JUSTIÇA PEDE SUSPENSÃO


Por Redação JB Litoral Publicado 31/03/2015 às 11h00 Atualizado 14/02/2024 às 06h48

  No dia 20 de dezembro de 2011, o então prefeito José Baka Filho (PDT) e o diretor geral da CAB Águas de Paranaguá, Mário Müller,assinaram um aditivo do contrato dos serviços de água e esgotamento sanitário que estendeu o prazo da subconcessão até 2045.

  Com este novo contrato, a CAB assumiu a operação do sistema de abastecimento de água e de esgotamento sanitário na Ilha do Mel e no Distrito de Alexandra, que deixou de ser feita pela Companhia de Água e Esgoto de Paranaguá (Cagepar), empresa de economia mista, cuja maior acionista é a prefeitura de Paranaguá.
  Sem demanda de trabalho para seu corpo de funcionários, começou um processo de fragmentação da Cagepar com demissões sumárias e ajuste do quadro para as necessidades atuais, resumidas à função de fiscalizadora. O trabalho de resgate da empresa que começou em 2005, recebida falida da gestão anterior, sem estrutura administrativa, logística e com um grande déficit financeiro chegava ao fim.Entre os servidores do quadro, em outubro de 2012, o advogado Lovanir Losso Lisboa, praticamente sem atividade laboral na Cagepar, abriu mão do salário de pouco mais de R$ 4 mil e pediu demissão da empresa.
  Mesmo com uma enorme demanda de ações judiciais, a maioria na Vara do Trabalho, a Cagepar não investiu na imediata e necessária abertura de concurso público para suprir a vaga aberta, apesar de ser indispensável a presença do advogado nas ações judiciais em favor do Poder Público, mesmo que na administração indireta. Sendo a Prefeitura a maior acionista da Cagepar, deveria ter a consciência que é inafastável a participação de um advogado na direção, consultoria e assessoria dos serviços jurídicos em geral.
 
  Vale destacar que o advogado público tem vínculo jurídico específico e compromisso peculiar com o interesse público posto no sistema jurídico, os quais hão de ser legalmente concretizados pelo gestor municipal, no caso da Cagepar, o prefeito Edison de Oliveira Kersten (PMDB). Ao assumir a gestão em 2013, o prefeito Mário Roque nomeou para a presidência da Cagepar em janeiro, Aldemis Crispim dos Santos, que pediu exoneração do cargo sem explicar o motivo e passou para o cargo Guilherme Roque, neto do prefeito, que ficou pouco tempo após o falecimento do avô e a presidência foi para o professor Waldir Armando Vasco de Campos atéser entregue para o executivo Claudio Glock de Souza. De outubro de 2012 até agosto de 2014, em um ano e 10 meses nenhum dos presidentes tomou a iniciativa de suprir a vaga de advogado neste período, através de concurso público, como manda a legislação.

Escritório de advocacia por R$ 24,5 mil ao mês

  Somente depois de passado o período de um ano e três meses sem advogado no quadro fixo, o então presidente da Cagepar Waldir Armando Vasco de Campos, contratou em caráter emergencial o escritório Augusti, Arraes & Carbioni Advogados, por um período de seis meses, através de um simples procedimento administrativo, contrariando o inciso II do artigo 37 da Constituição Federal.
Passados os seis meses, foi a vez do presidente Claudio Glock de Souza investir numa nova contratação, desta vez através de licitação no dia 26 de junho do ano passado.Apesar do fato que a contratação por licitaçãodos serviços das atividades da administração pública que representa uma fraude à regra da estruturação dos cargos públicos,que prevê a realização de concurso público, como determina o inciso II do artigo 37 da ConstituiçãoFederal, no dia 17 de julho foi publicado na imprensa o edital 01/2014 de um escritório de advocacia.
  Esta nova iniciativa gerou uma ação do Ministério Público do Paraná (MPPR) que entrou com uma ação civil pública, com pedido de liminar pedindo a suspensão do processo licitatório no dia 19 de agosto do mesmo ano, liminar essa concedida pelo Juízo de 1º grau, suspendendo a licitação. Porém, a Cagepar conseguiu através de Agravo de Instrumento, derrubar a liminar no Tribunal de Justiça do Paraná, e a licitação foi concluída com um valor de R$ 24,5 mil ao mês para prestação dos serviços de advocacia para empresa, através dos advogados Roosevelt Arraes, Ana Paula Pavelski, Luiz Gustavo de Andrade e Valmor Antonio Padilha Filho. Com isso, o suprimento da vaga do único advogado que atendia os serviços jurídicos da Capegar e recebia pouco mais de R$ 4 mil, passou ser feito pelo escritório de advocacia a um custo de R$ 294 mil num período de 12 meses.

De acordo com a ação civil do MPPR,a “terceirização” dos serviços de advocacia no Poder Público até pode ser autorizada, mas apenas de forma excepcional e temporária, e para a prestação de serviços singulares, o que não é o caso, segundo o MPPR.

   O MPPR pediu a suspensão do processo licitatório e dacontratação que acabou consolidada, em razão da possibilidade de grave lesão ao erário, em face das ilegalidades narradas, na forma do artigo 461, § 3°, e artigo 798 e seguintes do Código de Processo Civil.“A prévia investigação do MPPR trouxe indícios veementes de prejuízo ao erário e violação de princípios norteadores da Administração Pública, mormente porque a própria requerida, quando instada a prestar informações a este órgão, admite que os serviços licitados eram prestados anteriormente por empregado público concursado e já foram objeto de contratação precária, a indicar que o certame burla a regra do concurso público, viola o teto remuneratório do serviço público e permite “terceirizar” atividade fim da Administração Pública”, consta na açã

O que diz a prefeitura
 
  A reportagem do JB procurou a prefeitura, por sua condição de maior acionista e fez cinco questionamentos, que foram respondidos, mas alguns deles em desacordo com o que fora questionado. Entretanto, a prefeitura adicionou um esclarecimento que surpreendeu por mostrar indícios de nova irregularidade, que o MPPR tem cobrado da administração municipal, que é o desvio de função ou de finalidade. Questionada de por que esta gestão permitiu a ausência de advogado em seu quadro depois de assumir em 2013, a prefeitura limitou-se informar que a Cagepar possuía até final de 2012 um advogado concursado que pediu exoneração, fato que consta na ação civil. Sobre o motivo porque não pediu a direção da Cagepar a suspensão da Tomada de Preços n.º 01/2014 e da contratação do escritório de advocacia, a prefeitura alegou que a Cagepar obteve autorização judicial, do Presidente do Tribunal de Justiça do Paraná para realização da licitação de contratação de escritório de advocacia. Ainda sobre o fato da prefeitura e Cagepar não seguirem a recomendação do MPPR feita em agosto de 2014 de promover concurso público em 90 dias para o provimento do cargo de advogado, a prefeitura alega que a não realização de concurso público se deve a motivo muito simples: a Cagepar gastaria muito mais abrindo concurso público para preenchimento de um único cargo de advogado do que com o pagamento de um escritório que disponibiliza quatro profissionais.
 
  O JB questionou ainda o motivo porque a Cagepar não informou ao então Procurador Geraldo Município, advogado Roberto Tsuguio Tanizaki,sobre a contratação do escritório de advocacia. Isto porque, o Procurador, conforme expôs ao JB, já havia se manifestado contrário a contratação do escritório e orientado no sentido da realização do concurso público, durante o período que a Cagepar o consultou sobre a licitação – tomou conhecimento dos fatos no dia 30 de janeiro deste ano. A prefeitura respondeu que o ex-procurador geral representava o município nos processos judiciais e administrativos e a licitação para contratação de escritório de advocacia foi realizada pela Cagepar e não pela prefeitura. Segundo a administração, as autoridades da Cagepar são as responsáveis pela condução do processo e não o procurador-geral. Sobre as providências a serem tomadas nesta situação, a prefeitura informa que o MPPR foi cientificado de todos os fatos acima, inclusive na ação mencionada, estando ciente, inclusive, que o Presidente do Tribunal de Justiça do Paraná autorizou a contratação de escritório de advocacia. A prefeitura defende que a sua conduta e da Cagepar tem sido a de seguir a lei e o entendimento do Tribunal de Justiça.

Desvio de finalidadee Tanizaki não se manifesta

  Após responder aos questionamentos, surpreendentemente a Prefeitura acrescentou a informação onde admite nova irregularidade que não constou na ação civil do MPPR. A Prefeitura disse que, durante o ano de 2013,a advogada Adriana Peniche dos Santos, da Procuradoria-Geral do Município, foi cedida à Cagepar e auxiliou juridicamente a sociedade de economia mista municipal. Mas, ela retornou à Procuradoria, em razão do Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) do Ministério Público voltado a evitar os desvios de função. A nota encerra com a justificativa que,“ante a necessidade de assessoria jurídica, a CAGEPAR realizou a licitação em questão”. Esta situação pode caracterizar mais o desvio de finalidade que o desvio de função, citado pela prefeitura, uma vez que a advogada do município advogou em favor da Cagepar. O desvio de finalidade está definido na lei de ação popular e ocorre quando o agente pratica o ato visando fim diverso daquele previsto, explícita ou implicitamente, na regra de competência. O desvio de poder é um ato de improbidade administrativa.
  A reportagem do JB procurou ainda o ex-Procurador Geral. Roberto Tanizaki para falar sobre o assunto, mas este alegou que o processo se encontra “sob judice” e preferiu, neste caso, não se manifestar.