Controle de qualidade de grãos em Paranaguá muda de mãos e tem alteração de preços


Por Katia Brembatti Publicado 08/11/2021 às 16h01 Atualizado 16/02/2024 às 18h36

As cargas de soja, farelo e milho, que chegam ao porto de Paranaguá por caminhão, deixaram de ser inspecionadas pelo Instituto de Desenvolvimento Rural do Paraná (IDR-PR) e passaram a ser verificadas pelo Grupo Bureau Veritas. A mudança para a iniciativa privada aconteceu no início de outubro, sem muito alarde. O IDR-PR continua responsável pelo controle de qualidade do que chega por trem e a avaliação segue sendo feita no km 5 – e também é encarregado de fazer a supervisão do que é inspecionado pela empresa nos caminhões. Entre as alterações, está a tabela de preços e os valores pagos aos trabalhadores destacados para fazer a coleta do material nos veículos, como será detalhado mais à frente.  

Para entender essa história, é importante voltar no tempo. O porto de Paranaguá era o único do Brasil que tinha um sistema público de controle de qualidade de produtos de origem vegetal – nos demais, a classificação é uma atribuição conjunta de vendedores e compradores. Um dos motivos, que tornou singular a situação paranaense, foi a existência de um silo público, concentrando granéis de várias origens.

Na década de 90, em função de reclamações sobre cargas recebidas em outros países, o Paraná decidiu instituir uma forma de controlar, já na chegada ao porto, a qualidade do que iria para as estruturas de armazenamento ou seria imediatamente exportado. Esse processo foi sendo aprimorado e, de problema, passou a ser uma referência de padrão de qualidade, interferindo inclusive nos valores negociados, com prêmio pago na Bolsa de Chicago. 

Embora fosse um diferencial, esse processo não era isento de reclamações. Nilson Hanke Camargo, consultor da Federação de Agricultura do Paraná (Faep), comenta que foram várias as negociações para resolver questões, como demora, inovação tecnológica e, principalmente, custos. O trabalho foi desempenhado por várias estruturas públicas, ao longo do tempo: começou com a Tecpar, passou para a Claspar e para a Codapar, e, por fim, ao IDR-PR, que é resultado da fusão, em 2019, das várias autarquias estaduais ligadas ao meio agropecuário, como Emater e Iapar.

A “saída” do IDR-PR

Para responder às reclamações sobre o sistema e para buscar melhorias, a empresa pública Portos do Paraná planejava obras no pátio de triagem e procurou o IDR-PR para custear as despesas. E foi aí que a possibilidade de mudanças no processo de classificação começou a se desenhar. Francisco Carlos Alves, gerente de engenharia e logísticas do IDR-PR, conta que a partir do momento que a Portos conquistou a autonomia de gestão, em 2019, houve o comunicado de que os contratos que tinham com os prestadores de serviço teriam de ser revistos e repactuados.  

No caso do IDR-PR, foi concedida a prevalência de escolha – para continuar à frente do processo de controle de qualidade das cargas de grãos –, com a condição de fazer investimentos em automação e outras melhorias que representariam custos de cerca de R$ 25 milhões, conta Alves. O instituto não aceitou a proposta, abrindo espaço para que o serviço fosse repassado. 

“Mas não abrimos mão de o estado estar no porto”, acrescenta o gerente. Por isso, ficou combinado que os laudos são feitos pela empresa privada, mas sob a supervisão do IDR-PR, que faz uma espécie de auditoria. Os procedimentos de verificação foram formalizados em um documento, entregue à Portos do Paraná. Além disso, a inspeção das cargas férreas e também a checagem de conferência, feita na moega, continuam com o instituto público.

A classificação de produtos vegetais é amparada por legislação federal, com delegação pelo Ministério da Agricultura. É uma forma de evitar fraudes e produtos fora do padrão, com impurezas, como terra e gravetos. Cerca de 20 milhões de toneladas são inspecionadas anualmente em Paranaguá, com controle de qualidade, durante a safra, passando de 2 mil caminhões e 500 vagões por dia.

A entrada da ATEXP

Juliano Mickus, gerente financeiro e administrativo da Associação dos Terminais do Corredor de Exportação de Paranaguá (ATEXP), conta que a entidade foi procurada pela Portos do Paraná com a proposta de que buscassem uma empresa para assumir o serviço de classificação. Ele comenta que oito foram selecionadas, visando aumentar a qualidade e baixar os custos. A escolhida foi o Grupo Bureau Veritas, antiga Shutter.

A transição do serviço foi realizada em 1° de outubro e o gerente acredita que ainda é cedo para fazer avaliações, mas destaca que a vantagem mais evidente está relacionada ao custo do sistema, com queda de 35%. Para cargas de soja, o valor era de R$ 0,667 por tonelada e passou para R$ 0,44. Juliano Mickus destaca que o sistema está passando por ajustes. “Ainda estão construindo um procedimento”, diz.

A reportagem do JB Litoral procurou a empresa pública Portos do Paraná para entender os detalhes e os bastidores dessa mudança, mas a assessoria de imprensa informou que não se pronunciaria sobre o assunto.

Mudança gerou questionamentos e motiva reunião nesta segunda-feira

A transição do sistema de controle de qualidade de grãos – do setor privado para a inciativa privada – também representou alterações na prestação do serviço, principalmente no quesito mão de obra. Como o IDR-PR não dava conta de fazer o trabalho, 24 horas por dia, com os 30 funcionários que dispõe em Paranaguá, o trabalho mais pesado, de coleta de amostras na carroceria de caminhões, era feito com terceirizados, via contrato.

A partir de outubro, esses profissionais foram dispensados – alguns ainda seguem atuando em serviços pontuais, na fiscalização das cargas férreas e na moega. Os números exatos não foram informados. E a empresa, que assumiu o serviço de controle de qualidade, não estaria disposta a pagar os mesmos valores que os profissionais estavam recebendo até então.

Essa situação gerou uma série de embates e ensejou uma reunião, promovida pelo Sindicato dos Trabalhadores na Movimentação de Mercadorias em Geral de Paranaguá (Sindtrab), a ser realizada na noite desta segunda-feira (8). A reportagem do JB Litoral buscou esclarecimentos sobre as reclamações e as propostas, bem como em relação à quantidade de funcionários afetados e os valores envolvidos, mas o presidente da entidade, Lindonei Santos, informou que o caso está em plena negociação e que pretende se pronunciar apenas depois da reunião.