Irregularidades da prefeitura fizeram Unespar suspender estágio em abril


Por Redação JB Litoral Publicado 25/06/2015 às 16h30 Atualizado 14/02/2024 às 08h24

Uma série de denúncias de estagiários exercendo funções que não condiziam com o curso que desenvolvem na Universidade Estadual do Paraná (Unespar), campus Paranaguá, preocupou o corpo docente e, mais ainda, a reitoria e a Diretora do Centro de Área de Ciências Humanas e do Conselho Municipal de Educação (Comed), a professora Mary Sylvia Miguel Falcão, que resultou na suspensão de todos os estágios desde o dia 28 de abril em Paranaguá. 

Os próprios estagiários denunciaram que atuavam dentro das escolas em espaços de formação não adequados para os cursos que estavam fazendo. Entre os casos, havia alunos de biologia dentro da creche, alunos de matemática trabalhando com alfabetização de alunos, o que a Unespar entende como um desvirtuamento do processo de formação.O estágio é um processo de formação onde ele vai colocar tudo em prática e isso não estava ocorrendo”, disse a diretora.

Ela disse ainda que houve denúncias, inclusive dos próprios professores do Centro Municipal de Educação Infantil (CMEI), que estranhavam demais esta situação. “Eu posso ter uma mãe que pode chegar lá e dizer – olha esse aluno está mexendo com minha filha – eu não posso deixar um menino trocar a fralda da minha filha – claro que não defendo isso, mas tenho que acatar essa mãe. Estou dizendo que esse menino que está lá tem formação na área de educação infantil? Ele sabe trabalhar com o método de desfraldamento de criança? Conhece as especificidades da educação infantil? Não, então ele não está em um espaço que é a qualificação dele”, explica Mary Falcão.

Entretanto, uma das denúncias mais graves que chegou ao conhecimento da Unespar é a de que existiam alunos de primeiros anos assumindo sala de aula. Isso a população tem que saber, defende a professora.

Estagiário na função de professor

A diretora informou que teve conhecimento de estagiários que assumiam sala de aula, apesar de terem sido contratados para outra função. “Ele chega na escola e senta em sala de aula para dar aula normal para séries iniciais do ensino fundamental. Essas questões foram denunciadas pelos nossos próprios alunos que estavam nos estágios e como não tínhamos uma regulamentação e, diante dessa fragilidade no trato com os nossos alunos, resolvemos suspender até que conseguíssemos trabalhar com uma regulamentação que inibisse essas práticas que vão desvirtuar tanto o atendimento com a população quanto a formação dos nossos alunos”, defende a diretora.

No dia desta reportagem, a professora informou ao JB que recebeu uma denúncia de um aluno de matemática que trabalha como organizador de recreio. “Ele cuida das crianças, ou seja, não tem nada ver com o curso dele. Temos ainda denúncia de aluno que está trabalhando na parte administrativa da escola, não vou questionar muito porque é um trabalho em gestão, mas ele não pode ser um secretário na escola, porque esse quadro é técnico e não de formação para docência”, alerta Mary Falcão.
A diretora ressaltou que o compromisso da Unespar não é com a precarização do trabalho e nem de pegar o aluno e colocá-lo pra trabalhar para ganhar uma bolsa de R$ 530. “A nossa preocupação é com sua formação posterior a isso. Trata-se do papel social da universidade. Estamos defendendo os interesses daqueles alunos que formaremos, que serão profissionais no futuro, mas se ele entra nesse processo de precarização de trabalho, ele pode vir a desistir do curso. Isso já aconteceu, teve aluno que chegou e disse “Deus o livre” desse estágio, porque ele não tem formação necessária para dialogar com a realidade que ele está vivendo e desistiu do curso. Queremos salvaguardar o tempo inteiro o direito de formação dos nossos alunos, por que esse é o papel social da escola, essa é a função social da universidade, que é a formação dos docentes”, defende a professora.

Para Mary Falcão, o compromisso da universidade é um processo de extensão, ou seja, de estender os serviços e atuação para comunidade e isso não pode ser desvirtuado. “Entendemos que para salvaguardar o direito de formação de nossos alunos resolvemos mexer com o processo de regulamentação, que já estamos fazendo. Estamos trabalhando para que a gente não comece a legitimar práticas que não combinamos”, informa a diretora.

Estágios devem retornar em julho

De acordo com Mary Falcão, o trabalho de regulamentação dos estágios que a Unespar está fazendo ainda deve durar cerca de 15 dias. Após a elaboração das atas, será feita uma portaria e uma resolução será publicada, que encerra a suspensão e o estágio voltará normalmente. A decisão de legitimar a situação dos estágios partiu da universidade, caso contrário esta situação permaneceria.
“Chamamos para nós a responsabilidade, em última instância o aluno é nosso e acreditamos que não podemos defender a precarização do trabalho, se tenho que olhar estágio, tenho que olhar de acordo com a formação deste aluno, de acordo com o seu espaço do trabalho docente. Essa prerrogativa é nossa”, Segundo Mary Falcão, atualmente a Unespar possui cerca de 150 estagiários somente nos cursos da área de ciências humanas.

Prefeitura nega irregularidades

A reportagem do JB procurou a prefeitura e questionou o motivo pelo qual a Secretaria Municipal de Educação e Ensino Integral (Semedi) estava colocando estagiários em salas de aulas, além de outros questionamentos. A Semedi informou que orienta os diretores das escolas municipais e dos CMEIs (Centros Municipais de Educação Infantil) sobre a ilegalidade de estagiários assumirem como regentes, devendo os estudantes atuarem – somente – em atividades de apoio à docência e sempre com a presença do professor. A Semedi disse ainda que não há registro de ocorrência em sentido contrário na secretaria.

A prefeitura informou que houve um comunicado sobre a não assinatura de novos contratos assinado pela direção do Centro de Ciências Humanas, Biológicas e da Educação da Unespar pedindo a resolução de um problema interno (aprovação do Regulamento de Estágio pelo Conselho de Ensino, Pesquisa e Extensão – CEPE) para a retomada da assinatura de contratos vinculados a estas áreas de ensino.
No caso dos alunos de biologia, a prefeitura explicou que o curso de Ciências Biológicas tem duas modalidades de habilitação: bacharelado e licenciatura, sendo permitido o estágio em escolas municipais e CMEIs daqueles inscritos no curso com habilitação para LICENCIATURA, visto que eles estão em processo de formação para, no futuro, serem professores. Disse ainda que há orientação para que eles atuem dentro de suas respectivas áreas, como em projetos de horta comunitária dentre outros.

A prefeitura finalizou dizendo que atualmente são 83 alunos da Unespar participando do programa de estágio, sendo que, deste total, 74 estão em escolas municipais ou CMEIs. Entretanto, o número não é o mesmo que o divulgado pela diretora Mary Falcão.