.

Vieram em quatro para cima de mim, chegaram a me bater, e eu não puxei a arma, porque eu não quis matar ninguém. Eu acho totalmente errado morar num lugar isolado, como eu moro, e não poder pegar a arma, é a minha proteção. Eu tenho medo de sair sem arma. Não estou dizendo que é certo, porque a lei é clara, mas sou contra do ponto de vista moral”, concluiu.