Tradição entre riobranquistas, Toca do Sericó abre as portas para o JB Litoral e conta a história de 24 anos


Por Amanda Batista Publicado 04/10/2023 às 19h54 Atualizado 19/02/2024 às 01h23

No último dia 25, o Estádio Nelson Medrado Dias, o Estradinha, foi arrematado por quase R$ 18 milhões pela Rede Condor. A partir da homologação da proposta ou da venda para outra empresa, o Rio Branco Sport Club terá que procurar outro lugar para treinamentos e jogos, e os clientes da Toca do Sericó não terão mais o tradicional bar para comemorar as vitórias do Leão do Litoral.

Para saber o que será dos comerciantes do lugar, o JB Litoral conversou com Josenei Freitas Pereira, de 77 anos, um dos parnanguaras que foram profundamente marcados pela história do Estradinha, e com o atual proprietário, Valdomiro Krüger, um gaúcho de 71 anos que até hoje conserva o legado parnanguara.

Paixão muito mais antiga do que o trabalho


Ao avistar os repórteres do JB Litoral, a primeira coisa que o Seu Sericó fez foi abrir um sorriso, cumprimentar a equipe, e mostrar a carteirinha de 1980, quando se tornou sócio, pela primeira vez, do Rio Branco Sport Club.

A paixão pelo time começou com o avô, Benjamin Constante Pereira, um verdadeiro rio branquista que fazia questão de acompanhar tantos jogos quanto fosse possível. A tradição foi passada para o filho, Antônio Alves Pereira, que gostava do time, mas não era tão chegado. Ainda assim, seu Antônio manteve o costume de família. Quando Siricó fez 13 anos, ele o levou para estrear no Estradinha.

Seu Siricó diz que nunca esquecerá a alegria de pisar no gramado pela primeira vez, em 1959. “Antigamente não tínhamos essa liberdade, então, quando eu era criança, meus pais eram linha dura, não nos deixavam sair para lugar cheio de gente, por isso, só fui saber como era assistir um jogo no Estradinha com 13 anos”, lembra.

Ao JB Litoral, Sericó fala sobre os momentos marcantes que viveu ali, abaixo da arquibancada do Estradinha. Foto: Rafael Pinheiro/ JB Litoral.

Na época, não havia muro, era um campo com uma arquibancada cercada de madeira, e seu Sericó viu o time enfrentar o Vasco da Gama. Até hoje, 64 anos depois, ele lembra do placar: “1 a 0 para o Rio Branco”, diz sorridente.

O apreço pelo time só cresceu com o tempo, assim como as visitas ao estádio, fosse para ver o Leão jogar ou para assistir apresentações de figuras ilustres no estádio. “O Estradinha já recebeu muita gente famosa. Como moro aqui perto, sempre vim assistir. Já vi show da Gretchen, do Balão Mágico, o baixinho bigodudo da Kaiser, tudo que era de celebridade a gente via aqui”, conta o parnanguara.

Apesar do apreço pelo Rio Branco, o gosto pelo time se tornou uma paixão solitária após a morte do Seu Antônio, já que os filhos Josenei Júnior e Samaroni, além da esposa Lídia, não compartilhavam da devoção.

Meus dois filhos nunca gostaram de futebol. Eu até trazia eles para o estádio quando eram pequenos, mas nunca se interessaram. Acabou restando apenas eu na família, mas isso não me chateia. Passei anos viajando com a torcida em caravanas e vendo o Rio Branco jogar”, destaca. 

Toca do Sericó


Por destino ou mera coincidência, após 26 anos trabalhando como comerciante, ele assinou contrato com o clube em 1999 e abriu a Toca do Sericó. Naquele ano, o proprietário da “Toca do Jacó”, um outro bar da cidade, implicou com o nome, alegou que era plágio usar o “Toca” na mesma vizinhança, mas Seu Sericó não deu bola.

Eu dizia para ele ‘uma coisa é a Toca do Jacó, outra é a Toca do Sericó’, ele ainda criou caso por um tempo, mas depois espichou a canela e ficou por isso mesmo”, diz em tom de anedota.

Após 22 anos em funcionamento, marcado por grandes vitórias e momentos de pesar, atendendo torcedores da casa e até os rivais, ele arrendou o bar em 2021 para Krüger, que manteve o legado de pé pelos últimos dois anos.

Quando perguntado sobre a venda, Sericó conta que estava cansado, que a idade não lhe permitia mais ficar atrás do balcão até 10 horas por dia, mas que confiava no trabalho do amigo. “Não dava mais para manter o pique de quando era jovem, eu precisava me aposentar. Mas, estou quase todo dia aqui fazendo companhia para o Krüger”, acrescenta.

Os dois amigos destacam que, mesmo após a venda do local, a Toca do Sericó vai continuar existindo. Foto: Rafael Pinheiro/ JB Litoral.

Para Valdomiro Krüger, a história da Toca do Sericó vai perpetuar mesmo após o arremate do estádio para a Rede Condor. “O leilão do Estradinha foi um momento triste para todos nós, mas entendemos que há muito tempo o time sofria com dívidas, processos, e o estádio não cumpria mais sua função social”, afirma o comerciante. “Apesar de tudo, o Rio Branco e a Toca do Sericó vão continuar vivos. Vamos mudar de local, mas a tradição nunca deixará de existir”, conclui o gaúcho.

O comerciante gaúcho diz que apesar de lamentar a venda do estádio, acredita que há muito tempo ele não cumpria sua função social. Foto: Rafael Pinheiro/ JB Litoral.