Benzedeiras resistem à intolerância religiosa para levar auxílio espiritual às pessoas


Por Redação JB Litoral Publicado 22/05/2021 às 12h04 Atualizado 16/02/2024 às 02h53

Por Luiza Rampelotti

Quebranto, olho gordo, mau olhado, encosto. Quem é mais antigo já deve ter ouvido essas expressões e, em seguida, um conselho, é melhor se benzer. O benzimento é uma prática tão antiga que já ocorria no mundo antes do surgimento de qualquer religião, e tem o intuito de solucionar problemas espirituais e, até mesmo, físicos, como doenças.

Benzer significa tornar algo bento ou abençoar algo, é um ato de fé prática, e é realizado independente da religião. Basta ter fé, acreditar no poder do amor e da oração e ter a intenção de ajudar o outro.

Embora a intolerância religiosa tenha feito muitas benzedeiras pararem de atender, ou, pelo menos, de se identificarem como benzedeiras, ainda existem aquelas que resistem aos preconceitos e têm orgulho da prática. É o caso da dona Maria do Rocio Chemure Cechelero, parnanguara de 74 anos que, há 47 anos, realiza seus atendimentos espirituais.

Benzimento curou filha com meningite

Ela conta que “foi pela dor” que descobriu a vocação. “Tive seis filhos e a número 4 teve meningite, ela chorava dia e noite. Levamos em todos os médicos e nada, até que um dia um médico nos orientou que levássemos ela para benzer. Eu levei e, naquela noite, nós conseguimos dormir, então continuei levando. Minha filha se curou sem sequelas da doença”, relembra.

Maria Cechelero já atende há 47 anos, em Paranaguá

Ao levar a filha para o benzimento em um Centro Espírita Kardecista, em Paranaguá, dona Maria se interessou pelas reuniões e palestras que aconteciam no local e, um dia, assistiu a um ensino do médium Divaldo Franco, que estava na cidade. “Fui tendo conhecimento e quando assisti a palestra de Divaldo, ele me olhou e convidou para sentar à mesa. Ali eu não sabia o que fazer e me disseram: reze um Pai Nosso. Foi assim que eu comecei com a espiritualidade”, conta dona Maria.

Católica, formada em um colégio interno católico, ela conta que começou a estudar o kardecismo com o aval da igreja. “Depois que minha filha se curou, eu comecei a estudar, não como benzedeira, mas como kardecista. Quando vi, estava atendendo como benzedeira e já faz 47 anos, graças a Deus”, diz.

É grátis e não tem preço

O atendimento acontece em um cômodo de sua casa, onde tem um altar rodeado de imagens e fotos. O ambiente é acolhedor e de muita paz. “Eu acendo uma vela, faço uma oração e minha vidência revela. No que eu posso ajudar, eu ajudo”, comenta dona Maria. Segundo ela, pessoas de todas as idades costumam ir buscar o atendimento, que ela presta gratuitamente. “Não faço nenhuma cobrança, porque essa é a minha missão a cumprir na terra. E, para isso, não há preço que pague”.

Nunca liguei para o preconceito

Dona Maria revela que já enfrentou preconceito. “Sempre teve e sempre vai ter, mas eu nunca liguei porque estava fazendo o bem e me sentia bem com isso. Sempre fiz o que achei que devia fazer”, afirma. Ela mesma conta que já teve preconceito com a religião espírita, mas que, ao passar por situações na própria pele, começou a entender e respeitar mais. “Mas, mesmo sendo benzedeira, não participo de centro nenhum. Às vezes, só vou tomar um passe, porque a gente que atende se sobrecarrega muito. Tomar um passe descarrega a gente”, fala.

Durante a pandemia de coronavírus, dona Maria revela que existe um número muito grande de pais levando suas crianças. “Ultimamente, tem muita mãe me ligando contando que a criança está acordando à noite e chorando muito. Tem criança que não quer entrar em casa, por exemplo. Essa energia do mal, que invadiu o planeta, está atingindo as crianças”, diz.

No início da pandemia, a benzedeira conta que parou com os atendimentos. Com o decorrer dos dias, e seguindo todas as recomendações de saúde e cuidados preventivos, ela voltou a realizar os benzimentos. Segundo ela, a demanda aumentou muito durante esse período.

Atualmente, ela atende apenas às segundas, quartas e sextas-feiras, em sua casa, na Rua Conselheiro Sinimbú, 215, Centro Histórico. “Quando eu abro a porta, já tem 3 ou 4 pessoas me esperando. Mas, hoje, já estou cansada pela idade, então tiro às terças e quintas-feiras para mim”, conclui dona Maria.