Poligonal feita pela Appa pode gerar desemprego e fim do porto público


Por Redação JB Litoral Publicado 07/08/2015 às 16h00 Atualizado 14/02/2024 às 09h06

Diante da desinformação levada pela imprensa sobre este assunto, o JB traz, hoje, detalhes da poligonal retirados do Processo – 00045.002115/2015-15 à disposição na Secretaria Especial de Portos (SEP), no endereço eletrônico www.portosdobrasil.gov.br., para que todos os setores da sociedade tenham noção do que representa a redução da poligonal portuária proposta pela Administração dos Portos de Paranaguá e Antonina (APPA).

De forma bastante simples e baseada tão somente em documentos que fazem parte do processo de 387 páginas, o JB tentará por fim as dúvidas dos trabalhadores portuários avulsos, daqueles que atuam nas empresas da movimentação portuária, autoridades constituídas e todos os segmentos que fazem parte da sociedade.

Entretanto, o ex-prefeito Carlos Antonio Tortato e atual presidente do Sindicato dos Conferentes de Cargas do Paranaguá, antes de entregar um documento com as reivindicações dos trabalhadores portuários avulsos (TPA’s) ao Ministro chefe da SEP, Edinho Araujo, sintetizou o que significa a implantação da poligonal proposta pela Appa. “Assim estabelecida a poligonal que está colocada, deixando somente o porto público dentro da poligonal e todo o resto fora, não há dúvida que isso será nossa sentença de morte, porque os terminais que serão feitos ou construídos (se é que serão) terão uma simetria concorrencial indisponível, a não ser que a gente ajuste isso nestas audiências que estamos fazendo agora. A defesa que os trabalhadores fazem é inclusão de causas sociais e um processo transparente que é desconsideração com aqueles que construíram esse porto”.

Porque a poligonal?

A Lei Federal 12.815/2013, em seu artigo 15, determinou uma nova definição da área dos portos organizados e o artigo 68 determinou que “as poligonais de áreas de portos organizados que não atendessem essa nova definição fossem adaptadas no prazo de um ano”. A lei é claro, sugeriu nesta definição, a manutenção, aumento ou redução das poligonais em todo país. No Paraná, por se tratar de um porto delegado do Governo Federal ao Governo do Estado, a Appa, através do superintendente Luiz Henrique Tessuti Dividino, em setembro do ano passado, baixou a Portaria 373/2014, designando um Grupo de Trabalho para fazer propostas e encaminhá-las ao Conselho de Autoridade Portuária (CAP). Foram designados Dieter H. Lengning (Fecomércio), Nilson Hanke Camargo (Faep), João Arthur Mohr (Fiep), Sérgio Malucelli (Fetranspar), Nelson Costa (Ocepar), Fernando Rafael Ferro de Lima (SEIL), Capitão-de-Mar-e-Guerra Antônio Pacheco (Capitania dos Portos), Jackson Aluir Corbari (Receita Federal), João Gilberto Cominese Freire, Adriano Dutra Emerick, Régis Gilberto Prunzel, Juarez Moraes e Silva e Maria do Perpétuo Socorro de Oliveira, (naquela oportunidade, todos conselheiros do CAP), além de Luiz Carlos Krezinski e Monica Janske de Castro Prosdócimo (Prefeitura de Pontal do Paraná), Débora Temporão de Aguiar Ramos e Rita Abe (Prefeitura de Paranaguá). Neste grupo de trabalho não havia nenhum representante dos TPA’s, tampouco das três principais Federações de trabalhadores (Fenccovib, FNP e FNE). Entretanto, cinco entidades de representação patronal, inclusive federações foram designadas, como FECOMERCIO, FAEP, FIEP, FETRANSPAR e OCEPAR. Os conselheiros do CAP foram meros ouvintes neste grupo de trabalho.

Confusão feita pela Appa

Após o encerramento do grupo de trabalho, a Appa enviou à SEP/PR proposta de redução da atual poligonal [tabelas], deixando na área do porto organizado apenas o porto público Dom Pedro II, abrindo espaços para arrendamento das áreas por Terminais de Uso Privativos (TUPs), criando uma provável concorrência desleal e predatória com o porto público. Isso chamou a atenção e revoltou a comunidade portuária, pois a nova proposta da Appa conflitou com a sugestão de ampliação da atual poligonal feito pelo Plano de Desenvolvimento e Zoneamento do Porto Organizado (PDZO) e o Plano Master, ambos aprovados pela Appa, Antaq e SEP, os quais deveriam ter sido levados em consideração. Com isso, a Associação Comercial, Industrial e Agrícola de Paranaguá (Aciap) enviou para o ministro-chefe da SEP, Edinho Araujo, em julho deste ano, uma carta criticando a proposta de redução apresentada pela Appa, conflitante com o estudo que ela mesma tinha participado, sem nova discussão com as demais entidades, apresentando argumento e pareceres de importantes juristas do país, professores Celso Antônio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro e Juarez Freitas, que entendem que a supressão de uma área do porto organizado apenas para se outorgar autorização de terminais privados implicaria fraude ao regime de arrendamento, inclusive à exigência de licitação, frustrando a previsão do art. 59 da Lei dos Portos. Vale destacar que o PDZO e o Plano Master são o resultado de diversas discussões junto à comunidade portuária que se estenderam por anos e atendem as expectativas dos portos de Paranaguá e Antonina.

Argumentos da Carta da Aciap

Na carta da Aciap, que foi assinada pelo prefeito Edison de Oliveira Kersten (PMDB), pelo presidente da Câmara Jozias de Oliveira Ramos (PDT), e presidentes de todos os sindicatos da orla marítima, além de cooperativas e do presidente da Aciap, Arquimedes Anastácio, constam 13 posições que defendem a contrariedade da proposta da Appa de redução da poligonal com argumentos baseados na própria Lei Federal 12.815/2013. Entre os argumentos vale destacar o sexto argumento que as poligonais não podem ser adaptadas fora das hipóteses do artigo 68 da Lei dos Portos, uma vez que o dispositivo estabelece que as poligonais “que não atendam ao disposto no artigo 15” deverão ser adaptadas. O artigo, por sua vez, estabelece parâmetros mínimos, e não máximos, do porto organizado, o que significa que a alteração das poligonais é a exceção possível, quando as poligonais existentes não atenderem aos requisitos do artigo 68, que não é o caso de Paranaguá.
O sétimo argumento ressalta que qualquer proposta de alteração das poligonais deverá levar em consideração o Plano Master e o PDZPO em vigor nos dois portos organizados, e debatidos por diversas Entidades. É inadmissível que eventuais propostas de novas poligonais desconsiderem o PDZPO e o Plano Master. De nada adiantaria a existência desses instrumentos (e todas as discussões que o precederam) se eles pudessem simplesmente ser ignorados por decisões futuras.
O nono argumento defende que qualquer proposta de nova poligonal deverá levar em consideração os aspectos concorrenciais envolvidos e dá como exemplo os portos públicos de ltajaí e São Francisco do Sul, que sofrem atualmente com a concorrência de terminais privados nos portos de Navegantes e ltapoá. Aqueles portos públicos não possuem locais para sua expansão e modernização, e não têm condições de concorrer de forma justa e/ou isonômica, com os terminais privados. Estudiosos apontam que, em um cenário muito próximo, esses dois portos públicos sucumbirão em face dos terminais privados. No caso de São Francisco do Sul, este fato já se materializou no caso das cargas conteinerizadas.

Juristas falam sobre a proposta da Appa

A opinião de dois importantes juristas sobre a proposta da Appa para nova poligonal constam no processo que tramita na SEP. Questionada se será válido eventual decreto presidencial que fixe nova poligonal em discordância com as previsões legais, como o PDZPO ou com o Plano Master, a advogada Maria Sylvia Zanella di Pietro, disse que não será válida. “O artigo 15 da Lei 12 12.815/13 prevê a definição da área dos portos organizados como ato complexo, constituído de um ato principal (o ato da presidência da República) e um ato acessório, que o precede (a proposta da SEP/PR); se a proposta é inválida por não observar as previsões legais nem do PDZPO e nem do Plano Master, o ato presidencial padecerá do mesmo vício”, argumenta a jurista.
Por sua vez, questionado caso se demonstre tecnicamente que a proposta de nova poligonal colocada em consulta pública pela SEP/PR contraria o PDZPO e o Plano Master do Porto de Paranaguá, a solução juridicamente adequada consistiria na invalidação da proposta, sem prejuízo de posterior alteração de tais planos em procedimento regular, o professor Celso Antonio Bandeira de Mello, disse que é obrigatória a observância do PDZPO e do Plano Master do Porto de Paranaguá. “Se a proposta submetida à consulta pública desconsidera essas diretrizes do planejamento portuário, cuja força vinculante já foi enunciada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) em inúmeros precedentes será inválido, pois, de nada adiantaria a elaboração de tais instrumentos se eles pudessem simplesmente ser ignorados por decisões futuras”.

Fregonese assina nota técnica da poligonal

Consta ainda neste processo da SEP, uma nota técnica da Appa, assinada pelo Diretor de Desenvolvimento Empresarial, Lourenço Fregonese e por Alex Sandro de Ávila, do Departamento de Planejamento, ambos da Appa, que defende junto a SEP, a proposta de redução da poligonal elaborada pela Appa. 

Justificada por teses e gráficos das páginas 297 a 318 do processo, a Nota Técnica da Appa apresenta posições conflitantes. Logo no início a nota afirma que o “PDZPO é a principal ferramenta de planejamento, individual, do setor portuário, pois em sua essência ele traça as diretrizes de crescimento, investimento, modernização, melhorias de um porto”. Entretanto, para reforçar a implantação da proposta apesentada, a Nota Técnica se contradiz e afirma que “as projeções e análises proporcionadas no PDZ e Masterplan dos Portos de Paranaguá e Antonina, é identificado que, a muito curto prazo, vários segmentos de cargas terão suas capacidades operacionais não atendidas pela infraestrutura disponível no Porto, passando a gerar demanda reprimida”. A nota fecha sugerindo que os processos para revisão das poligonais sejam tratados levando em conta a situação operacional, econômica e institucional dos portos de Paranaguá e de Antonina e aprovadas por atos distintos. Coincidentemente esta Nota Técnica foi assinada por Fregonese sete dias antes de a cidade comemorar 367 anos de existência.

Nota ignorou 21,36 milhões de toneladas a partir de 2016

Vale destacar que o argumento de uma possível demanda reprimida na movimentação portuária, defendido pela Appa na Nota Técnica para justificar a redução da poligonal, não levou em conta a expectativa de uma movimentação futura de 21,36 milhões de toneladas a partir do próximo ano, com os seis arrendamentos liberados pelo Governo Federal, a partir do segundo semestre de 2016. São empreendimentos contemplados para o porto, contemplados pelo Programa de Investimentos em Logística (PIL). Vale destacar que os números previstos para essas mais de 21 milhões de toneladas por ano de capacidade futura do porto público, constam justamente nos gráficos inseridos na Nota Técnica assinada por Fregonese.

O estudo também não leva em consideração possíveis deslocamentos de cargas atualmente movimentadas pelo porto de Paranaguá para outros portos, como no caso do chamado “arco norte do Brasil”, que afetará a movimentação de grãos e de fertilizantes pelos portos paranaenses. É preciso levar em consideração também que existem propostas de expansão para o porto público de Paranaguá os quais poderão ser inibidos com a eventual mudança do previsto no PDZPO e Plano Master do Porto de Paranaguá, causando prejuízos os quais irão contrapor interesses privados.