Estranha lentidão nos processos de alvará beneficia grandes empresas


Por Redação JB Litoral Publicado 26/02/2016 às 08h00 Atualizado 14/02/2024 às 12h31

O que é um alvará de localização e funcionamento senão o principal documento para todo e qualquer empreendimento comercial, prestador de serviço ou atividade que ocupe o solo do município. Em setembro do ano passado, o prefeito Edison de Oliveira Kersten (PMDB) incluiu três parágrafos na Lei Complementar n° 178/2015, regulamentando através do Decreto n°3159/2015 critérios para invalidação e cassação de alvarás concedidos. 

O mesmo Decreto Municipal em seu artigo 2°, inciso “III”, letra “c” deixa claro que, para concessão do Alvará de Localização e Funcionamento, entre as exigências, o interessado terá que fazer a indicação da área total do empreendimento. Ou seja, “as áreas ocupadas necessárias ao contribuinte para desenvolver suas atividades econômicas, como: salas, cozinhas, corredores, banheiros, quartos, elevadores, áreas de lazer, lavanderias, estacionamentos, áreas de manobra e circulação de caminhões e trens, armazéns, áreas para armazenagens de grãos e contêineres a céu aberto, silos horizontais e verticais, balanças rodoviárias, correias transportadoras, moegas, dispositivos de armazenamento infláveis e outros espaços não especificados”. Esta ocupação da atividade a ser exercida resultará no valor a ser pago pelo alvará.

Todavia não é exatamente desta forma que algumas grandes empresas e segmentos comerciais têm exercido sua atividade, gerando prejuízo de milhares de reais aos cofres públicos.
A tática de conseguir um alvará de 30 mil metros quadrados, quando a área total do empreendimento passa de 300 mil metros quadrados é um exemplo grotesco que não foge da realidade.

Tudo que envolve o funcionamento de um empreendimento e o que estiver na área ocupada resulta na concessão do alvará, mas algumas empresas pedem o documento tendo por base apenas a área edificada. O que é ilegal e fere três parágrafos do Decreto 3159/2015 com penalidades que podem resultar até na cassação do alvará.

Importância da fiscalização

Para entender este assunto, o JB foi ao plantão fiscal da prefeitura e entrevistou o auditor Sergio Luiz da Rocha, que explicou o funcionamento do processo para abrir uma empresa de forma legal na cidade.

O processo começa com um pedido de consulta prévia junto à prefeitura, que apresentará os pré-requisitos para colocar a empresa em funcionamento. Dependendo do porte do empreendimento existe a necessidade de licenciamento ambiental, análise de impacto de vizinhança, de tráfico pesado, EIA-RIMA, entre outras questões como pátio de estacionamento, pátio interno, entre outros.

O auditor explica que o valor a ser cobrado pelo alvará está estabelecido nas Leis Complementares 110/2009 e 111/2009 e corresponderá à área de funcionamento da empresa. A cobrança não se restringe somente a sede da empresa, se estendendo a toda a área de funcionamento. No caso de empresas que possuem mais de um prédio é cobrado um único alvará, compreendendo as duas metragens, que resulta em um valor total. Em casos de prédios separados, o alvará será cobrado por localização.

Empresas que atuam na faixa portuária, por exemplo, e ocupam grandes áreas, além de parte do cais acostável, segundo Rocha, deverão pagar o correspondente a toda a área utilizada e não se restringir apenas ao espaço edificado e, isso inclui balanças rodoviárias, estacionamento, áreas de manobras de caminhões, pátio de containers, etc.

O auditor entende que não pode existir esta situação de descumprimento na concessão de alvará. “Se existe, algum setor da prefeitura não esta funcionando. Seja para fiscalizar ou para lançar e até para apreciar recurso de alguma empresa. A questão fiscalizatória referente à área cabe ao Urbanismo, para apreciar recursos, Fazenda e Jurídico. E se a empresa está pagando menos do que deveria, está se cometendo uma injustiça fiscal em relação a todos os demais contribuintes. Porque assim a empresa está sendo favorecida, e naturalmente, isso tem haver, digamos, com o mau funcionamento de algum setor da prefeitura que deveria coibir esse tipo de atitude”, alerta Rocha.

Morosidade suspeita nos processos

O auditor informa ainda que depois de um minucioso e intenso trabalho feito pelos auditores fiscais, iniciado há três anos, a arrecadação da cobrança de alvarás teve um aumento bastante expressivo, saltando de R$ 1 para perto de R$ 3 milhões. Para Sergio Rocha, o aumento na arrecadação da taxa de alvará, em razão do trabalho dos fiscais de urbanismo e fazendários, mostra que antes dele havia perda de receita na prefeitura. Se a prefeitura não trabalha no sentido de fiscalizar e buscar aquilo que deveria, isso prejudica a entrada de recursos. Paranaguá deveria ter uma arrecadação bem mais expressiva em termos de ISS e de Alvará se todos os setores funcionassem”, explica Sergio Rocha.

Questionado sobre a existência de empresas que não recolhem o alvará da forma devida, o auditor foi enfático ao afirmar que se existem é por falta de uma atualização cadastral e, portanto, uma falha da prefeitura. “Há situações que a empresa entra com recurso. Pode ser um posto de gasolina, empresas de grande porte, como por exemplo, que trabalham com terminal de contêineres na área portuária. Uma grande cooperativa entrou com recursos e está aguardando resultado, assim como uma transportadora de grande porte do município localizada na Vila Primavera.

A prefeitura deveria ter todo o interesse que esses processos tivessem uma tramitação rápida aqui dentro. Estranhamente eles não estão andando e essa lentidão tem beneficiado as empresas que não estão fazendo o recolhimento do alvará de acordo com o que a lei lhe permite. O município está deixando de arrecadar por uma lentidão na resolução dos processos de recursos. Não sei a que interesse se deve essa lentidão, se proteção a essas empresas ou simplesmente má gestão ou incompetência da nossa parte”, ressalta o auditor.

Invalidação e cassação de alvará

Apesar do Decreto Municipal 3159/2015 ter trazido penalidades, como invalidação e cassação do alvará, e se mostrar uma importante ferramenta de aumento da arrecadação, a estranha morosidade na tramitação de recursos das empresas pela cobrança correta torna o decreto pouco eficiente.

De acordo com o parágrafo 10 do decreto, o Alvará de Localização e Funcionamento Condicionado perderá sua eficácia, na hipótese de invalidação, nos casos de falsidade ou erro das informações e, na de cassação, entre as muitas elencadas, em caso de descumprimento das obrigações impostas por lei ou quando da expedição da licença e se as informações, documentos ou atos que tenham servido de fundamento à licença vierem a perder sua eficácia, em razão de alterações físicas, de utilização, de incomodidade ou de instalação.

Os dois casos ilustram as situações que podem estar sendo praticadas por grandes empresas cujos recursos dos processos estão parados na prefeitura.