Projeto Amor Solidário muda a vida de jovens e crianças parnanguaras por meio do esporte


Por Amanda Batista Publicado 31/08/2023 às 16h12 Atualizado 18/02/2024 às 21h59
projeto amor solidario marcio e angelica

Com uma panela de sopa, um grupo de amigos e um propósito em comum, o projeto Amor Solidário nasceu da vontade de suprir as necessidades básicas daqueles que mais precisam. A ideia surgiu há 8 anos, quando Angélica Mesquita, natural de Santos-SP, resolveu distribuir sopa para comunidades carentes de Paranaguá.

No início, ela fazia os pratos em casa, com a ajuda de amigas. Após preparar as refeições, saía pelos bairros distribuindo o alimento. Não importava o horário ou local, Angélica partia sem medo para levar comida às famílias socialmente vulneráveis e pessoas em situação de rua. O trabalho voluntário lhe rendeu o título de “moça da sopa”, que, até hoje, a segue por onde passa.

Começamos auxiliando pessoas em situação de rua com as refeições. Mas, depois de um tempo, percebemos que precisávamos expandir nosso alcance, fazer mais, foi ali que surgiu a primeira semente do que hoje chamamos de Amor Solidário”, diz a idealizadora.

Além das refeições, que eram feitas com recursos próprios, ela e o marido, Márcio Mesquita, o “Gigante” da academia de artes marciais OCSJJ, também saíam pelas ruas distribuindo cestas básicas. “Nunca tivemos um ponto fixo. Saíamos de carro pela cidade e quando víamos que as pessoas estavam precisando, ajudávamos”, lembra o Gigante.

projeto amor solidario - marcio e angelica
Angélica e Márcio contaram com apoio de amigos e da comunidade para concretizar o projeto. Foto: Rafael Pinheiro/ JB Litoral.


Ações durante a pandemia


Com o passar do tempo, a residência do casal ficou pequena para a produção, e a Loja Maçônica Gonçalves Ledo cedeu o espaço e contribuiu com doações para que o grupo pudesse continuar cozinhando. Embora tivessem mais espaço e apoio de terceiros, com a chegada da pandemia, os moradores da região começaram a se queixar do volume de pessoas que o projeto atraía para as ruas, por conta do risco de contaminação pelo Covid-19.

Angélica compreendia as queixas, mas sentia que aquele era um momento crucial para a atuação do projeto, já que muitas famílias perderam sua fonte de renda e estavam desamparadas. “Precisávamos de um ponto fixo, e conseguimos graças a uma amiga que cedeu a frente da sua casa, aqui na Vila São Jorge. Também foi através dela que conhecemos mulheres da comunidade que nos ajudam até hoje”, conta.

Edna Cerqueira foi uma das novas amigas que Angélica fez no bairro. Com apoio da voluntária, o Amor Solidário conquistou uma sede que, hoje, além de fazer refeições e doar cestas básicas, presta atendimento médico, odontológico e ensina jiu-jitsu para as crianças da vila.

O carinho e o apego pelos alunos é o que move a voluntária, que toda terça e quinta auxilia no preparo das refeições para as turmas de jiu-jitsu. “Eu entrei no projeto há três anos. Decidi ajudar porque não queria apenas fazer uma doação, queria participar, fazer mais pelas crianças daqui. E a gente percebe que eles gostam de vir, participar das aulas, faça chuva ou faça sol, são muito empenhados”, salienta Edna.

Para Maria Regina Pereira, voluntária de 64 anos, o maior retorno para toda a equipe é receber o carinho das crianças, que acabam se tornando parte da família. “A gente abraça essa causa porque estamos aqui para dar e receber amor, num ciclo de reciprocidade. Quando as crianças chegam, nos abraçam, nos chamam de vovó, e para quem não tem netos ainda, isso é muito gratificante”, diz a senhora.

Angélica Mesquita e as voluntárias Glassi Sampaio, Edna Cerqueira, Márcia Sampaio, Andriele Sampaio, Sandra Rodrigues, Vanessa Santos, Maria Regina e Marlene Santos ajudam a cozinhar para as crianças do projeto. Foto: Rafael Pinheiro/JB Litoral

Início da sede


Márcio conta que a ideia de levar as aulas de jiu-jítsu surgiu durante a distribuição das refeições. Na época, o casal via muitos jovens e crianças soltos pelas ruas, sem ter o que fazer. Como ele é faixa preta de jiu-jitsu do mestre Ocimar Costa, resolveu conversar com o professor para fazerem uma parceria entre o projeto e a OCSJJ, e o mestre apoiou a ideia.

A OCSJJ sempre ajudou projetos, mas não tínhamos um nosso. Então, o mestre Ocimar disse que se tivéssemos uma sede aqui, ele viria dar aulas. Foi assim que nos organizamos para reformar a casa e construir o dojô”, diz o Gigante.

Ocimar destaca que a maior motivação para fazer parte da iniciativa foi ver a união e o empenho do grupo. “O que mais me chamou atenção foi eles terem começado do zero, ver que com muito esforço construíram um ambiente aconchegante para as crianças do bairro, esse já era motivo suficiente para participar”, afirma.

Mas, para colocar a sede em pé não foi fácil. A Loja Maçônica Gonçalves Ledo doou os materiais e, com ajuda dos professores, alunos, moradores, e, especialmente, das mulheres da comunidade, o dojô foi construído e inaugurado no dia 23 de maio deste ano.

Foi graças a Edna que conseguimos construir o dojô. Ela alugou a casa e hoje mora no terreno ao fundo”, ressalta Angélica. “Para colocar as paredes em pé, todos os finais de semana os voluntários vinham trabalhar na obra. Os amigos do Márcio ajudaram na fiação elétrica, nós recebemos doação de materiais, mas fomos nós mulheres que cavamos os buracos da fundação e pintamos o interior”, explica.

Aulas de jiu-jitsu


Com o dojô pronto, o mestre Ocimar Costa, Márcio Mesquita, Lauriane Mendes, Rubens Leguizamon, Edson Fernandes e Rafael Correia, todos faixas preta, começaram a dar aula para 60 alunos de 5 a 19 anos, todas as terças-feiras e quintas-feiras, das 17h30 às 18h30 e das 18h30 às 19h30, além dos sábados, às 15h30. Após as aulas, as crianças jantam no local e voltam para casa alimentadas.

Além das refeições, as famílias das crianças que treinam no local, em sua maioria, recebem cestas básicas do projeto e os alunos que se destacam são convidados para treinar na sede da OCSJJ, no centro de Paranaguá.

Mestre Ocimar, além de dar aulas na OCJSS, dá aulas no bairro toda quinta-feira. Foto: Rafael Pinheiro/ JB Litoral


Estamos fazendo o nosso melhor para trazer cada vez mais alunos ao projeto e tirar as crianças das ruas. Minha esposa, amigas e moradoras que fazem as refeições e as aulas de jiu-jitsu são ministradas por nossos professores de forma voluntária, e coordenadas por nosso mestre, tornando o projeto possível”, destaca Márcio.

Para a mãe de um dos alunos, Ellen Cristina Bandeira Felipe, de 23 anos, o filho se tornou mais obediente e começou a se interessar por esportes após entrar no projeto. “Meu filho entrou há pouco tempo e já percebemos a diferença. Ele fica animado, não perde nem uma aula. Para nós, como mãe, é muito bom saber que nossos filhos estão num lugar seguro e que tem pessoas responsáveis olhando por eles”, afirma.

Doações e parcerias


É com apoio da OCSJJ, da Cardioclínica, do doutor Adriano Baddini, do deputado estadual Alexandre Amaro (Republicanos), além das empresas Supermercado Girardi, Casarão Esporte, Dynamic English, Clínica São Lucas, Loja Maçônica Gonçalves Ledo, Segax, Mago Modas, Instech, World Ginasium, Contabilidade Caldas e Atlanta Agência Marítima, que o projeto se mantém.

Além deles, os atletas da academia e amigos também fazem doações para manter as refeições e uniformes dos alunos. Graças à rede de voluntários, a maior necessidade do projeto é que mais pessoas conheçam e visitem o local para interagirem com os jovens e crianças.

A presença, a atenção e o carinho são coisas que fazem uma grande diferença na vida das crianças e famílias que auxiliamos. Seja por meio de aulas de jiu-jítsu, doações de roupas, kits de maternidade ou simplesmente passando um tempo aqui, todas as formas de apoio são bem-vindas”, salienta Angélica.

Para Márcio, ensinar jiu-jítsu aos jovens e crianças da comunidade é uma forma de transformar a realidade econômica e social deles. Ele explica que o Brasil é conhecido internacionalmente pela qualidade nas artes marciais, mas destaca: o estudo é a prioridade e todos os alunos são incentivados a continuar na escola.

Nosso maior propósito é mostrar que eles podem ter uma realidade diferente. Muitos companheiros vieram de comunidades carentes e conseguiram mudar sua realidade através das artes marciais. Então, essa é nossa mensagem; independentemente de onde eles estão agora, podem sonhar e almejar um futuro melhor, e nós estaremos sempre aqui para ajudar”, conclui Márcio.