Revisão do Plano Diretor de Antonina não garante participação popular, além de várias outras irregularidades, diz MPPR


Por Luiza Rampelotti Publicado 24/11/2022 às 15h09 Atualizado 17/02/2024 às 22h25

O Ministério Público do Paraná (MPPR) identificou diversas irregularidades na revisão do Plano Diretor Municipal (PDM) de Antonina, que está em curso atualmente. Por isso, o órgão expediu uma recomendação administrativa para que a Prefeitura paralise o processo.

A revisão do Plano Diretor de Antonina começou em dezembro de 2021, com a contratação da Fundação de Pesquisas Florestais do Paraná (FUPEF), via Dispensa de Licitação 31/2021, pelo valor de R$ 350.718,00. Atualmente, o plano em vigência é o definido pela Lei Municipal nº 20/2008, que estabelece a necessidade de sua revisão a cada 10 anos pelos membros do Poder Executivo, Legislativo, equipe técnica da Prefeitura, Conselho de Desenvolvimento Municipal, e demais órgãos envolvidos na execução do PDM.

Após o início da revisão, o MPPR, por meio da 2ª Promotoria de Justiça de Antonina e pelo Núcleo Litoral do Grupo de Atuação Especializada em Meio Ambiente, Habitação e Urbanismo (Gaema), instaurou um procedimento administrativo para acompanhar a elaboração do documento e identificou a necessidade de adequações em várias etapas do processo.

Falta de profissionais


Uma das irregularidades diz respeito à composição da equipe técnica da consultoria contratada, que é incompatível com a diversidade de temas relevantes para o município e que devem ser debatidos para a atualização do plano.

Os profissionais indicados para a elaboração do Plano Diretor pela FUPEF são: sete engenheiros civis; dois engenheiros cartográficos e agrimensores; um engenheiro ambiental; um engenheiro mecânico; três arquitetos e urbanistas e dois bacharéis em direito. Entretanto, o contrato com a Prefeitura exige, ainda, ao menos um geólogo e um engenheiro florestal.

Contudo, o MPPR ressalta a “clara preponderância de profissionais das ciências exatas, especialmente das engenharias”, estando ausentes outros profissionais essenciais para a elaboração do plano, como sociólogos, assistentes sociais e antropólogos. Diante disso, a recomendação administrativa informa que seria essencial que um turismólogo também integrasse a equipe.

Participação popular no processo que serve para assegurar o bem estar geral, preservando o meio ambiente, promovendo qualidade de vida e garantindo desenvolvimento urbano sustentável não está acontecendo.


Conteúdo mínimo não é atendido


Outras irregularidades constatadas consideram insuficientes as diretrizes para definição do conteúdo mínimo do Plano Diretor, que já estão dispostas em legislações federais e estaduais. Isso significa que há uma série de ausências de conteúdos básicos para a revisão, como o “Plano de Rotas Acessíveis”, um importante instrumento para a mobilidade e acessibilidade universal; o “Plano de Mobilidade Urbana”, entre outros.

Além disso, o MPPR informa que o “Patrimônio Cultural”, tema de grande relevância, também está sendo tratado de modo insuficiente na revisão. Para a promotora Dalva Marin Medeiros, a “valorização e proteção do patrimônio cultural impactam diretamente em políticas urbanas que devem ser definidas pelo Plano Diretor como possibilidades de adensamento, ocupação, adaptação de fluxos viários, acessibilidade, infraestrutura urbana etc.”.

Ela ressalta que outro tema de extrema importância para a execução da revisão é o “Plano de Ação e Investimentos”, que também não foi abordado no PDM de Antonina. Isto é, não há nada que fale sobre a capacidade financeira e de investimentos da cidade na elaboração do plano.

Sem participação de membros da Prefeitura, Câmara e população


Mais uma irregularidade constatada pelo MPPR considera a Lei Municipal nº 20/2008, que dispõe sobre o plano em vigência. O artigo 46 destaca que “esta lei deverá ser integralmente revisada ao menos a cada 10 anos, pelos membros do Poder Executivo, Poder Legislativo, Equipe Técnica da Prefeitura, Conselho de Desenvolvimento Municipal, e demais órgãos envolvidos na execução do Plano Diretor, a fim de adequar-se às transformações locais ocorridas face ao progresso e desenvolvimento sustentável aplicado ao Município de Antonina”. No entanto, não existem indícios de que membros dos órgãos citados estejam participando ativamente do processo de revisão.

De acordo com o Ministério Público, a FUPEF não disponibilizou publicamente os relatórios dos eventos participativos realizados, não sendo possível acessar – em consulta pública – a ata das audiências, as listas de presença, o material apresentado, nem o histórico e relato das reuniões realizadas com a equipe técnica do Município, representantes do legislativo e Conselho de Desenvolvimento Municipal.

Tais ausências ferem frontalmente os princípios da publicidade e a transparência na administração pública e ganham profundidade quando tratamos de um instrumento legal que é em sua essência participativo”, diz a promotora Dalva. Ela destaca que a efetiva participação popular e a gestão democrática são princípios básicos da Política Urbana Nacional e obrigatórios na elaboração dos Planos Diretores Municipais.

Falta de participação social pode gerar improbidade administrativa


A participação popular na elaboração de um PDM está detalhada em diversas resoluções do Conselho Nacional das Cidades, bem como na legislação federal. Inclusive, o próprio Estatuto das Cidades (Lei 10.257/2001) prevê como ato de improbidade administrativa se os gestores não assegurarem a ampla participação social.

O MPPR ressalta que não há divulgação dos registros da realização de quatro audiências públicas na modalidade on-line e síncrona; quatro reuniões técnicas; e da conferência em formato de vídeo sistematizado e organizado, que estavam previstas na revisão do Plano Diretor de Antonina. Além disso, não há divulgação e acesso pelo órgão, sequer às listas de presença, atas, material apresentado, pontos discutidos, consensos firmados etc.

Se conclui que não há transparência nem ampla divulgação da participação social na revisão do PDM de Antonina”, reforça a promotora.

Ela ainda enfatiza que 15% da população do município está situada em 23 comunidades rurais (segundo o CENSO do IBGE de 2010), no entanto, há uma centralização da participação social em audiências públicas realizadas, normalmente, na área central da cidade. Desta forma, o envolvimento e participação dos moradores das comunidades não é garantido.

Os próprios moradores dessas áreas, através de uma associação comunitária localizada na área rural, denunciaram a situação ao MPPR. Eles informaram que não estavam tendo acesso ao conteúdo das análises e propostas realizadas na atual revisão do Plano Diretor. “Isso, por si só, ensejaria medidas para a revisão da metodologia do processo participativo do PDM”, avalia Dalva.

Prefeitura não responde


Diante de todas as irregularidades encontradas, o MPPR recomendou ao prefeito José Paulo Vieira Azim (PSD), ao presidente do Comitê de Revisão do Plano Diretor Municipal de Antonina, Marlon Everton Moreira da Cruz, e à Fundação de Pesquisas Florestais do Paraná, que paralisem o processo, com vista a adequar a metodologia e instrumentos utilizados, suprindo as ausências apontadas acima, entre várias outras citadas no documento, seja na composição da equipe técnica, na atenção ao conteúdo mínimo exigido pela lei, no cumprimento ao rito do processo e na garantia da participação popular, com a devida pactuação pública.

A Prefeitura tem o prazo de 30 dias (até o dia 7 de dezembro) para comunicar oficialmente o MPPR sobre o acatamento da recomendação.

O JB Litoral procurou a Prefeitura, por meio de seu secretário de comunicação, Marcelo Vieira Gomes, questionando a respeito do acatamento à recomendação administrativa. No entanto, não houve retorno. Vale destacar que a falta de respostas por parte do poder municipal à equipe de jornalismo é recorrente. Do início do ano até o momento, nenhum dos pedidos de informação realizados foram respondidos.